Falta de imunização é o fator responsável por surtos de febre amarela
Dados da SES-MG mostram como o perfil de não-vacinados coincide com o perfil dos casos.
16 de março de 2017
Na abertura do minicurso “Abordagem atual de Febre Amarela e Chikungunya”, dados da SES-MG mostram como o perfil de não-vacinados coincide com o perfil dos casos de febre amarela
Mais de 600 pessoas, de diferentes localidades, participaram, presencialmente ou online da webconferência “Abordagem da febre amarela no Estado de Minas Gerais”, na tarde de ontem, 15 de março. O evento é parte do minicurso Abordagem atual de Febre Amarela e Chikungunya.
A palestrante, diretora de vigilância ambiental da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), Marcela Ferraz, explicou que os dados de 2007 a 2016, ajudam a explicar o surto de febre amarela em 2017. Neste período, homens entre 15 e 40 anos não imunizados foram os mais acometidos, o que vai ao encontro das informações sobre a vacinação em Minas Gerais. A área de surto era a mesma que apresentava a menor cobertura vacinal, inferior a 48%, ainda que a recomendação seja vacinar todas as pessoas do estado, exceto casos especiais. “Quando se avalia este período por faixa etária observamos que as crianças têm cobertura vacinal alta. O problema é que a cobertura vacinal é de apenas 43% em homens de 15 a 59 anos, coincidente com a idade de maior adoecimento de febre amarela”, apontou Marcela.
Os números mais atuais apontam 89 municípios com notificações de febre amarela e 51 com casos confirmados. Na análise, a maior incidência de casos em 2017 ocorreu, aproximadamente, do dia 8 a 21 de janeiro. Além disso, com o gráfico apresentado, percebe-se uma diminuição de notificações, sendo que o caso mais recente confirmado foi registrado em 23 de fevereiro. Do número total de casos confirmados, 85% eram homens e 72% não tinham vacinado nenhuma vez. Atualmente, há 110 mortes confirmadas por febre amarela e 75 estão em investigação.
“A leitura que fazemos hoje é que o surto está caminhando para o controle, com poucos casos suspeitos dando entrada. Mas temos o grande desafio de encerrar o grande volume que está em investigação para podermos juntar todas as informações clínicas e epidemiológicas para concluir”, declarou Marcela. “Agora é partir para termos uma população imunizada adequadamente, com vigilância da doença ativa em todos o estado, preparada pra detectar precocemente os casos e evitar mais surtos”, completou.
Saúde pública e estratégia
Marcela Ferraz relembrou o impacto da febre amarela na saúde pública, já que é uma enfermidade grave, com letalidade em quase 50% das ocorrências, alto índice epidêmico e custo econômico elevado. Ela contou que desde a primeira notificação de suspeita, evidenciaram-se as ações executadas pela SES-MG, como a criação de uma Sala de Situação, que contava com diversos profissionais para determinar as estratégias e ações de enfrentamento.
Segundo ela, as estratégias de vigilância, prevenção e controle da febre amarela são sempre pensadas de acordo com o ciclo: o ciclo silvestre, que envolve os primatas como principal hospedeiro e os mosquitos Hemagogus Sabethes como vetor; e o ciclo urbano, com o homem como principal hospedeiro e o mosquito Aedes aegypti como o vetor. Segundo Marcela, o último caso registrado do ciclo urbano foi em 1942. Ou seja, desde então, ocorrem apenas o ciclo silvestre, no qual as pessoas contaminadas, provavelmente, residem ou trabalham em áreas muito próximas às matas.
Dentro dos dois ciclos, as principais estratégias são vigilância epidemiológica; a vacinação, disponibilizada pelo SUS; o controle vetorial; e a vigilância de epizootias, doenças detectadas nos primatas. “Tudo isso é feito para tentar reduzir a incidência da febre amarela silvestre, evitar que ocorra a transmissão dentro da área urbana e detectar oportunamente a circulação viral para que sirva como orientação das medidas de controle”, explicou a diretora.
