Orientações quanto à prática de atividade física na infância e na adolescência
Está bem estabelecido que a realização regular e contínua de atividade física é benéfica a indivíduos em qualquer faixa etária e previne contra doenças crônicas, como hipertensão arterial sistêmica, obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares. Os impactos positivos de tal exercitação estendem-
se aos vários sistemas do corpo humano e os efeitos mais impactantes na
qualidade de vida referem-se aos sistemas cardiovascular, respiratório e
osteomuscular. Em relação ao sistema cardiovascular, há aumento da força de
contração e redução da freqüência cardíaca, com melhor condicionamento da
musculatura estriada cardíaca. Esse efeito se soma ao maior retorno venoso e
linfático proporcionado pela contração muscular, potencializando a irrigação de
periféricos.
No sistema respiratório observa-se expansibilidade torácica, enquanto no sistema esquelético,
o aumento do tônus acarreta melhora da postura, além de otimizar o processo de deposição de
matriz óssea.
A intensidade e freqüência da atividade física a ser desenvolvida
dependem do objetivo do indivíduo. No caso de um atleta, deve-se obter o
melhor rendimento, sem que haja danos físicos ou psíquicos ou agravamento
de quadros patológicos. Para as demais pessoas, a exercitação física não
precisa ser tão intensa, entretanto, em todos os casos, deve ser contínua
(durante toda a vida), ainda que a modalidade e intensidade sejam variáveis.
A exercitação física deve ser estimulada já na infância. Segundo
Ronque e cols., a prática sistemática de atividade física na infância e
adolescência aumenta a aptidão física e reduz o risco de doenças crônicas e
disfunções metabólicas em idade precoce. Além disso, o estilo de vida
aprendido durante essas fases parece influenciar os hábitos de toda a vida,
inclusive o comportamento em relação à exercitação física.
No caso de crianças e adolescentes, a atividade física merece
considerações especiais. Durante essas fases da vida, o indivíduo se encontra
processo apresentando não só maior vulnerabilidade a danos físicos e emocionais, como
de crescimento e amadurecimento também mudanças significativas em relação a interesses e
objetivos (incluindo a adesão a exercícios físicos).
De acordo com as principais etapas do desenvolvimento infantil,
Carazzato divide o período da infância e adolescência em quatro fases (zero a
1 ano, “conhecimento”; 1 a 6 anos, “desenvolvimento neuropsicomotor”; 6 a 12
anos, “crescimento”; e 12 a 18 anos, “desenvolvimento”) e sugere que a
orientação quanto à atividade física seja individualizada para cada fase, da
forma abordada a seguir.
1. Conhecimento: 0 a 1 ano
Durante o primeiro ano de vida, as atividades realizadas pela criança
são muito limitadas e a exercitação física intuitiva.
Enquanto a criança não consegue mudar de decúbito, os cuidadores
devem basicamente auxiliar na escolha da melhor posição para cada atividade:
• decúbito lateral após alimentação, eructação ou para dormir (evita
aspiração de conteúdo de possível refluxo gastroesofágico);
• decúbito
visualização das mãos e objetos).
As crianças devem ser estimuladas de acordo com o marco de
desenvolvimento motor já atingido. Dessa forma, uma criança que já se
assenta deve ser estimulada a adotar uma postura de sustento, sem que
ocorra grande inclinação anterior do tronco. Para tanto e para facilitar a
transição de decúbitos e o ato de engatinhar, os cercadinhos e andadores
devem ser evitados nesta fase.
A movimentação, mudança de decúbitos, tentativa de ajoelhar e mesmo
de levantar-se, podem ser estimulados por meio da apresentação de objetos
chamativos. No segundo semestre, é importante que a criança tenha liberdade
de locomoção em espaço amplo para evitar acidentes. A partir dos seis meses,
o contato com água deve ser estimulado, ainda que o objetivo ainda não seja
aprender a nadar.
2. Desenvolvimento neuropsicomotor: 1 a 6 anos
Nessa etapa, a criança é capaz de andar, correr, pular, segurar e
arremessar e o estímulo deve respeitar a capacidade de realizar as atividades.
Geralmente as habilidades seguem um padrão de ocorrência. Inicia-se
pelo andar ainda inseguro, com muitas quedas; passando pelo controle total do
andar, correr, conseguir parar subitamente, andar de lado e para trás; e chega-
se à capacidade de agachar, subir degraus e pular. Durante esse
desenvolvimento de habilidades, o cuidador deve sempre estar próximo,
acompanhando as atividades; a princípio auxiliando sua execução e
gradualmente reduzindo sua interferência e deixando a criança ganhar
autonomia.
