Poluição hídrica e questões ambientais devem ser discutidas e enfrentadas
Poluição dos rios e desmatamento afetam qualidade e quantidade de água nas bacias hidrográficas
03 de agosto de 2018
Poluição dos rios e desmatamento comprometem qualidade e quantidade de água disponível nas bacias hidrográficas. Nova série de rádio aborda relação entre saúde e meio ambiente
Warlen Valadares*
Boa parte dos rios brasileiros está poluída, afetando peixes e outros animais e prejudicando famílias ribeirinhas que dependem da pesca. A poluição hídrica também favorece a transmissão de doenças, como a cólera, disenteria, verminoses e hepatites A e B, e pode comprometer ainda o abastecimento de água nas grandes cidades. Em geral, a poluição das águas está diretamente associada a outras questões ambientais, como o desmatamento, o descarte inadequado do lixo e a emissão de gases poluentes na atmosfera, que precisam ser discutidas e enfrentadas pelo poder público, empresas e cidadãos.
“A água reflete as atividades humanas que são realizadas na bacia hidrográfica. A agricultura, a indústria, a maneira de trabalhar o solo, os hábitos da construção urbana, o destino do esgoto e do lixo, tudo isso se manifesta na água. O espelho d’água mostra nossa cara”, afirma o médico, ambientalista, idealizador do Projeto Manuelzão e professor aposentado da Faculdade de Medicina da UFMG, Apolo Heringer. “A situação dos rios brasileiros, tanto urbanos quanto no meio rural, a quantidade e as formas dos corpos d’água, se estão bem tratados, se estão cobertos de asfalto. Tudo isso indica a mentalidade humana na forma que o ser humano trata a natureza”, pontua.
Para Heringer, a poluição tira o prazer de uma pessoa contemplar um rio, porque ninguém quer estar à beira de um rio poluído e mal cheiroso. Essa poluição traz impactos negativos na questão estética e na saúde humana, o que, segundo ele, demonstra um nível de mentalidade incompatível com o que a natureza necessita. A má qualidade da água impede que ela seja utilizada sem o devido tratamento.
No país, as fontes de água doce, em geral, recebem lixo sólido, agrotóxicos e outros produtos químicos, além do esgoto de residências, hospitais e até resíduos industriais. “O tratamento do esgoto não está sendo bem feito no Brasil. Nos poucos locais onde há tratamento, ele é insuficiente. Trata-se apenas uma parte e não de forma completa. Estamos produzindo esgoto e lixo que caem na água, tornando-a impossível de ser utilizada, tanto por seres humanos como pela plantas e demais animais. Então, o impacto sistêmico na natureza é muito negativo, porque interfere na cadeia alimentar de todos os seres vivos”, alerta Apolo Heringer.
A poluição dos rios e o desmatamento afetam, além da qualidade, a quantidade da água doce disponível nas bacias hidrográficas. “Quando chove em uma região sem vegetação, a água escorre com violência, produzindo erosão, assoreando os rios e vai embora. A água não fica onde ela não tem como morar. A água mora nos ecossistemas, que são o solo e as plantas. A vegetação apoia a chuva, a água infiltra no solo fazendo as nascentes e rios terem água o ano inteiro”, explica o ambientalista.
Heringer acrescenta que as atividades humanas rompem a lógica do ciclo hidrológico, o que abrange a chuva, solo, nascentes, rios, plantas e animais que ajudam a espalhar a flora através das sementes que ingerem. O ser humano ataca a base da vida na Terra ao interferir no ciclo de reprodução das plantas e animais, atitude que o entrevistado considera completamente irracional.
De acordo com ele, essa relação problemática do homem com a água e o meio ambiente precisa ser debatida. “Destruir a natureza, se você depende dela pra sobreviver, é uma atitude absolutamente inexplicável e negativa. O ser humano é considerado um animal racional, com acesso ao conhecimento, à ciência, e é o que mais prejudica a natureza. Os demais animais têm uma relação compatível com a vida, sustentável com a natureza. É uma questão muito profunda pra gente fazer uma reflexão”, pondera.
Responsabilidade política e econômica
Para preservar o meio ambiente e a vida no planeta, Apolo Heringer acredita ser fundamental, e até urgente, mudar o modelo econômico atual de produção e consumo, baseado na extração de recursos minerais e agricultura predatória. “Precisamos também diminuir a pecuária, estimulando a mudança para uma dieta que tende a ser mais vegetariana, porque o consumo de proteína animal aumenta o preço dos alimentos, o desmatamento e traz consequências negativas à nossa saúde”, defende. O ambientalista completa que os grandes produtores rurais e industriais brasileiros não respeitam as leis vigentes no país, ao retirarem volumes importantes de água subterrânea e fluvial sem a devida compensação pública.
Além disso, diversos projetos de lei em tramitação no Congresso flexibilizam a legislação ambiental, como destaca a professora do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Maria Auxiliadora Drumond. Ela esclarece que essas novas leis, se aprovadas, tornam o processo de licenciamento ambiental de grandes empreendimentos menos rigoroso e favorece o uso de agrotóxicos nocivos ao meio ambiente e à saúde humana, caso do Projeto de Lei 6.299/2002, conhecido popularmente como “PL do Veneno”.
Maria Drumond considera que iniciativas que promovem o uso sustentável dos recursos naturais disponíveis em biomas brasileiros e ações educativas de longo prazo, direcionadas à população geral, indicam a melhor forma de administrar a questão ambiental. “Essas ações não devem estar isoladas do contexto social. Eu vejo a educação ambiental como a possibilidade de transformação da sociedade em todos os níveis, atuando na causa do problema, não pontualmente. Por exemplo, fazer brinquedo com garrafa pet pode ser educativo, mas será que temos que consumir pet mesmo? Ou devemos atuar nas raízes do problema, trabalhando na postura política, lidando com os interesses econômicos? Acho que esse processo educativo deve ser sistêmico”, argumenta.
Sobre o programa de rádio
O Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h.
O programa também é veiculado em outras 187 emissoras de rádio, distribuídas por todas as macrorregiões de Minas Gerais e nos seguintes estados: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins e Massachusetts, nos Estados Unidos.
*Redação: Warlen Valadares – estagiário de Jornalismo
Edição: Lucas Rodrigues