Antropóloga discute aborto, manicômios e plágio


05 de setembro de 2013


Temas como aborto, manicômios judiciários e plágio foram discutidos nessa quarta-feira, 4 de setembro, no seminário  “Bioética como defesa dos direitos humanos na área da saúde”, proferida pela professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, Débora Diniz.

O encontro foi promovido pela disciplina Seminários de Bioética: assistência, ensino e pesquisa, do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde: Infectologia e Medicina Tropical, da Faculdade de Medicina da UFMG. A disciplina é coordenada pelo professor Dirceu Greco e tem em seu corpo docente os professores Itamar Sardinha, Unaí Tupinambás e José Agostinho Lopes.

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O seminário contou com a presença de professores e estudantes de cursos de graduação e pós-graduação, além de profissionais do setor da saúde.

Débora Diniz é antropóloga, cofundadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero e diretora de vários documentários relacionados à Bioética. Débora foi uma das referências nacionais na discussão sobre a legalização do aborto em fetos anencéfalos.  Confira entrevista com a pesquisadora.

– Como podemos definir bioética?

A bioética é um campo muito vasto, de pesquisa, de intervenção e de sensibilização de estudantes. Aqui na UFMG foi dentro do contexto de uma disciplina do Programa de Pós-Graduação em Medicina Tropical e Infectologia. Nós não temos um conjunto de especialistas, então nós tínhamos desde enfermeiras, médicas, psicólogas, assistentes sociais e se trabalha com esse conjunto de temas que são sempre muito delicados para nós. O tema central dessa palestra foi o aborto.

– Quais os temas são mais discutidos dentro da bioética na área da saúde?

Aborto é um tema prioritário. O direito de morrer, o fim de vida, questões relacionadas ao transplante de órgãos, questões relacionadas à saúde mental. Nós temos um campo muito vasto.

– Quando o assunto ainda não era pauta nacional, a senhora ajuizou uma ação no Supremo Tribunal Federal na tentativa de garantir o direto ao aborto às mulheres grávidas de fetos anencéfalos (condição caracterizada pela não formação do cérebro do bebê). O que mudou a partir disso?

Essa foi uma ação ajuizada por um grupo muito grande de pessoas, não só por mim, e foi apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Saúde pelo Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero. O nosso pedido era que nenhum profissional da saúde fosse penalizado por socorrer e cuidar de uma mulher e que nenhuma mulher fosse obrigada a se manter grávida. O pedido da ação não era para que as mulheres interrompessem a gestação ou antecipassem o parto, mas que elas pudessem escolher. Isso tem um ano, o que mudou é que hoje as mulheres podem, apesar do intenso sofrimento, tomar sua decisão com uma equipe de saúde, em um consultório, no hospital, tomar a decisão com sua família sem precisar ir a Tribunal, constituir advogados e esperar o resultado da decisão. Ou seja, nós conseguimos transformar isso, como deve ser, em uma questão de saúde e não uma questão policial ou jurídica.

– Muitas pessoas discordaram dessa ação?

A discordância é saudável em uma democracia. O ponto é que quem discorda e se vê diante de uma situação como essa vai poder manter sua gestação. Essa não é uma ação que obriga nenhuma mulher a nenhuma decisão, ela apenas reconhece que nós somos diferentes e que podemos escolher de maneira diferente.

– No ano passado, a senhora recebeu o prêmio de melhor trabalho publicado no meio científico sobre uma pesquisa de aborto no Brasil. O que foi identificado?

Esse foi um prêmio concedido pela Organização Panamericana de Saúde para todas as Américas, sobre o melhor estudo em saúde pública das regiões. Ele é um estudo que, pela primeira vez, traçava a magnitude do aborto no Brasil. O aborto é um crime, então nós tivemos uma enorme dificuldade de saber quem são as mulheres e porque elas fazem o aborto. Eu e o coautor, Marcelo Medeiros, utilizamos uma metodologia que se chama técnica de urna. Nós pedimos às mulheres que respondessem se já tinham feito o aborto. Elas depositavam a resposta em uma urna secreta. Nós encontramos que aos 40 anos, uma em cada cinco já fez um aborto. Então nós estamos falando de milhões de mulheres. Isso é um evento comum, não diria que é um evento banal.

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A antropóloga Débora Diniz durante seminário.

 

– A senhora também estuda sistema prisional, loucura e violência. Existe alguma relação entre crimes graves com determinados diagnósticos, como a esquizofrenia?

Não. O senso dos manicômios judiciários, que são unidades prisionais psiquiátricas, são 26 no país, foi coordenado por mim e financiada pelo Ministério da Justiça. O que nós fizemos foi abrir os dossiês de todos os pacientes, são 3.989 no país, e olhar qual era o diagnóstico que eles tinham, o que eles tinham feito e quanto tempo eles estavam ali. O que nós encontramos é que não há nenhuma relação entre diagnóstico médico e periculosidade. Ou seja, periculosidade não é uma categoria médica, não é uma categoria moral. O fato de o individuo ser esquizofrênico não significa que ele seja perigoso, que alguém que tem uma bipolaridade seja perigoso. Todos os diagnósticos médicos igualmente estavam em todas as infrações penais.

-Durante a palestra que a senhora proferiu o tema plágio esteve entre as discussões. Por que é necessário falar sobre o assunto?

O plágio é uma infração ética no campo da escrita acadêmica. Então isso diz respeito diretamente aos interesses das Universidades: da graduação, da pós-graduação e professores. Mas o plágio pode se expressar de duas maneiras: quando alguém copia algo de outra pessoa ou quando faz modificações. Algumas Universidades estão tentando adotar softwares de caça-plágios, para tentar banir o plágio. Acredito que esse seja um caminho tortuoso, é melhor conscientizar ao falar do plágio. Essa foi uma discussão porque, ainda esse semestre, vou lançar o livro “Plágio, palavras escondidas”, em parceria com a Ana Terra Munhoz.