Controle em outros estados
A bióloga Beatriz Salles, que estava na plateia, questionou se o número de casos de febre amarela está realmente caindo, já que está ocorrendo em outros estados. Ou seja, o surto estaria mesmo estabilizando e caminhando para o fim ou estaria migrando para outros locais?
Segundo Marcela Ferraz, no início do surto havia notificações de 100 casos suspeitos, já na semana passada foi apenas um caso. Além disso, considera-se que o surto está caminhando para o controle, devido a quantidade de pessoas que já foram imunizadas. “Atualmente, o Espírito Santo está vivendo um período de mais preocupação do que nós, além do Rio de Janeiro que começou a campanha de vacinação recentemente. Então, o país todo, mesmo Minas Gerais, continua em alerta. Mas, especificamente aqui, a situação está caminhando para o controle”, informou.
Surto de febre amarela e o desastre de Mariana
Participantes também questionaram a relação do surto de febre amarela com o desastre ambiental na cidade de Mariana, quando houve rompimento de uma barragem de rejeitos de minérios afetando o município e o meio ambiente. “É inevitável pensar que um impacto ambiental tão grande em uma bacia hidrográfica tão importante não possa ter mudado o ciclo silvestre da doença”, disse Beatriz Salles.
Segundo Marcela, em um primeiro momento a SES-MG precisou traçar estratégias para conter o surto da doença então, como primeira medida, não houve investigação da correlação entre os fatos. A partir dessa semana, com a redução dos casos, foi feita uma reunião para discutir estratégias de pesquisa para investigar se houve impacto na população de primatas e se, com isso, teve um desequilíbrio no ciclo. “Mas isso ainda é suposição. O que temos de evidência é que, desde 2014, há uma onda de circulação viral de febre amarela com casos isolados de humanos e primatas na região centro-oeste do país e em São Paulo, que são locais não afetados pelo desastre. No entanto, é uma possibilidade que precisa ser investigada”, declarou.
Universidade e conhecimento
O vice-diretor Humberto Alves reafirmou a missão da Instituição de produzir, transmitir e divulgar conhecimento. “Particularmente, nesse momento em que há aumento do número de casos dessas doenças, principalmente febre amarela, ficamos satisfeitos em abrigar essa convergência de esforços para contribuir na solução do problema”, disse.
O professor Cláudio de Souza, coordenador do Centro de Tecnologia em Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG (Cetes), que promove o minicurso em parceria com a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), ressaltou a relevância das parcerias e a realização de atividades como essa. “É muito importante fazermos essas atividades direcionadas aos profissionais de saúde para que os pacientes se beneficiem e tenham diagnósticos mais precoces, podendo reduzir, assim, as mortalidades causadas por essas doenças”, afirmou.
A professora da Escola de Enfermagem da UFMG, Solange Godoy, instituição também parceira do evento, complementou a fala de Souza, apontando como a união de diferentes áreas é uma oportunidade benéfica a todos os participantes. “É um rico momento a fim de fortalecer e capacitar aos profissionais das Unidades Básicas de Saúde para o atendimento de um problema emergente e crônico no Estado de Minas Gerais”, apontou.
A webconferência também contou com dois palestrantes da Fundação Ezequiel Dias (Funed), a instituição responsável pela análise das amostras e diagnóstico de febre amarela em Minas Gerais. O farmacêutico bioquímico Marcos Vinicius Ferreira e a responsável pelo serviço de gerenciamento de amostras biológicas, Cristiane Mendes, apresentaram sobre o que há disponível em questão de diagnóstico, como tem sido o fluxo, os métodos e as limitações dos métodos.
Programação
A programação do minicurso “Abordagem atual de Febre Amarela e Chikungunya” continua nesta quinta-feira e em outras três datas. Para receber o certificado de participação, os inscritos devem preencher uma ficha disponibilizada online ao final da transmissão de cada webconferência, tendo que participar de pelo menos quatro delas.
Para mais informações, acesse a página do websimpósio.