Prevenção da perda auditiva ocupacional deve ser planejada por visão interprofissional
26 de maio de 2018
Além do envolvimento de especialistas de múltiplas áreas, resultados do programa de conservação auditiva tem maior eficácia quando os próprios trabalhadores também são envolvidos
Em defesa da interprofissionalidade, programação do ultimo dia do 3º Congresso de Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da UFMG apresentou um case com participação de profissionais de diversas áreas na prevenção de perdas auditivas no ambiente ocupacional. Na mesa-redonda Audiologia, realizada neste sábado, 26 de maio, a fonoaudióloga Deborah Lorentz, diretora da Ofício, empresa de consultoria que oferece soluções em qualidade de vida no trabalho, mostrou como a participação dessas diversas especialidades pode atingir o sucesso no que diz respeito à saúde e segurança do trabalhador.
“Apesar dos avanços tecnológicos, a perda auditiva no ambiente ocupacional continua sendo um dos agravos mais prevalentes em organizações do mundo inteiro”, afirmou Deborah. Ela contou que, nos estudos brasileiros, a prevalência de perda auditiva no ambiente ocupacional tem variado entre 15,9% e 28,3%. “É uma doença muito comum no ambiente de trabalho. Atribuímos isso ao risco do ruído, que é o agente de risco mais prevalente nos processos industriais do mundo inteiro. Apesar de não ser o único agente, só ele é regulamentado pelo Ministério do Trabalho (MTE) e é o mais comum”, continuou.
De acordo com a fonoaudióloga, assim, consequentemente a perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados (Panse) é uma das doenças ocupacionais mais frequentes em todo o mundo. “Além dos distúrbios auditivos, o ruído pode estar na gênese da hipertensão arterial, stress, aumento da tensão muscular e na incapacidade de concentração, contribuindo, assim, para o aumento de acidentes de trabalho”, acrescentou. “Então, quando desenvolvemos programas preventivos com o foco na conservação auditiva dos trabalhadores, estamos atuando para prevenir doenças ocupacionais”, completou.
Mesmo que altamente prevalente, Deborah destacou que a perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados é totalmente passível de prevenção. “O próprio MTE e a Previdência Social apesenta legislação para orientar as empresas a implantarem o Programa de Conservação Auditiva (PCA)”, informou. Esse programa é entendido como um conjunto de atividades que visam prevenir ou estabilizar as perdas auditivas ocupacionais por meio de um processo dinâmico que desenvolve atividades planejadas e coordenadas entre as diversas áreas envolvidas na organização. “Ou seja, na própria definição do PCA já encontramos a necessidade do envolvimento de um conjunto de profissionais, uma equipe interprofissional”, enfatizou.
A perda auditiva no ambiente ocupacional é multifatorial
Deborah Lorentz lembrou que há vários agentes de risco para a perda auditiva ocupacional, mas a legislação brasileira atual não comtempla a avaliação e o acompanhamento da audição de trabalhadores expostos exclusivamente a outros riscos ocupacionais como a exposição a produtos químicos, calor, vibração, entre outros. “Esses trabalhadores ficam descobertos no ponto de vista da legislação. Mas é um assunto que está sendo discutido e evoluindo. Por isso quem trabalha nessa área tem que ter uma visão mais abrangente dos riscos, pois essa é a visão necessária na análise do Programa de Conservação Auditiva”, apontou.
Como a Panse depende da intensidade sonora e do tempo de exposição, o Ministério do Trabalho e Emprego definiu, em uma norma regulamentadora, o limite de tolerância para uma jornada de trabalho de oito horas. “Além disso, a perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados é influenciada pela exposição simultânea de outros agentes. Por isso precisamos fazer uma anamnese completa, perguntando ao trabalhador se está exposto a esses outros riscos, considerado, ainda, a susceptividade individual”, comentou.
A visão interprofissional na prevenção e segurança do trabalhador
De acordo com Deborah, ao entender o contexto legal e a prática profissional, conclui-se que o PCA é uma interface do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, quando o assunto é ruído, e do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional quando o assunto é saúde auditiva. “Nesse primeiro, há o envolvimento maior do engenheiro de segurança do trabalho. Já no segundo, o médico do trabalho é o responsável pelo programa”, afirmou. Para ela, o trabalho dos fonoaudiólogos está exatamente na interseção desses dois.
“Nós fonoaudiólogos temos um papel extremamente relevante dentro da implantação e desenvolvimento do PCA nas empresas. Mas, não atuamos sozinhos”, declarou. “A receita para o sucesso do Programa de Conservação Auditiva, com resultados relevantes aos trabalhadores, sem dúvida alguma, é a atuação interprofissional”, defendeu. “Precisamos de profissionais qualificados atuando em equipe, com o engajamento da liderança. Mas, acima de tudo, ter o trabalhador como foco do serviço. Ele é o personagem principal do programa”, enfatizou.
A médica do trabalho, Cassia Soares Pereira, também palestrante da mesa-redonda, realçou a ideia defendida por Deborah. “Claro que o envolvimento de vários especialistas é necessário, mas é preciso envolver os empregados . Eles têm que ser a voz principal. A solução vem do próprio processo de produção, precisa ser embasada neles”, disse.
O palestrante e engenheiro de segurança do trabalho, Vinicius Cunha Prado, também argumentou que é fundamental perguntar e ouvir os outros profissionais, inclusive para os engenheiros especialistas. “Em um grupo interprofissional, cada um pode contribuir com uma informação para propor intervenções viáveis no controle de ruídos”.
Com todas essas informações, Prado revelou que é possível elaborar um documento para que, na continuidade do trabalho, seja possível um planejamento de implantação das medidas de engenharia ou administrativas. Neste documento, pode-se colocar cada tipo de atividade e medidas de controle viabilizadas. “Nestas, é possível, ainda, pontuar as expectativas de redução sonora com o sistema implantado e o custo de investimento para implementação. O mais importante, é que as medidas propostas sejam validadas por toda a equipe interprofissional”, expôs.
“Os benefícios do PCA vai além do cumprimento da legislação. Envolver programas com foco na prevenção traz ganho ao trabalhador na sua qualidade de vida, ganha a empresa por cumprir a legislação e a sociedade ganha quando a empresa cumpre seu papel social na concepção de saúde para todos”, finalizou Cassia.
Acesse a programação completa do 3° Congresso.
Mais informações: Departamento de Fonoaudiologia – 3409-9117 ou 3congressofono@gmail.com

