Mídias interativas podem desenvolver a linguagem em crianças pré-escolares
Mídias podem ser utilizadas como um recurso para estimular o desenvolvimento infantil.
23 de maio de 2018
Essas mídias podem ser utilizadas como um recurso capaz de estimular o desenvolvimento infantil desde que haja a supervisão dos cuidadores quanto ao conteúdo e ao tempo na utilização dessas tecnologias.
*Raíssa César
A partir da observação do uso precoce das mídias interativas, como smartphones e tablets, a fonoaudióloga Lívia Rodrigues desenvolveu um estudo pioneiro no Brasil sobre o desenvolvimento cognitivo e da linguagem expressiva (fala) em crianças pré-escolares a partir da exposição a essas mídias. A pesquisa foi defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Fonoaudiólogicas da Faculdade de Medicina da UFMG.
De acordo com a pesquisadora, é consenso na literatura que várias habilidades adquiridas na infância perdurem pela vida adulta. “Por esse motivo, é importante investigar e saber o que acontece na infância, seja para prevenir futuros danos, seja para otimizar o desenvolvimento da criança”, afirma.
Por meio da avaliação comparativa de três grupos de crianças foi possível concluir que aquelas que utilizaram as mídias interativas por maior tempo ao dia tiveram melhor desempenho nos testes cognitivos, que avaliaram as funções mentais superiores, e de linguagem expressiva. Esse resultado foi ainda mais significante no domínio linguístico.
Lívia destaca que as mídias têm potencial para favorecer o desenvolvimento infantil, sobretudo quando elas estão condicionadas a conteúdos adequados e à presença de um tutor. “Dessa forma, o acesso pode ser benéfico, desde que seja limitado em relação ao tempo e ao conteúdo”, esclarece.
Metodologia
Foi selecionada uma amostra de 72 crianças, de 24 a 42 meses de idade, matriculadas em creches públicas e privadas do município de Diamantina, na região do Jequitinhonha, em Minas Gerais, no período de setembro de 2016 a fevereiro de 2017. Inicialmente, os pais ou responsáveis responderam a um questionário, que contemplou dados relativos a eles, sua escolaridade, à criança (histórico e estado de saúde) e ao uso das mídias interativas (tipo, tempo gasto e forma de acesso).
Com as respostas, as crianças foram separadas em três grupos homogêneos, semelhantes no aspecto socioeconômico, na idade e no histórico de uso das mídias. O primeiro agrupava aquelas que não tinham sido expostas aos dispositivos; o segundo, aquelas que utilizavam as mídias por até 35 minutos ao dia; e o terceiro, as que utilizavam por tempo superior a 35 minutos ao dia. Esse valor foi estipulado a partir do tempo médio do acesso das crianças, de acordo com o questionário.
Em cada grupo, a linguagem expressiva e os aspectos cognitivos foram avaliados por meio de um teste validado e de reconhecimento internacional direcionado a crianças de 1 a 42 meses de idade. Ele avalia os diversos domínios (aspectos cognitivos, motores, de linguagem e outros) a partir da interação do aplicador com a criança por meio de brinquedos, observações e propostas.
Importância da supervisão dos pais
A partir da análise dos dados, foi possível encontrar uma correlação positiva entre o uso de mídias interativas, em especial o tablet, e o desenvolvimento cognitivo e de linguagem expressiva nas crianças analisadas, desde que o acesso fosse na presença dos cuidadores e com limitação de tempo e de conteúdo.
“Percebeu-se uma preocupação grande por parte dos responsáveis tanto em estimular a criança durante o acesso quanto em protegê-la de conteúdos inadequados, o que pode ter contribuído para o resultado positivo”, esclarece Lívia.
Além disso, a pesquisadora informou que a Academia Americana de Pediatria recomenda que as crianças de até cinco anos de idade fiquem expostas por no máximo uma hora por dia a telas, incluindo televisão e videogame.
Linguagem
O grupo 3, de crianças que utilizavam os dispositivos por tempo superior a 35 minutos ao dia, teve desempenho superior aos demais, tanto no aspecto cognitivo quanto no de linguagem expressiva. Porém, os resultados em relação à linguagem foram os mais significativos, de acordo com Lívia.
Os grupos com maior diferença nos escores (grupos 2 e 3) apenas variaram entre si quanto ao tempo de exposição às mídias interativas. Assim, a pesquisadora concluiu que essa exposição foi o fator responsável pelos melhores resultados do grupo 3.
Cognição
Em relação ao desempenho cognitivo, os grupos com diferença média significativa nos escores foram os grupos 3 e 1. Porém, o grupo 3 era composto por crianças que frequentavam, majoritariamente, instituições privadas, em relação ao grupo 1. Segundo a fonoaudióloga, estudos brasileiros anteriores concluíram que o desempenho cognitivo de crianças nessas instituições é maior do que em instituições públicas. “Por esse motivo, pode-se entender que essa distinção institucional nos grupos 3 e 1 poderia ser um viés nos resultados finais”, afirma Lívia.
Por fim, a pesquisadora aponta para a necessidade de estudos futuros, recomendando que estudos com amostras populacionais maiores sejam conduzidos e, também, que a realidade seja investigada em cada localidade. “Os desafios da saúde precisam ser pautados pela especificidade de cada lugar. Há questões socioeconômicas e culturais típicas do município, então não podemos generalizar esses dados”, defende. “Porém, finalmente, temos dados brasileiros relativos a essas crianças”, conclui.
Nome do trabalho: A influência da utilização de mídias interativas (tablets e smartphone) no desenvolvimento cognitivo e de linguagem em crianças de 24 a 42 meses
Autora: Lívia Rodrigues Santos
Nível: Mestrado
Programa: Pós-Graduação em Ciências Fonoaudiológicas
Orientadora: Juliana Nunes Santos
Coorientador: Vanessa de Oliveira Martins Reis
Data da defesa: 1º de março de 2018
Redação: Raíssa César – estagiária de jornalismo
Edição: Mariana Pires