Evento discute privação de liberdade em diferentes instituições totais

Pesquisadoras apresentaram o problema dessas instituições, presentes em diferentes segmentos da sociedade


09 de julho de 2019 - , ,


Pesquisadora Paula Januzzi. Foto: Carol Morena.

Nesta terça-feira, 9 de julho, no “Seminário Vivência e Evidências: a luta contra a violência”, pesquisadoras apontaram que “instituições totais”, aquelas onde pessoas ficam confinadas sem acesso ao externo, é um tema amplo e presente em vários âmbitos da sociedade. Apresentando seus trabalhos desenvolvidos junto ao Programa de Pós-Graduação Promoção de Saúde e Prevenção da Faculdade de Medicina da UFMG, elas abrangeram o debate aos serviços de saúde, instituições de privação de liberdade e até as ruas da cidade.

Uma das mesas, inclusive, recebeu o nome do psiquiatra César Campos, que participou da luta antimanicomial no Brasil no fim dos anos 70, a fim de simbolizar a importância dos outros modos de lidar com essas situações. De acordo com a pesquisadora Paula Januzzi esse movimento é uma alternativa às instituições totais como manicômios.

“O matriciamento – integração das atenções em saúde – é um modo de confrontar a instituição total, já que ela é uma maneira de associar usuário, comunidade, território, equipe de saúde da família, psiquiatra e psicólogo. Então a ideia é permitir que o usuário esteja integrado à sua comunidade”, explicou Paula. 

A autora ainda revelou três pontos que tem interferido na implantação do sistema de matriciamento: o desconhecimento por parte dos profissionais do que seja esse serviço; as hierarquias do serviço de saúde; e a supervalorização dos especialistas em detrimento das equipes de saúde da família. “Se uma pessoa não entende bem a construção de um plano de cuidado de um paciente com sofrimento mental, a chance de mudar a prática dele é muito pequena”, falou. Além disso, ela citou a hierarquia que não ajuda o paciente e torna o serviço menos efetivo. 

“Tendemos a supervalorizar o especialista e desvalorizar a equipe de saúde da família, o que nos faz ignorar algumas tecnologias que todos, independentemente da função, podemos utilizar na Atenção Primária, como as tecnologias para acolhimento e o encaminhamento para o responsável”, acrescentou. 

Instituições totais influenciam fala e modo de vida de sujeitos privados de liberdade

Maria Radharani. Foto: Carol Morena.

Maria Radharani, por sua vez, por fazer parte da equipe responsável pelas alternativas às medidas privativas de liberdade, procurou compreender a realidade de adolescentes que estão nos sistemas socioeducativos durante seu estudo de mestrado, também apresentado durante o evento.

“A intenção era perceber o que eles entendiam da medida socioeducativa e o que impactou na vida deles. Foram entrevistas longas em que os adolescentes tiveram liberdade para falar. A partir dessas falas, foram surgindo outros ganchos nos quais fazia intervenções para que eles aprofundassem um pouco mais nesses assuntos”, expôs.

Entre os diversos fatores, a especialista destacou que o modo como os entrevistados falavam eram muito similares, o que pode ser um fator comum entre pessoas privadas de liberdade. “Percebo que a fala do sujeito privado de liberdade é sempre direcionada. É sempre uma fala para a liberdade. Em uma unidade de repressão, como é uma unidade de cumprimento de pena, tudo é muito pautada nas regras, no controle do comportamento, o que faz com que a fala desses sujeitos seja sempre uma fala formatada para o que a sociedade quer ouvir”, frisou. 

Por fim, ela concluiu que as questões sobre as vidas dessas pessoas nesses espaços trazem muitos sofrimentos, uma vez que as políticas públicas nesses locais são insuficientes. “As políticas públicas são insuficientes dentro desses espaços, mais ainda do que as que nós vivenciamos na sociedade como um todo”, confirmou. “A visibilidade sobre esses sujeitos é mínima e os investimentos são menores ainda”, ressaltou. 

O evento

O Seminário Vivências e Evidências: a luta contra a violência é promovido pelo Programa de Pós-Graduação de Promoção em Saúde e Prevenção da Violência da Faculdade de Medicina da UFMG. A programação, realizada nos dias 8 e 9 de julho, conta com mesas-redondas, conferências, grupos de discussão e atividades culturais.

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