Ágora completa seis anos e alcança mais de 1,5 mil alunos


26 de agosto de 2014


Programa ensina profissionais a desenvolverem ações para qualificar a atenção primária à saúde

*Matéria Publicada na edição 39 do Saúde Informa

Fabiana Gonçalves perdeu 40 kg, com a ajuda do plano de intervenção proposto por Bruno Saldanha

Fabiana Gonçalves perdeu 40 kg, com a ajuda
do plano de intervenção proposto por Bruno
Saldanha

Como a criatividade pode ajudar a emagrecer? O educador físico Bruno César Saldanha buscou a resposta no projeto que desenvolveu como trabalho de conclusão do Curso de Especialização em Estratégia Saúde da Família (Ceesf). O profissional aplicou um plano de intervenção para o controle da obesidade no aglomerado Morro das Pedras, com o concurso “O grande perdedor”. Nele, as pessoas da comunidade que mais conseguem perder peso são premiadas, incentivando, assim, a mudança na realidade de um dos locais mais vulneráveis da região metropolitana de Belo Horizonte.

Bruno Saldanha poderia ser apenas mais um entre tantos outros que se formam nos incontáveis cursos de qualificação à distância. Mas o Ceesf, oferecido pelo Programa Ágora e implementado pelo Núcleo de Educação em Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina da UFMG (Nescon), prima pela qualidade. Desde sua criação, em 2008, o programa oferece cursos para aprimoramento e compreensão da importância das ações na Atenção Básica à Saúde a médicos, enfermeiros, cirurgiões-dentistas, educadores físicos, dentre outros profissionais da área da saúde das redes municipais.

Os objetivos do Ágora são bem ilustrados na iniciativa implantada no Morro das Pedras, que também promove atividades físicas diárias, com acompanhamento nutricional e psicológico, para a população – 90% dos habitantes locais estão com sobrepeso. A empregada doméstica Maria das Graças, 64, é uma das beneficiadas. Vencedora do concurso que se tornou atração na comunidade, ela conseguiu se livrar das dores provocadas por uma hérnia de disco, junto dos nove quilos que tinha a mais. “Eu ia operar de hérnia, cheguei a ficar quatro meses de cama. Mas com o projeto do Bruno, comecei a fazer exercícios e não precisei mais da cirurgia. Hoje consigo carregar minhas compras e trabalhar sem dores”, conta.

Os outros dois vencedores do concurso, que já está em sua quarta edição, também recuperaram a saúde por meio da intervenção do projeto. O servente de pedreiro Francisco de Assis Rocha, 50, perdeu oito quilos e não precisa mais de medicamentos para asma. “Sem complicações com a asma, participo até de corridas de cinco quilômetros na orla da Lagoa da Pampulha”, revela.

Mas o resultado mais surpreendente foi o da diarista Fabiana Gonçalves, 35, que atualmente está com 40 quilos a menos e autoestima renovada. Para Bruno Saldanha, o sucesso do plano de intervenção só foi possível graças ao suporte do curso de especialização, que possibilitou organizar estratégias em saúde e enriquecê-las com questões teóricas bem fundamentadas.

Crescimento
Com seis anos de existência, o Programa Ágora já promoveu cerca de mil trabalhos como o de Bruno Saldanha. O rápido crescimento se deve às diferentes estruturações e apoios que o curso obteve.O professor Edison Corrêa, vice-coordenador do Nescon, lembra que a proposta do programa foi elaborada, submetida e aprovada junto à Secretaria de Gestão do Trabalho e da Saúde (SGETES) do Ministério da Saúde, em 2007. “Foram abertas 400 vagas semestrais, em três turmas seguidas (2008 e 2009), com relação de três candidatos para cada vaga, nas três ofertas”, lembra.

Atualmente, já são mais de 1,5 mil alunos matriculados no Ágora. O perfil dos alunos também mudou, com a inclusão da capacitação de médicos e enfermeiros do Programa de Valorização dos Profissionais na Atenção Básica (Provab) e do Mais Médicos, em parceria com a Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS) e da Universidade Aberta do Brasil (UAB). “Houve uma diversificação na clientela, já que muitos vêm de outros países ou são brasileiros que fizeram o curso fora”, explica a professora Maria Rizoneide, uma das coordenadoras do Programa Ágora.

