Impactos da pandemia em pacientes com Alzheimer motiva novo estudo

Mudança de rotina e isolamento social são principais consequências observadas


28 de junho de 2021 - , , , , , , ,


Com o passar dos anos, o processo de envelhecimento começa a dar sinais de que a mente está cansada e começam a surgir falhas. O resultado final disso pode ser o desenvolvimento de demências, como a doença de Alzheimer. E se em tempos normais a doença já causava seus danos aos pacientes, com a chegada da pandemia de covid-19 a situação se tornou ainda mais preocupante. Como consequência, a procura por acompanhamento médico dessas pessoas sofreu forte queda, o que motivou uma nova pesquisa sobre os impactos deste período pandêmico na vida dos pacientes.

O responsável pelo estudo é o neurologista e professor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, Paulo Caramelli. Convidado para o programa Saúde com Ciência da Semana, na série: “Alzheimer: aprendendo a conviver com a doença”, o especialista explica como a necessidade de isolamento e distanciamento abafaram os cuidados que deveriam ter sido mantidos com esse público.

“A mudança de rotina, a necessidade de essas pessoas ficarem em casa, entre outras consequências afetou de forma muito marcante aspectos cognitivos e comportamentais”

Aponta Paulo Caramelli.

Dentre os vários prejuízos à saúde dos pacientes, piora da memória, aumento da agressividade e agitação são alguns dos sintomas mais observados pelo professor. Segundo ele, na tentativa de ajudar essas pessoas, os familiares buscam mudar o ambiente de convívio ou até mesmo contratar cuidadores profissionais, mas isso pode contribuir para essas crises e por isso deve ser um processo cauteloso.

O estudo envolveu, também, países como o Chile e a Argentina e de acordo com o professor, os efeitos foram negativos em todos eles. O que foi possível concluir é que o impacto se torna cada vez maior ao longo que a demência fica ainda mais grave, já que para casos leves, os resultados foram menores.

Sintomas e Diagnóstico

A memória é a primeira função afetada pelo Alzheimer em cerca de 85% dos casos, de acordo com o neurologista. As falhas se tornam frequentes e as informações se perdem em meio aos esquecimentos. Mas é válido lembrar que também existem outros sintomas comuns, como orientação espacial, o que confunde o paciente; mudanças comportamentais, com o surgimento de depressão e a apatia, com a perda de interesse por atividades que antes eram rotineiras.

Esses são exemplos de efeitos comumente notados em pessoas de idade avançada, entre 60 e 65 anos. Mas, Paulo Caramelli alerta que as alterações degenerativas podem ocorrer antes, aos 50 anos, por exemplo. Caso essa aparição seja notada antes da terceira idade, o professor explica ainda que é uma nova configuração da doença. “Isso a gente chama de doença de Alzheimer pré-senil, quando as pessoas iniciam esse processo mais cedo, na faixa dos vinte a trinta anos”, pondera o professor.

O diagnóstico médico da doença, no entanto, somente é apresentado no estágio em que a demência está avançada e as manifestações estão claras. Primeiramente, ela é assintomática e nessa fase os sintomas ainda estão em desenvolvimento e perdura por 15 anos; depois as habilidades cognitivas ficam ainda mais debilitadas e, finalmente, completamente comprometidas. Aos familiares que necessitam de ajuda para identificar cada uma das fases em que o paciente se encontra, o professor esclarece.

“No estágio leve a pessoa tem um prejuízo das atividades instrumentais, como cozinhar. No intermediário ela sofre alterações de atividades diárias, como a escolha das roupas, e na fase avançada tem uma dependência para higiene pessoal”

Mas a idade não é o único fator de risco da enfermidade. Escolaridade baixa, traumatismo craniano, hipertensão, diabetes mellitus e colesterol elevado também podem contribuir para o desenvolvimento da doença.

Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer, mais de um milhão de brasileiros já convivem com a doença. E de acordo com a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, a cada ano são estimados cinquenta e cinco mil novos casos de demência, sendo a maioria decorrente do Alzheimer.

Tratamento

Para o tratamento das fases demenciais da doença de Alzheimer, Paulo Caramelli elucida que já existem medicamentos aprovados responsáveis por modular a atividade de neurotransmissores no cérebro. As medicações são combinadas para cada fase da doença e é de fácil acesso.

“Parte dessas medicações já são disponibilizadas pelo SUS há muitos anos e isso é um aspecto social muito importante”

A novidade nessa área vem nos estudos recentes voltados para a pesquisa de novas drogas que poderiam ser utilizadas nas fases pré-demenciais do Alzheimer. Os remédios poderiam diminuir o ritmo de progressão da doença, com efeitos diferentes das medicações já existentes. E mesmo que os resultados ainda não sejam conclusivos, o neurologista estima que seja um bom começo.

“Independentemente de essa medicação ser aprovada ou não, o que é importante lembrar é que nós temos uma grande variedade de pesquisas hoje em andamento para novas formas de tratamento, farmacológica e não farmacológica”, ressalta.

Prevenção

Embora a doença de Alzheimer não tenha cura, a esperança mora na prevenção. Um novo projeto de pesquisa internacional chamado FINGERS  busca compreender a eficácia da prevenção do comprometimento cognitivo, baseado na estratégia de mudança de estilo de vida e intervenção não medicamentosa. O estudo tem a UFMG como um dos centros brasileiros participantes e o professor Paulo Caramelli como coordenador. Um dos objetivos é avaliar a possibilidade de aplicação desse método na população e deve iniciar apenas quando a pandemia estiver controlada.

“O que antevemos com esse estudo é uma grande oportunidade de controle dos fatores de risco abundantes na população latina americana, como diabetes e pressão alta, que ainda estão longe do ideal”, afirma o neurologista.

Enquanto isso, alguns hábitos como o controle rigoroso desses fatores, atividade física, dietas e estímulo da atividade cognitiva são aliados que reduzem a probabilidade de desenvolvimento da demência.

Quer conhecer mais dicas para praticar com as pessoas que convivem com a doença durante a pandemia? Entender como o Alzheimer interfere o sistema nervoso central do corpo e conhecer mais as pesquisas na área? Essas e outras informações você confere no programa Saúde com Ciência dessa semana.

Saiba mais no Saúde com Ciência

A doença de Alzheimer é o tema do programa de rádio Saúde com Ciência desta semana. O programa é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a quinta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify.