Debate sobre violência mobiliza a comunidade acadêmica da Medicina

Seminário discutiu sobre as diferentes formas de violência vivenciadas na Faculdade


30 de novembro de 2016


Seminário discutiu sobre as diferentes formas de violência vivenciadas na Faculdade

IMG_3364

Mesa de abertura do Seminário. Foto: Carol Morena

Foi realizada nessa terça, 29 de novembro, no Salão Nobre da Faculdade de Medicina da UFMG, o seminário “Violência e Universidade: uma reflexão acadêmica”. A ação foi promovida pelos colegiados dos cursos de Medicina, Fonoaudiologia e Tecnologia em Radiologia, com o apoio do Núcleo de Apoio Psicopedagógico aos Estudantes de Medicina, da Assessoria de Escuta Acadêmica, dos Diretórios Acadêmicos e do Centro de Comunicação Social da Faculdade.

Participaram da mesa de abertura do evento, o vice-diretor da Faculdade, Humberto José Alves, que apontou a necessidade de se discutir a violência com maior frequência na instituição; a coordenadora do colegiado de Medicina, Taciana de Figueiredo Soares; a ex-coordenadora Alamanda Kfoury; o coordenador do colegiado de Tecnologia em Radiologia, Paulo Márcio Campos; e a subcoordenadora do colegiado de Fonoaudiologia, Adriane Mesquita.

Violência e as relações humanas

Para discutir sobre as diferentes formas de violência vivenciadas na Instituição, foi realizada uma mesa-redonda com a participação de docentes e discentes da Faculdade, com mediação do professor do Departamento de Clínica Médica, Ênio Roberto Pietra.

Abordando a violência como um problema global que permeia o modo de se relacionar dentro do espaço acadêmico, a professora do Departamento de Medicina Preventiva e Social, Elza Machado de Melo, destacou que, na Faculdade, onde poderia ser o local de ação diferente do que é imposto culturalmente, continua se reproduzindo a violência. “É criado um ambiente de impotência diante da condição de sujeitos coletivos”, disse.

A professora explicou que as relações humanas, que deveriam ser permeadas pela solidariedade entre as pessoas, são substituídas pelo dinheiro e pelo poder, originando uma competição desvairada de individualismos. Desse modo, segundo a Elza, “a violência em um ambiente de individualismo possessivo e de impotência é o que nos faz perder a função de sujeito. Violência é qualquer situação em que nós que pretendemos ser sujeitos somos rebaixados à condição de objetos”.

“Se o que está perdido é a relação com o outro, o ideal é retomar isso de onde estiver. Quem sabe se nos tratarmos enquanto sujeitos?”, sugeriu a professora. Elza concluiu reafirmando a necessidade de lutar contra a violência. “Trabalhar a violência é começar, aqui e agora, a retomar a relação de cooperação solidária entre os sujeitos”, pontuou.

Violência no espaço acadêmico

IMG_3430

Professor Dirceu Greco. Foto: Carol Morena

O professor do Departamento de Clínica Médica, Dirceu Greco, o segundo a se pronunciar, declarou se sentir envergonhado, enquanto professor da Instituição, diante da persistência de diversas situações cotidianas de violência dentro da Faculdade. “Nesse período todo, eu ouvia isso e tentei fazer algo, mas algumas coisas continuam acontecendo. O assédio moral, por exemplo, que é gravíssimo, não é cabível”, afirmou.

O professor alertou sobre a necessidade de se discutir sobre determinados temas, como a sexualidade, a fim de que a informação possa atuar em direção contrária à violência. “Se essa discussão não acontece anteriormente e se a universidade se exime disso, a gente entra em um processo de barbárie cada vez pior, em que não se discute a diversidade sexual, a violência”, explicou Dirceu.

Ao persistir na necessidade de se denunciar as violências, Greco afirmou o desejo de estimular a emancipação daqueles que a sofrem. “Nós estamos vivendo um processo grave dentro da Faculdade e temos que pensar como permitimos essa discriminação. Depois, é necessário discutir sobre as relações e as discussões que virão para essa Instituição. O que podemos fazer aqui e agora? Estou querendo estimular vocês à emancipação”, refletiu.

Violência e os alunos

Representando os discentes da Faculdade, Clícia Rodrigues e Gustavo Melo, dos DAs de Fonoaudiologia e Medicina, respectivamente, ressaltaram a importância de se debater o assunto entre os alunos, os professores e os funcionários da Instituição.

Clícia alertou para o fato de que o aluno diante de uma agressão, muitas vezes, não sabe a quem recorrer ou tem receio de sofrer alguma retaliação. Além disso, apontou que as atitudes que ocorrem dentro da Faculdade acontecem, também, do lado de fora do prédio, e questionou: “Por que eu preciso ofender o outro para que eu sobressaía?”.

IMG_3466

Gustavo Melo, representante do DA da Medicina, relatou casos de uso da violência ocorridos na Faculdade. Foto: Carol Morena

Relatando diversas situações de violências que aconteceram recentemente na Unidade, Gustavo Melo destacou o uso da violência.“São 105 anos onde se mantém uma cultura de hierarquia e de diversas opressões. Quais sujeitos estamos formando? Até onde vai a busca por visibilidade, mesmo que expondo os outros?”, indagou o estudante, que também conclamou as pessoas, assim como o professor Greco, a lutarem pela emancipação.

Antes de abrir a palavra para o debate, o professor Ênio Roberto Pietra afirmou que a violência é um assunto complexo, que se refere à existência humana, sendo a sua resolução buscada por meio da coragem e da cidadania. “Hoje prevalece a competição, o mercado, e isso só tem uma possibilidade: o isolacionismo”, explicou.

Pietra terminou citando o escritor e médico formado pela Faculdade de Medicina da UFMG,  João Guimarães Rosa: “o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia”. Convocando, assim, para a mudança do atual paradigma de violência na Faculdade.

Ao final, foi aberto para que os participantes pudessem relatar e opinar sobre as ocorrências de violência dentro da Faculdade.