Acompanhamento da tuberculose pela Atenção Primária melhora em BH

Além de evidenciar o bom desempenho dos Centros de Saúde de Belo Horizonte, pesquisa propõe intervenções para aumentar melhorias nas ações de controle da tuberculose


12 de novembro de 2019 - , , , ,


*Laryssa Campos

O controle da tuberculose em Belo Horizonte melhorou entre os anos 2016 e 2018, em relação à Atenção Primária à Saúde (APS), nível de atendimento recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para casos iniciais da doença. Essa é a conclusão do mestrado da gestora de tuberculose de Belo Horizonte, Juliana Veiga Costa Rabelo, que avaliou as ações e desempenho dos Centros de Saúde da capital mineira.

A sua dissertação, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde: Infectologia e Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da UFMG, faz parte da proposta da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte em produzir projetos de enfrentamento à doença, a partir de recursos federais. Com o objetivo específico de avaliar a Atenção Primária à Saúde, Juliana evidenciou que 32 do total de 44 indicadores de avaliação do serviço oferecido tiveram resultados positivos. Além disso, sugeriu mudanças para os que não alcançaram melhorias, como intervenção nas condições sociais dos pacientes.

Juliana Rabelo defendeu dissertação em março de 2019. Foto: Carol Morena.

Seus resultados foram baseados nas respostas de 455 profissionais das 588 equipes de saúde da família (EqSF) da capital mineira que responderam a um questionário desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto. Validado nacionalmente, ele continha perguntas elaboradas especificamente para as ações de controle da tuberculose na APS, mas com adaptações para a realidade de Belo Horizonte. “Foram escolhidos para responderem ao questionário o médico ou enfermeiro de todas as EqSF do município pois são os profissionais que acompanham os pacientes com tuberculose durante todo o tratamento”, acrescenta a pesquisadora.

As questões avaliaram o atendimento em relação aos recursos humanos, como capacitação e envolvimento dos profissionais; os recursos físicos, como acesso aos insumos, equipamentos e medicamentos; e a atenção proporcionada, como manejo dos casos e escuta qualificada, por exemplo.

Importância de classificar o quadro clínico e o risco de abandono ao tratamento

Na época da realização da pesquisa, ocorria o projeto de estratificação por grau de risco de abandono e risco clínico da pessoa com tuberculose em BH, ferramenta que considera a aplicação das recomendações do Ministério da Saúde para o controle da tuberculose. Por isso, também foi incluído no estudo da Juliana. “Ao identificar qual o nível de risco de abandono, aplicam-se as soluções aconselhadas. Depois, avalia-se o risco clínico, ou seja, qual a gravidade do caso do paciente, para que seja possível encaminhá-lo ao nível de atenção adequada ao seu caso”.

Como o objetivo do trabalho era avaliar o desempenho do atendimento na Atenção Básica, a pesquisadora afirma que todos os indicadores melhoraram após a utilização do instrumento de estratificação, mesmo aqueles que já apresentavam desempenho satisfatório. “A cidade foi dividida em dois grupos. Um que recebeu a estratificação de risco e o outro que não. Nessa distinção entre os grupos, foi considerado o índice de vulnerabilidade, questões sanitárias, sociais e de saúde”, pontua. “Além disso, foi levado em conta a organização dos serviços de saúde do município e as áreas de cluster, regiões com muitos casos da doença”, ressalta.

A partir da estratificação, a pesquisadora analisou as respostas das entrevistas, comparando o antes e depois desse processo. Um desses achados foi o de que, antes, os pacientes não conseguiam atendimento fora do horário comercial se a equipe responsável pelo seu acompanhamento já tivesse terminado o horário de atendimento do dia. Ou seja, era orientado a retornar depois. Mas esse desempenho melhorou para 80,9% ao estabelecer que o paciente deveria ser atendido pela equipe disponível no momento da sua demanda e, desse modo, ter seu problema resolvido imediatamente.

Ou seja, a mudança surgiu com a estratificação, resultando em um desempenho avaliado como satisfatório, já que ultrapassou a porcentagem mínima (80%) para tal critério, conforme estabelecido no estudo. Além desse, Juliana Rabelo destaca os resultados positivos em relação a outros dois eixos. Um deles é a articulação entre os níveis de atenção, que alcançou um desempenho de 80,2% com a estratificação, após a organização dos pacientes entre os níveis de atenção mais adequados para cada caso.

“A estratificação de risco organiza os níveis de atenção da saúde onde o paciente com tuberculose deve estar. É diferenciado o que deve ficar na atenção primária, na atenção secundária, na atenção terciária e o que vai para urgência e emergência”, diz. “Antes disso muitos casos ficavam na atenção primária sem condições de estar nesse nível. Com essa organização os pacientes acabaram sendo encaminhados para o ponto de cuidado ideal para cada caso, o que provavelmente fez com que esse desempenho melhorasse”, constata. 

O outro ponto foi sobre o atendimento aos pacientes, que teve as melhores porcentagens nas áreas em que foi feita a estratificação de risco em Belo Horizonte. Mas, para a pesquisadora, o resultado foi surpreendente, já que a otimização do serviço foi no geral. Ela aponta o modo de organização de trabalho dos profissionais do Nasf como uma justificativa. “Independentemente de ter tido estratificação ou não, houve melhoria. Temos farmacêuticos, principalmente do Nasf, que circulam nos centros de saúde. Então, pode ser que esses profissionais dos centros de saúde onde houve estratificação levaram as orientações para onde não houve. Isso é inerente do próprio serviço”, discorre.

A pesquisadora acredita que isso ocorre, porque nas instruções de estratificação de risco o farmacêutico deve ser gerente dos casos de tuberculose. “O farmacêutico foi definido como gestor do caso, então, à medida que ele acompanha todos os casos e executa as ações estabelecidas, sabe que determinada decisão beneficia o paciente e acaba fazendo com todos os outros”, afirma.

Intervir para melhorar ainda mais

Ao identificar as variáveis com resultados insatisfatórios, Rabelo propôs medidas de intervenção, como a disponibilização de cestas básicas e vale-transporte. Isso porque, de acordo com ela, geralmente os pacientes com tuberculose estão em condições de vulnerabilidade social. “Embora o tratamento seja garantido pelo SUS, as condições sociais podem ser determinantes para o abandono do tratamento”, ressalta.

“A proposta, para levar ao município, é que todo paciente com o diagnóstico de tuberculose seja encaminhado para o serviço social, seja do SUS ou do SUAS, e que seja inserido nesses programas de transferência de renda caso seja diagnosticado com necessidade de algum benefício ou outra condição que o município possa ofertar”, expõe Juliana.

E, pensando na própria forma de organização dos serviços de saúde do SUS, Rabelo também propõe a integração em um sistema único de informação para comunicar sobre o caso do paciente. “Tanto a Referência Secundária quanto a Atenção Primária devem ter acesso ao mesmo sistema para que as informações cheguem a tempo hábil, sem necessidade de ligar ou escrever para uma atenção ou outra”, explica.

Ela ainda conta que as propostas do seu estudo já estão sendo utilizadas, como a inserção do tema tuberculose no Plano de Educação Permanente de Belo Horizonte, bem como já apresentou os dados preliminares para as chefias imediatas da Gestão Municipal, Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais e do Ministério da Saúde.

Outra intenção da pesquisadora é propor que essa avaliação ocorra anualmente de forma informatizada, além de disponibilizar o trabalho às outras regiões do estado. “A ideia é que o Estado utilize esse instrumento de avaliação dos serviços de saúde naqueles municípios onde há indicadores de cura e de abandono menos favoráveis, porque esse é um instrumento que direciona em qual eixo o município deve trabalhar”, conclui.

Título: Avaliação do desempenho dos serviços de atenção primária à saúde no controle da tuberculose em Belo Horizonte
Programa: Programa de Pós-Graduação em Ciências da saúde – Infectologia e Medicina Tropical
Autora: Juliana Veiga Costa Rabelo
Orientadora: Silvana Spíndola de Miranda
Coorientadores: Vânia da Silva Carvalho e João Paulo Haddad
Data de Defesa: 29 de março de 2019

* Laryssa Campos – estagiária de jornalismo
Edição: Deborah Castro