Colcha de retalhos: tecendo o combate à violência contra a mulher
22 de outubro de 2014
A construção gradual de uma colcha de retalhos pelos participantes do projeto “Para elas, por elas, por eles, por nós”, que propõe a implantação de uma rede integrada de atenção à mulher em situação de violência no Brasil, virou objeto de estudo da terapeuta ocupacional Patrícia Campos Chaves, em sua dissertação defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Promoção da Saúde e Prevenção da Violência da Faculdade de Medicina da UFMG.
A proposta surgiu durante a organização das atividades durante os encontros dos participantes do projeto. A colcha seria construída a partir de crachás de pano e crochê utilizados por eles. “A colcha virou um símbolo, representou para os participantes dos seminários o senso de pertencimento ao projeto”, explica a autora da dissertação.
A produção da colcha foi realizada em todos os eventos da rede pelo país e, a cada novo seminário, ganhou novos pedaços, novos significados e passou também a incorporar um pouco da história dos lugares.
Para o desenvolvimento do projeto foram realizados 16 seminários – cinco macrorregionais, 10 em territórios de campo e floresta e um nacional – entre fevereiro de 2013 e junho de 2014, com a participação de gerentes e gestores de todos os estados e capitais brasileiras. Um diagnóstico sobre os serviços da rede, como a saúde, a educação e a segurança pública, era realizado, seguido de oficinas de planejamento estratégico e participativo.
“No primeiro dia de seminário, as pessoas usavam os crachás e os devolviam. No segundo dia, os participantes chegavam ao local dos eventos e eram surpreendidos por um grupo de mulheres que já tecia a colcha”, relata Patrícia. As pessoas sentavam-se e teciam junto, contando suas histórias e o que sentiam ao estar no projeto de combate à violência.
Ao final da atividade, questionários eletrônicos foram respondidos pelos membros, com questões sobre a realização do trabalho em paralelo à construção do grupo. No estudo, 80,4% dos entrevistados relataram ter pensado em replicar a atividade da colcha em sua prática profissional, por consideraram a ação um modo de demonstrar uma postura protagonista na implantação da rede em sua região.
Segundo a pesquisadora, ao acompanhar a atividade da “Colcha de Retalhos” era possível perceber que a proposta de união das pessoas para enfrentar coletivamente a questão da violência contra a mulher ia tomando forma.
No último dia do seminário nacional de Belo Horizonte, primeiro realizado e de onde a colcha de retalhos partiu para os demais encontros, o trabalho finalizado foi apresentado aos congressistas, junto ao um vídeo de sua confecção.
Patrícia conta que as pessoas se emocionaram e se empolgaram. Ao procurarem seu nome contido na colcha, elas se viram como sujeitos protagonistas deste processo, com a sua participação registrada em sua assinatura. Isso representou sua inclusão como membros da proposta de construção coletiva da rede.
“A colcha se mostrou um mecanismo de mobilização social. Construir uma rede por todo o país pode ser difícil, e ações como esta são muito importantes para seu sucesso”, conclui.
Para Elas
Desenvolvido pelo Programa de Atenção Integral de Saúde da Mulher em Situação de Violência, fruto de uma parceria entre Núcleo de Promoção de Saúde e Paz do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG (Nescon) e o Ministério da Saúde, o projeto “Para elas, por elas, por eles, por nós” capacita profissionais, produz conhecimento e material científico acerca da violência contra a mulher e propõe a implantação de uma rede integrada de atenção à mulher em situação de violência por todo o Brasil.
O “Para Elas” realiza ainda o treinamento de médicos, psicólogos e enfermeiros para prestar o primeiro atendimento à mulher vítima de violência e, em parceria com o Nescon, promove um curso de capacitação à distância para essa assistência. Em 2015, o projeto vai visitar os locais onde a rede se desenvolveu, para colher os resultados dos planos de ação desenvolvidos.