Pandemia intensificou automutilação em adolescentes, aponta estudo da UFMG

Artigo mostra que a taxa de suicídio se estabilizou, mas como importante questão de saúde pública, mesmo depois do Setembro Amarelo o assunto segue necessário para orientar ações futuras: Se precisar, peça ajuda!


01 de outubro de 2025 - , ,


A valorização da convivência social, da harmonia familiar e do uso equilibrado da tecnologia fortalece redes de apoio e ajuda a prevenir comportamentos autodestrutivos – Imagem Freepik.com

A pandemia de covid-19 intensificou os casos de automutilação “não suicida” entre adolescentes, quando não há intenção de morte. Este foi um dos principais resultados de uma rigorosa revisão sistemática conduzida por pesquisadores do Centro de Tecnologia em Medicina Molecular (CTMM) da Faculdade de Medicina da UFMG. Eles investigaram detalhadamente se houve mudanças na frequência de fatores de risco ligados à ideia de suicídio, às tentativas de suicídio e à automutilação em jovens.

Os resultados dessa análise rigorosa e profunda foram publicados na revista científica Frontiers in Psychiatry. Afinal, segundo o Ministério da Saúde, entre 2010 e 2019, portanto antes da pandemia de covid-19, as mortes por suicídio aumentaram 43%. Ou seja, subiram de 9.454 casos, em 2010, para 13.523, em 2019. Os números dão uma ideia da importância social desse assunto. 

O estudo 

Coordenado pelos professores Débora Marques de Miranda, do Departamento de Pediatria, e Marco Aurélio Romano-Silva, chefe do Departamento de Psiquiatria, o estudo analisou 55 artigos focados em adolescentes com idade entre 10 e 19 anos, de diversos países. 

Em comparação com os dados encontrados entre 2010 e 2019, o estudo mostra que a automutilação, a prática de cortar ou ferir o próprio corpo, cresceu na pandemia e sua prevalência ficou entre 17,6% e 27,9% nos estudos analisados. Já o número de tentativas de suicídios permaneceu estável. 

Para garantir a confiabilidade dos dados, foi seguido o protocolo internacional PRISMA (Itens de Relatório Preferenciais para Revisões Sistemáticas e Meta-Análises, numa tradução livre do inglês. Já os registros foram incluídos no Registro prospectivo internacional de revisões sistemáticas (PROSPERO).

O psiquiatra Danilo Bastos BispoFerreira, primeiro autor do artigo, explica que os principais fatores de risco se repetem em diferentes contextos: isolamento social, excesso de tempo diante das telas, conflitos familiares, dificuldades escolares e sintomas de depressão. “Não basta prevenir apenas o suicídio. A automutilação aumentou e pode ser porta de entrada para problemas mais graves”, alerta o pesquisador.

Caminhos para enfrentar o problema

Eles defendem medidas como:

  • capacitar professores para identificar riscos;
  • apoiar famílias vulneráveis com assistência psicossocial;
  • criar serviços de saúde mental acolhedores;
  • promover campanhas contra o estigma e a favor da busca por ajuda.

Romano-Silva reforça que políticas públicas precisam levar em conta desigualdades sociais, gênero e perdas familiares. Débora Miranda acrescenta que pais e escolas devem observar sinais como ferimentos repetidos, mudanças de comportamento ou afastamento de amigos, pois a detecção precoce facilita o encaminhamento a tratamento especializado.   

Próximos passos

Os autores destacam a importância de ampliar estudos que acompanhem jovens ao longo do tempo, incluir regiões pouco representadas como América Latina e África, investir em intervenções precoces com apoio tecnológico e fortalecer redes de apoio em escolas e comunidades.

Além disso, recomendam incluir regiões pouco representadas, como América Latina e África, assim como investir em intervenções precoces com apoio tecnológico e fortalecer redes de apoio em escolas e em comunidades.

Eles também lembram que a convivência familiar, a harmonia em casa e o uso equilibrado da tecnologia podem reduzir os riscos de comportamentos autodestrutivos.

O INCT Neurotec-R (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Neurotecnologia Responsável) é uma rede nacional de laboratórios que atua em estudos relacionados ao cérebro e à neurotecnologia. A iniciativa busca desenvolver ciência e inovação alinhadas à ética, à participação social e ao impacto positivo na vida das pessoas. 

[Leia o artigo]

Suicidality and self-harm in adolescents before and after the COVID-19 pandemic: a systematic review
Danilo Bastos Bispo Ferreira, Renata Maria Silva Santos, Maria Carolina Lobato Machado, Victhor Hugo Martins Rezende, Patrícia Gazire de Marco, Marco Aurélio Romano-Silva e Débora Marques de Miranda
Systematic Review Article. Front. Psychiatry, v.16. 18 setembro 2025


Marcus Vinicius dos Santos – jornalista CTMM Medicina UFMG