Estatuto da Criança e do Adolescente foi base para políticas de saúde

Redução da mortalidade infantil, ampliação da vacinação são resultados da aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente


13 de outubro de 2020 - , , , ,


Promulgado em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) garante proteção integral a todas as pessoas entre zero e dezoito anos e assegura acesso a “todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”. O ECA foi a porta para a criação de diversas políticas públicas em várias áreas, inclusive a da saúde. Isso fez com que a realidade de crianças e adolescentes mudasse nas últimas três décadas, desde a promulgação da norma.

O ECA foi um marco importante no entendimento de crianças e adolescentes como seres portadores de direito e que mereciam proteção e leis que garantissem o cuidado integral. Pode parecer uma obviedade hoje, mas foi um grande símbolo na garantia de direitos de crianças e adolescentes, que levou a uma mudança no perfil de meninos e meninas brasileiros e abriu portas para a criação de garantia desses direitos, como avalia a professora a professora do Departamento de Pediatria da Faculdade, Isabela Resende da Silva Scherer. “[Foram criados] inúmeros programas e diretrizes que visam o cuidado diferencial à primeira infância, especialmente os cinco primeiros anos, quando a gente tem um intenso processo de crescimento e desenvolvimento e que é muito importante que a criança tenha assegurados seus direitos, para que atinja um pleno desenvolvimento”, ressalta.

Direitos fundamentais

De acordo com o ECA, a vida e a saúde são direitos fundamentais. Para isso, estabelece diversas formas de garantia desses direitos, que começam desde o acompanhamento da gestação, por meio das consultas de pré-natal, pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O texto ainda prevê acolhimento no parto e no pós-parto. Esse é só um dos motivos que levou o país a reduzir os índices de mortalidade infantil. “Com esse princípio do cuidado integral, que começou lá no ECA, as políticas públicas voltaram-se para o cuidado com a criança numa visão de proteção. Com isso, a gente teve uma diminuição nas taxas de mortalidade infantil. As crianças que não estão mais no período neonatal, ou seja, têm mais de 28 dias de vida, tiveram uma maior redução nos índices de mortalidade”, explica.

“São as crianças que morriam por infecções que passaram a ser evitadas por vacinas, por baixas condições socioeconômicas, por desnutrição, por diarreia, pelo ciclo vicioso da pobreza e por más condições de higiene”

A visão de proteção integral do ECA possibilitou também o acesso a moradia, educação e saneamento, que também contribuíram para a redução da mortalidade. “Ao criar-se mecanismos de proteção a essa criança, que inclusive visam a garantir que ela tenha o direito a moradia adequada, a boas condições de saneamento básico, nós vimos a legislação impactando nessa diminuição importante da mortalidade infantil”, destaca.

Mortalidade infantil antes e depois do ECA:
1990, o total de mortes de crianças menores de um ano era de 47,1 a cada mil nascidas vivas. Em 2017, a taxa era de 13,4. 
Em 2016, houve um aumento nos índices de mortalidade, devido ao surto de zika vírus. 
Até hoje, os números ainda não voltaram ao patamar de 2015.

fonte: UNICEF

O ECA também prevê de mecanismos de proteção de crianças e adolescentes ao trabalho infantil e às várias formas de violência, como a sexual, física, psicológica, negligência e abandono. Além disso, atua na prevenção de doenças, ao estabelecer que o SUS promova assistência médica e odontológica, além de campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.

Uma dessas medidas é a obrigatoriedade da vacinação. O país até alcançou números satisfatórios de imunização e chegou até a erradicar doenças como a paralisia infantil e o sarampo. Mas, nos últimos anos, as taxas de vacinação vêm diminuindo em todo o país. “Talvez o principal problema seja a desinformação: notícias falsas, dados divulgados de forma errônea e que associam a vacinação a síndromes, sem nenhuma comprovação científica. E ao movimento antivacina que a gente tem visto crescer e tomar proporções que não esperávamos”, pontua.

Para mudar a realidade, é preciso espalhar informações confiáveis. “Se a gente lembrar que sociedade, família e estado são as três vertentes que devem garantir os direitos das crianças, então essas três esferas têm que trabalhar em conjunto: munir-se de informação, fazer campanhas e, principalmente, colocar como meta a adequada orientação da população para que nossas taxas de vacinação continuem a exercer esse papel de proteger nossas crianças”, finaliza.

Leia também: Taxa de vacinação cai em todo o mundo devido à pandemia de coronavírus

 O que diz o ECA
Art. 4: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Art. 5: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art. 14: O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
Art. 18 – a: A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.
*trechos extraído da lei 8.069 de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente)

Saúde da criança e do adolescente

Garantias de acesso à saúde, à educação e à moradia, livre de violências físicas, psicológicas e sexuais e com um desenvolvimento pleno são premissas do ECA. Trinta anos depois de promulgada, como a lei modificou a realidade de crianças e adolescentes brasileiros? Esse é o tema do Saúde com Ciência dessa semana. Confira a programação:

:: Garantia do direito à saúde
:: Combate ao trabalho infantil
:: Combate à violência contra crianças: castigos, negligência, violência física e psicológica
:: Combate à violência sexual: abuso, exploração e casamento infantil
:: A importância do brincar

Sobre o Programa de Rádio

Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify.