Campanha visa limitar propagandas de cerveja no país
Restrição deve diminuir consumo de álcool pelos jovens e melhorar o prognóstico de saúde do Brasil
07 de janeiro de 2016
Restrição deve diminuir consumo de álcool pelos jovens e melhorar o prognóstico de saúde do Brasil
As epidemias industriais são quando as pessoas não têm a necessidade de um produto, mas são induzidos a consumi-lo. Resultados da disponibilidade cada vez maior de mercadorias, essas epidemias são intensificadas pelo marketing. Para tentar diminuir a influência da publicidade no consumo do álcool no Brasil, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais e o Conselho Municipal de Política Sobre Drogas de Belo Horizonte (CMPD-BH), a partir de um movimento criado pelo Ministério Público de São Paulo, está realizando a campanha “Cerveja também é álcool” que visa restringir as propagandas de cerveja no país.
O professor do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFMG e membro do CMPD-BH, Frederico Garcia, explica que a lei que regulamenta a publicidade de bebidas alcoólicas nos diversos meios de comunicação refere-se a produtos com teor alcoólico superior a 13 graus por litro. Isso exclui a cerveja e outras bebidas com menor teor. “Essa é uma lei federal, e queremos mudá-la a partir de um projeto de iniciativa pública”, aponta o professor.
Garcia ressalta que a cerveja, entre outras bebidas alcoólicas, se encaixa na definição de drogas psicotrópicas, as quais interferem no funcionamento do corpo e modificam a atividade cerebral. “Essas drogas podem causar uma doença chamada dependência e até mesmo lesões que desencadeiem mudanças de comportamento”, destaca o especialista.
Vício e saúde dos adolescentes
A cada década em Belo Horizonte, as pessoas experimentam álcool um ano mais cedo. Hoje, meninas adolescentes têm seu primeiro contato com a bebida aos 15,3 anos, enquanto os meninos fazem o mesmo aos 15,6 anos, segundo o Centro Regional de Referência em Drogas da UFMG (CRR-UFMG). Para Frederico Garcia, também coordenador do CRR, essa é uma situação preocupante. “A indústria percebeu que quanto mais cedo fidelizar seu cliente, melhor seu retorno financeiro. E por isso ela faz a cerveja parecer algo necessário nos momentos de lazer e festa”, critica.
Ainda no período de juventude, quando os neurônios ainda estão sendo conectados, o consumo do álcool pelos jovens leva a um risco cinco vezes maior de desenvolver dependência química até os 25 anos. “Jovens que consomem álcool também tendem a ser mais impulsivos e terem comportamentos de risco, como o sexo desprotegido ou atos violentos”, destaca Garcia.
Mas as consequências vão além do bem-estar físico. Segundo dados do Centro, o adolescente que consome álcool tem menos chances de terminar o segundo grau, ingressar numa faculdade ou estar empregado aos 35 anos.
Efeitos da mudança da legislação
A regulamentação dos comerciais de bebidas alcoólicas, atualmente, restringe a presença de crianças nas propagandas e proíbe a sugestão do consumo de álcool, por exemplo. Na televisão aberta, as publicidades são permitidas entre às 21h30 e 6h. “O ideal seria a restrição por completo. Mas com a medida atual, pelo menos os anúncios não chegam às crianças e adolescentes”, diz Garcia. O professor enfatiza que se os jovens se expuserem menos à bebida, não terão sido condicionados ao consumo quando forem adultos.
Garcia lembra que o Brasil tem exemplos bem sucedidos da proibição de publicidades. “Em 1980, aproximadamente 40% da população adulta brasileira era fumante. Em 2014, o índice chegou a 12%”, diz. Segundo o especialista, essa queda aconteceu, em grande parte, como resultado da lei que vetou a publicidade de tabaco no país em 2001. “A lei com regras mais rígidas para a cerveja favoreceria, principalmente, a prevenção. Quanto menos indivíduos experimentarem álcool, menos dependentes químicos teremos que tratar no futuro”, argumenta Garcia.
Por isso, o Conselho Municipal de Política Sobre Drogas de Belo Horizonte, responsável por avaliar, propor e implementar ações que melhorem a situação da droga na capital mineira, vai propor a discussão de toda a lei após alcançar a restrição da publicidade de cerveja. “Privar nossos jovens do incentivo ao consumo do álcool é algo que pode mudar o prognóstico do nosso país em vários aspectos, da saúde ao ponto de vista econômico”, conclui.
O projeto “Cerveja também é álcool” busca recolher 1,5 milhão de assinaturas em seu site oficial.