Quando a criança já domina essas atividades, é possível estimular
outras mais complexas, como mergulhar (inicialmente “em pé” e depois “de
cabeça”), arremessar e chutar bola, e por fim, pegar objetos lançados, sempre
por meio de brincadeiras.
3. Crescimento: 6 a 12 anos
Nessa faixa etária, todos os atos motores são possíveis. Esse é o
momento de iniciar a programação de atividades físicas sistemáticas, com
horários determinados e uma rotina estabelecida. Além dos exercícios físicos
realizados na escola, o ideal é que a criança participe de atividades em uma
“escolinha de esportes”, com esportes variados, tanto em água, quanto em
solo, sempre de forma coletiva.
Aos 10 anos, já é possível a escolha de um esporte específico para
prática rotineira, de acordo com a preferência e habilidades da criança. É
importante lembrar que nessa fase a criança encontra-se em franco
crescimento, com alongamento de ossos e estruturas músculo-esqueléticas,
não devendo haver sobrecarga aos mesmos.
4. Desenvolvimento: 12 a 18 anos
Nessa etapa há a decisão da realização da atividade física como
atividade recreativa e preventiva ou na qualidade de esporte competitivo.
Quando a opção é de realizar um exercício competitivo (esporte), o
que geralmente significa maior intensidade e freqüência, deve-se atentar
ainda mais para algumas questões peculiares da criança, discutidas a seguir.
Qualquer tipo de pressão emocional, como necessidade de vencer ou de
agradar ao técnico, ao professor ou à família, é negativo ao desenvolvimento
psíquico da criança ou adolescente. Esforços intensos e contínuos (como no
futsal) podem causar desenvolvimento anormal do músculo cardíaco, com
prejuízo da sua contratilidade, sendo por isso contra-indicados. Atividades
como lutas ou com mobilização de peso (musculação, por exemplo) podem
ocasionar hipertensão arterial devido ao uso de apnéia durante a realização
da força, além de lesões mecânicas nas estruturas osteomusculares imaturas,
hipertrofias deformantes, distúrbio de crescimento e defeitos posturais. Já a
prática de atividades físicas aeróbicas, de moderada intensidade, e com uso
principalmente de grandes grupos musculares, é segura e benéfica às crianças
e adolescentes.
Weffort e cols. propõem uma tabela que simplifica as recomendações
em relação à prática de atividade física para cada etapa de desenvolvimento da
infância e da adolescência:
Idade (anos)
Atividade
Pegar objetos, sentar, rolar, engatinhar, levantar, andar,
estimulação da psicomotricidade, brincar na água a partir de 6
meses
Recreação, arremessar a um alvo, pegar ou chutar bola, pular,
explorar o meio ambiente, pedalar, correr, saltar obstáculos ou
degraus, subir escadas, mergulhar
Escolas de esportes, natação, ginástica olímpica, dança,
basquetebol, futebol, voleibol, entre outros (não-competitivos)
Esportes competitivos
Fonte: Weffort VRS & Lamounier JA. Nutrição em Pediatria.
Da neonatologia à adolescência. Ed. Manole. 2009
REFERÊNCIAS
Carazzato JG. Atividade Física na Criança e no Adolescente. Em Ghorayeb N
& Barros T. O Exercício. Ed. Atheneu. 1999. p 351-361.
Ghorayeb N, Bozza A, Loos L, Fuchs ARCN. Aspectos Cardiovasculares da
Criança Atleta. Em Ghorayeb N & Barros T. O Exercício. Ed. Atheneu. 1999. P
363-373.
Ronque ERV, Cyrino ES, Dórea V, Serassuelo Jr H, Galdi EHG, Arruda M.
Diagnóstico da aptidão física em escolares de alto nível socioeconômico:
avaliação referenciada por critérios de saúde. Rev Bras Med Esporte. Vol. 13,
nº2. 2007.
Seabra AE, Mendonça DM, Thomis MA, Anjos LA, Maia JA. Determinantes
biológicos e sócio-culturais associados à prática de atividade física de
adolescentes. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro. 24(4):721-736. 2008.
Weffort VRS & Lamounier JA. Nutrição em Pediatria. Da neonatologia à
adolescência. Ed. Manole. 2009.