Meninas de até 13 anos são as principais vítimas desse tipo de violência

Dados também chamam a atenção para o perfil do responsável pelo estupro


19 de setembro de 2019 - , , , ,


Iakima Delamare*

Dos 66.041 casos de violência sexual reportados em 2018 no Brasil, aproximadamente 54% das vítimas têm até 13 anos de idade, sendo 26,8% com 9 anos no máximo. As informações são do 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que reúne informações de secretarias estaduais e polícias civis, militares e federal.

Apesar de alarmante, o número é subnotificado, segundo a professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG, Sara Paiva. “Somente uma em cada dez das mulheres e meninas que são violentadas vão buscar ajuda. E isso porque a violência sexual é acompanhada da ameaça de violência e ameaça de morte, seja da criança, de alguém próximo, mas, principalmente, da mãe da criança”, comenta. “Isso é algo que mais dificulta sabermos do que está acontecendo, porque a criança, muitas vezes, não conta por medo do agressor”, completa.

A dificuldade de perceber e de relatar também está relacionada à questão de quem é o autor da violência sexual. De acordo com os dados do Anuário, que analisa informações desde o ano de 1990, 75,9% dos casos de violência sexual acontecem por conhecidos. “Um pai, um irmão, um tio, um parente próximo ou um padrasto, por exemplo. Normalmente esse crime é causado por uma pessoa da total confiança dessa criança” explica Sara.

Além das consequências físicas, a violência sexual pode deixar marcas em longo prazo. “Qualquer pessoa que sofreu violência vai desenvolver transtorno pós-traumático, que pode ser leve ou um transtorno de estresse pós-traumático caracterizado, por exemplo, por ansiedade generalizada, crise de pânico, transtorno de humor ou mesmo depressão”, afirma a médica.

Sara Paiva alerta que a situação é ainda pior para crianças, com possibilidade de graves repercussões até quando forem adultas. “Nos casos dessas crianças, se não tiverem um acompanhamento, podem desenvolver aversão ao sexo, vaginismo e dor durante a relação sexual devido a uma contração involuntária do músculo da vagina, provocada pelo medo dessas mulheres”, discorre.

Além disso, a especialista diz que essas meninas e mulheres violentadas podem até não lembrar conscientemente do que aconteceu, mas inconscientemente, ao início de qualquer toque, carícia ou outra ação relacionada ao encontro sexual, desencadeia um mecanismo de contração muscular. “Elas podem apresentar transtorno emocional que, se não for tratado, pode durar o resto da vida, como ansiedade, depressão e síndrome do pânico”, alerta.

Atendimento às vítimas

Foto: Pixabay

Mulheres vítimas de violência sexual podem recorrer a centros especializados para acolhimento psicológico e social, orientação, encaminhamento jurídico, além da profilaxia de prováveis doenças sexualmente transmissíveis e prevenção de gravidez pós agressão sexual.

Em Belo Horizonte, os Centros de Referência ao Atendimento às Vítimas de Violência Sexual também oferecem atenção a crianças e adolescentes. O atendimento é multidisciplinar e oferece, mais facilmente, a coleta de vestígios.

Quem sofreu agressão, mesmo há um ano, pode ser encaminhada para um desses quatro hospitais:
Hospital das Clínicas da UFMG atende crianças do sexo masculino e feminino até 12 anos e a partir de 12 anos apenas do sexo feminino;
Hospital Odilon Behrens atende ambos os sexos a partir dos 12 anos;
Hospital Júlia Kubitschek atende ambos os sexos a partir dos 12 anos;
Maternidade Odete Valadares atende mulheres.

O Hospital das Clínicas da UFMG tem como diferencial a oferta do serviço de acompanhamento para o tratamento do estrese pós-traumático utilizando o mindfulness. De acordo com Sara Paiva, essa ação pioneira no Brasil utiliza a técnica que trabalha a atenção plena, relaxamento, conscientização e meditação. O objetivo é fazer com que “as pacientes aprendam a deixar o evento ficar no passado e consigam viver melhor o evento presente”.

Sara conta que esse programa tem alcançado resultados positivos. “Elas relatam melhora significativa da qualidade de vida, com diminuição de sinais e sintomas associados a estresse, ansiedade e depressão”, comenta. “Felizmente temos conseguido ver um ótimo resultado do nosso tratamento com melhoria de qualidade de vida das nossas pacientes”, acrescenta.

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* Iakima Delamare – estagiária de jornalismo
Edição: Deborah Castro