Coletivos contribuem para representatividade das mulheres e suas demandas
11 de março de 2019
Em seminário na Faculdade, palestrantes destacam atuação de projetos e coletivos da UFMG que marcam a luta pelos direitos das mulheres

Apesar de o gênero feminino ser a maioria entre os jovens médicos no país, de acordo com a pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Medicina de 2018, ainda é discriminado na área. A questão, incluindo a luta por respeito e a reivindicação de cargos de liderança ocupados por mulheres, foi um dos apontamentos da estudante do curso de Medicina e representante do Diretório Acadêmico Alfredo Balena, Camila Yuka Itiki, durante o seminário “Mulheres em foco” na Faculdade, nessa sexta-feira, 8 de março.
Durante o evento, Camila comentou sobre o direito às mulheres acessarem instituições de ensino superior no país, a partir de 1879, e as barreiras que são enfrentadas até hoje no ambiente. Dentre essas, a descrença da capacidade intelectual do gênero e o assédio sexual.
Para ela, a partir do momento que mulheres conseguem ocupar cargos de liderança, é possível que as demandas do grupo sejam atendidas. “Ano passado, após uma ação do Coletivo de Mulheres Alzira Reis, o debate sobre assédio dentro da Instituição foi exaltado. Por termos pela primeira vez, em 108 anos de história, uma vice-diretora mulher, esse debate levou a criação de um fluxo dentro da Faculdade para lidar com os assédios”, acrescentou.
A Força da Mulher em Coletivo
A Campanha citada, que gerou a cartilha “Assédio é crime”, teve a colaboração do Coletivo de Mulheres Alzira Reis e foi uma das ações destacadas pela estudante do 12° período do curso de Medicina e palestrante do seminário, Jéssica Augusta Canazart. A ação surgiu após centenas de denúncias serem feitas pelo formulário disponibilizado na página de Facebook do Coletivo, para que as vítimas denunciassem, mesmo que anonimamente.
Ela ressaltou o coletivo, surgido em 2014, como um importante espaço para debate das demandas das estudantes do campus Saúde e que homenageia, no nome, a primeira mulher a ingressar no curso de Medicina da UFMG e a primeira médica em exercício de Minas Gerais.
Como pioneira e a única entre uma turma de homens, Alzira passou por várias situações de preconceito. E foi com a inspiração da sua luta, que as estudantes se uniram com o objetivo de intervir em casos de opressão à mulher dentro da Universidade, além de expor casos de assédio.
“A gente enfrentava um problema de pouca credibilidade no meio acadêmico, principalmente as alunas. Éramos invisíveis. Então, algumas mulheres corajosas resolveram enfrentar isso e, por demanda, criaram o coletivo para lutar contra essa invisibilidade” contou Jéssica.

Demandas das mulheres e o debate em grupos
Para além da comemoração do dia 8 de março, as palestras destacaram sobre o caminho que ainda é preciso percorrer para que a igualdade de gênero seja alcançada. Para isso é preciso de programas que atuem na proteção de mulheres que têm seus direitos violados, com representatividade feminina em cargos de liderança e atuação de coletivos que buscam proteger e tornar o ambiente universitário mais humano.
Além do Coletivo Mulheres Alzira Reis, outros grupos na UFMG atuam nas questões do gênero. O Programa Polos de Cidadania (Polos) da Universidade, por exemplo, que trabalha com projetos relacionados a conflitos urbanos e socioambientais, inclui mulheres que vivem em situações de violência nas cidades do país.
Uma das reivindicações do programa, destacada pelo professor do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, André Luiz Freitas, foi sobre mulheres em situação de rua usuárias de drogas que tiveram a retirada compulsória de seus bebês.
A ocorrência foi em 2014, quando o Ministério Público da Infância e Juventude de Belo Horizonte apresentou uma determinação para a retirada das crianças e o Programa atuou na defesa dos direitos dessas mães, participando de reuniões que discutiam a questão.
O espaço da mulher negra
A representatividade negra, que atualmente está em pauta devido à luta e persistência dos movimentos negros e a conquista de espaço em políticas públicas, também foi um dos temas do Seminário. Entre os exemplos, estava a política de cotas que aumentou o acesso de vários jovens negros nas universidades, conforme apontado por Yone Maria Gonzaga, doutora em Educação, que ministrou a palestra sobre o espaço e a representatividade da mulher negra na sociedade atual.
“Eu tenho de ter um lugar para falar o que significa ser mulher negra nesta sociedade que naturalizou a invisibilidade das mulheres”, disse Yvone. Ela ressaltou que há uma precariedade na representatividade e no reconhecimento da mulher negra em vários espaços, como na política, legislação e educação. E que a definição das propostas nas políticas públicas, ainda que seja para todos, são definidos por uma maioria de homens brancos.

A especialista informa que a maioria dos espaços sociais de altos cargos esta naturalizada aos homens brancos e há um estranhismo quando são ocupados por uma mulher negra, gerado pelo racismo institucionalizado. “Quando eu chego na frente e sou enunciada como doutora em educação, as pessoas ficam assim: doutora? São poucas as mulheres negras que conseguem chegar ao ensino médio. Que dirá o ensino superior, que dirá fazer o mestrado ou o doutorado”, pontuou.
Por isso ela defendeu que políticas públicas como as cotas são necessárias para que jovens negros e, principalmente, mulheres, ocupem esse espaço. Mas também lembrou que mesmo depois de chegarem à universidade, o racismo ainda os perseguem.
“Quando esses jovens negros chegam na universidade, e temos vários exemplos na UFMG, não são bem recolhidos. Há um discurso de que esses que ao ingressar por meio de cotas eles tiram vagas de outros jovens brancos”, alertou, enfatizando que esse discurso deve ser desconstruído dentro e fora da universidade e que as vozes dos jovens negros sejam ouvidas.
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