Sequelas dos desastres, insegurança e terceirização deterioram saúde do minerador

No Mês do Trabalhador, podcast “Saúde com Ciência” debate saúde dos mineradores.


16 de maio de 2022 - ,


O rompimento de duas barragens de mineração nos últimos dez anos, o risco de rompimento de outras estruturas e a grande terceirização de trabalhadores desse setor são alguns elementos que levam a precarização da saúde dos trabalhadores da mineração. Para se ter uma ideia, desde o rompimento da barragem da Vale, no córrego do Feijão, em Brumadinho, em 2019, o consumo de remédios psiquiátricos no município aumentou 31%, conforme dados da prefeitura. O trabalhador da mineração foi um dos mais impactados.

 “Tivemos impactos do ponto de vista físico, como problemas de hipertensão, problemas emocionais, pessoas falando em ideação suicida, problemas sociais com a perca de emprego e o receio de voltar ao local de trabalho”, comenta o professor do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG, Tarcísio Magalhães Pinheiro, e coordenador do Observatório em Saúde do Trabalhador de Belo Horizonte (Osat). ele concedeu entrevista ao “Saúde com Ciência” sobre o assunto.

Outra pesquisa sobre mineração e saúde mental entre os trabalhadores da barragem rompida em Mariana, da Samarco, em 2015, relata transtornos mentais como insônia, fadiga, ansiedade, esquecimento, irritabilidade e dificuldade de concentração após o crime ambiental. A pesquisa indica que 60% dos trabalhadores participantes apresentam transtornos psíquicos comuns. Essa porcentagem corresponde a cerca de 10% para a população. O estudo foi feito pelo Núcleo de Pesquisa e Vulnerabilidade em Saúde (Naves) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Cáritas Regional Minas Gerais.

De acordo com o Pinheiro, algumas questões que afetam a saúde mental vêm antes mesmo do rompimento da barragem. Isso porque o trabalhador que está o tempo todo na linha de frente acaba percebendo alguns riscos e, muitas vezes, se vê obrigado a enfrentá-los. Mas após os dois grandes desastres ocorridos no país, a insegurança dos mineradores pode ter aumentado, somando-se ao cenário atual de barragens que se encontram em situação de risco. Das 454 barragens inseridas na Política Nacional de Segurança de Barragens, por exemplo, 42 foram declaradas de risco.

“Muitas vezes isso resulta em problemas de alcoolismo, que acaba sendo uma estratégia de defesa dos trabalhadores”, observa o professor. Ele reforça que “não está advogando sobre questão do alcoolismo”, mas que o problema pode ser uma expressão de toda a insegurança e sofrimento no ambiente de trabalho.

Embora os graves desastres em barragens de mineração pareçam uma excepcionalidade, são mais frequentes do que se imagina. Nos últimos cem anos, foram registrados 356 desastres graves com mineradoras no mundo. Os dados são World Mine Tailings Failures.

Terceirização

Um milhão de trabalhadores estão na mineração no Brasil e 80% são terceirizados. Para o professor Tarcísio Magalhães Pinheiro, a forma como o trabalho é organizado pode desencadear muitos desgastes e sofrimentos ao trabalhador. Os vínculos informais e condições mais precárias de trabalho interferem na saúde mental.

“Antes mesmo de acontecer o rompimento da barragem do Fundão, já tínhamos um processo de trabalho em que alguns eram trabalhadores da mineradora e outros terceirizados”, relata o especialista. De acordo com ele. é diferente uma pessoa que atua precariamente, provisoriamente, de uma pessoa que está há mais tempo no local e que tem conhecimento maior e um certa estabilidade. São questões que não são específicas da mineração, mas que podem levar a maior precarização do trabalho.

Reprodução: Pixbay

E o que fazer?

O programa de rádio e podcast “Saúde com Ciência” também debate políticas para promoção da saúde do minerador. Confira! E a partir desta segunda-feira, 16, até o dia 20 de maio, a Semana de Saúde Mental da UFMG discute o ‘direito à cidadania’, com programação totalmente gratuita. Entre os temas que serão debatidos, estão os crimes da indústria da mineração (rompimentos de barragens) e a psicofobia (preconceito e discriminação contra pessoas com transtornos ou doenças mentais); a burocracia estatal trabalhista, a privatização de sistemas públicos de saúde, a política de saúde mental da UFMG. As informações sobre data, horário e local das atividades estão no site do evento.

Programa Saúde com Ciência

O Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a quinta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify