Proteção materno-fetal da exposição à cocaína pela imunização pré-gestacional com a vacina anti-cocaína

A dependência à cocaína e crack é um problema mundial de saúde pública para o qual ainda não existem fármacos aprovados para o tratamento. A apresentação de moléculas de cocaína ao sistema imunológico por meio de estruturas químicas imunogênicas é capaz de induzir a produção de anticorpos que podem realizar antagonismo farmacocinético à droga, reduzindo seus efeitos sistêmicos e a autoadministração da droga. O estudo das imunoterapias é um campo promissor para o tratamento da dependência química à cocaína. O GNE-KLH é um imunoconjugado que apresentou eficácia satisfatória na produção de anticorpos anti-cocaína e reversão dos efeitos da droga em ensaios pré-clínicos. A exposição pré-natal à cocaína e crack induz desfechos obstétricos e pós-natais negativos nas mães, feto, recém-nascido e na criança e adolescente. Nesse contexto, o objetivo do trabalho foi avaliar se a imunoterapia com GNE-KLH para a dependência à cocaína pode fornecer proteção materno-fetal contra desfechos negativos obstétricos e pós-natais associados à exposição pré-natal à droga. No primeiro experimento, ratas adultas receberam GNE-KLH (500 µL de emulsão 0,035 µL/mL, i.p.) ou placebo (adjuvante de Freund completo ou incompleto) nos tempos D0,7, 21 e 42 e foram acasaladas no tempo D35. Determinou-se o ganho de peso durante a gestação, tempo de gestação, mortalidade materna, tamanho da ninhada e mortalidade de filhotes. No segundo experimento, as mães foram imunizadas conforme o protocolo anterior e receberam uma dose diária de 20 mg/kg de cocaína durante os dois períodos gestacionais avaliados. Os parâmetros gestacionais do primeiro experimento também foram avaliados neste segundo protocolo. O ELISA determinou a presença e a especificidade dos anticorpos IgG e IgM anti-cocaína no soro das mães e filhotes e no leite materno. O modelo de campo aberto determinou o efeito da cocaína na prole após o desmame e na idade adulta. Os resultados demonstram que: 1. ratas vacinadas com GNE-KLH produzem e mantem títulos de anticorpos IgG e IgM anti-cocaína durante duas gestações, corroborando a eficácia da vacinação nas mães, 2. na presença da exposição gestacional à cocaína, houve redução dos desfechos obstétricos negativos nas ratas vacinadas, 3. encontramos presença de anticorpos IgG anti-cocaína nos filhotes, confirmando a transferência passiva dos anticorpos, 4. encontramos presença de anticorpos IgG anti-cocaína no leite materno, confirmando um dos mecanismos de

transferência desses anticorpos, 5. encontramos redução dos efeitos comportamentais da administração de cocaína nos filhotes após o desmame, mas não na idade adulta e, 6. os anticorpos apresentam especificidade pela droga, ratificando os resultados anteriores. Esses resultados sugerem que a imunoterapia com GNE-KLH para dependência à cocaína pode fornecer proteção materno-fetal contra desfechos negativos associados à exposição intrauterina à droga e no período pós-natal imediato.