Encontro debate história do racismo e racismo institucional na saúde


19 de junho de 2018


“Só quem sente na pele sabe”, afirma Maria Zenó sobre racismo e doença falciforme

Carol Prado*

 

Joice Aragão: doenças crônicas exigem atenção com a pessoa e com a família. Foto: Carol Morena

Celebrando Dia mundial da Conscientização sobre a Doença Falciforme, 19 de junho, determinado pela Organização das Nações Unidas, foi realizado hoje o Primeiro Encontro do Projeto Racismo Institucional: a Doença Falciforme e Seus Contextos Sociais, na Escola de Enfermagem da UFMG. O evento discutiu as repercussões do racismo e sua relação com a Doença Falciforme no Brasil.

“Toda doença crônica nos leva a uma situação que exige atenção com a pessoa e com a família. Além da doença, no caso da Anemia Falciforme, há o abandono social”, afirmou a médica e coordenadora emérita da Politica Nacional de Ação Integral às Pessoas com Doença Falciforme, Joice Aragão de Jesus.

O traço falciforme é um gene vindo da África durante o processo de escravidão. “Estamos falando de uma doença que acomete pessoas negras e pobres. Somos negligenciados porque vivemos numa sociedade racista” afirmou a presidente da Associação de Pessoas com Doença Falciforme e Talassemia do Estado de Minas Gerais (Dreminas), Maria Zenó Soares. Ela reforçou ainda que “em tempos retrocessos, é uma vitória fazer um encontro como esse para discutir algo que ninguém quer falar que é o racismo institucional”.

A Política Nacional de Atenção à Pessoa com Doença Falciforme foi estabelecida no Brasil apenas em 2005, pela portaria número 1.391, durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar de a doença ter sido descoberta muito antes e estudada no Brasil desde a década de 1940.

Maria Zenó: “Somos negligenciados porque vivemos numa sociedade racista”. Foto: Carol Morena

O encontro foi promovido por Centro de Educação e Apoio para Hemoglobinopatias de Minas Gerais (Cehmob-MG), da Fundação Hemominas, Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico da Faculdade de Medicina da UFMG (Nupad), Associação de Pessoas com Doença Falciforme e Talassemia do Estado de Minas Gerais (Dreminas), e o Ministério da Saúde.

Reconhecer a existência para modificar efetivamente
A pediatra e coordenadora do projeto “Doença Falciforme: linha de cuidados na atenção primária a saúde”, do Nupad, Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes, reforçou que é preciso esforço de sair do comodismo e da negação para um trabalho coletivo de enfrentamento do racismo.

Segundo o Secretário de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, João Carlos Pio, alguns brasileiros se negam a reconhecer o problema, dificultando o combate a ele. “Se não tomamos conhecimento, não há como fazer algo para modificar”, afirmou.

João Carlos Pio usa da canção ‘Identidade’, de Jorge Aragão, para expor faces do racismo: “Se o preto de alma branca pra você/ É o exemplo da dignidade/ Não nos ajuda, só nos faz sofrer/ Nem resgata nossa identidade”. “Racismo é uma doença, mas é também uma ideologia. Uma construção histórica, social e política”, afirmou João.

Na definição do Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI), implementado no Brasil em 2006, racismo institucional é “o fracasso das instituições e organizações em prover um serviço profissional e adequado às pessoas em virtude de sua cor, cultura, origem racial ou étnica”. João fecha sua palestra afirmando que “essa segregação é o que está acontecendo com as pessoas vivendo com a doença falciforme”.

 

*Redação: Carol Prado – estudante de jornalismo
Edição: Mariana Pires