Edison Corrêa acrescenta que a ampliação contou ainda com a abertura de novos cursos, como os de Atenção Domiciliar, Tecnologias Assistivas, de Atualização em Gestão das Condições de Trabalho e Saúde do Trabalhador, dentre outros. “Hoje, com a grande demanda para atender o governo, trabalhamos em parcerias com outras universidades, como a Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) e a Universidade Federal de Alfenas (Unifal)”, afirma. O Programa também tem como parceiros na UFMG as escolas de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, de Enfermagem, as faculdades de Educação e Odontologia e o Centro de Apoio à Educação a Distância (Caed).

Estrutura
Para organizar as demandas do Ágora, foi necessário estruturar, na Faculdade de Medicina da UFMG, um sistema para Educação a Distância (EAD). Com isso, foram constituídas equipes de coordenação e de assessoria pedagógica interprofissional, que estabeleceram novas metodologias educacionais para os cursos. Uma delas foi a avaliação online formativa. “Esse método fornece subsídios para que o aluno compreenda o seu próprio processo de aprendizagem e o funcionamento de suas capacidades na resolução de problemas”, explica o vice-coordenador do Nescon.

Outra consequência foi a criação de um corpo de tutoria, com dois tipos de tutores: presenciais e a distância. A função deles é acompanhar, dar suporte e mediar o conhecimento para os profissionais da saúde. A tarefa é acompanhada pelos membros do Núcleo de Apoio Interdisciplinar e Pedagógico (Naipe). Todos esses profissionais estão distribuídos nos 20 polos do curso, sendo 90% deles pertencentes ao sistema de saúde local ou regional dos polos.

A tutora presencial do polo de Araçuaí, Cláudia de Melo Souza, conta que se interessou em participar da tutoria para contribuir no processo de ensino e aprendizagem. “Acredito nas trocas de experiências constantes, entre tutores, alunos e corpo docente”, afirma. Segundo ela, o tutor desenvolve papel primordial para a autonomia de aprendizagem, organização do polo, planejamento dos encontros presenciais e acolhimento para que os alunos não se sintam sozinhos. “O elo entre tutor e aluno proporciona aos alunos confiança e adesão ao curso, já que se trata de ensino a distância”, completa.

Como resultado desse trabalho integrado, só em Minas Gerais, cerca de 5 mil equipes de saúde, que oferecem cobertura a 78% da população, foram qualificadas. No estado de Alagoas, onde o Programa Ágora também tem abrangência, foram 800 equipes, que atendem cerca de 70% da população.

Benefícios
Um dos membros da coordenação do Ágora, Raphael Aguiar, afirma que a estrutura do programa possibilita que o profissional aprenda a refletir sobre a prática, ou seja, o fazer crítico sobre seu próprio trabalho. Para Aguiar, outra vantagem é a interação com os colegas, uma vez que os profissionais passam a entender que o problema em saúde é geral e que juntos podem pensar as soluções. “A partir do momento que o profissional compartilha saberes e aprende a contribuir para melhoras do cuidado, faz uma atenção primária de qualidade”, enfatiza.

A professora Maria Rizoneide Negreiros reforça a importância dos profissionais, qualificados para trabalhar na atenção primária, entenderem que as pessoas adoecem pelo modo de inserção na sociedade, no ambiente de trabalho e como se relacionam com o serviço de saúde. “Um exemplo é que quando os pacientes chegam com um problema renal, os nefrologistas precisam pensar que esses indivíduos tiveram muitas infecções que não foram curadas e, por isso, chegaram lá com problema renal. É simplório, mas ajuda a entender que a atenção básica é importante para prevenir complicações futuras”, explica.

Quem também incorporou esses conceitos e aplicou no trabalho de conclusão de curso foi a enfermeira Mireili Pazinato. Ela desenvolveu uma proposta de intervenção para ajudar a sua equipe do município de Resplendor, no interior de Minas, no controle e prevenção do câncer de colo do útero. “Gostei muito do curso, o material didático nos remetia à realidade e as intervenções dos tutores foram pontuais e decisivas. Isso me ajudou a aplicar os conceitos no cotidiano”, conta.

De acordo com o professor Edison Corrêa, a perspectiva é que o Programa Ágora continue a auxiliar todos os envolvidos. “A Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, por exemplo, firmou parceria com o Ágora, por pelo menos mais três anos. O intuito é dar continuidade aos projetos e implementar outros, como o Curso de Especialização em Gestão em Saúde Pública. Assim, mais profissionais poderão se beneficiar com o processo de educação permanente, certificação e a oportunidade de oferta de melhor cuidado,” prevê.