Dengue e chikungunya, uma possível nova epidemia

De acordo com especialista da Faculdade de Medicina da UFMG, os períodos epidêmicos das doenças variam de 3 a 5 anos, justamente quando há baixa na imunidade da população


05 de abril de 2023 - , ,


Apesar de serem mais comuns em períodos chuvosos, os casos de dengue e chikungunya têm se espalhado pelo país, trazendo à tona uma possível epidemia. De acordo com o infecto patologista e professor do Departamento de Anatomia Patológica (APM) da Faculdade de Medicina da UFMG, Marcelo Pascoal, a transmissão das doenças é cíclica, ou seja, acontece com períodos epidêmicos de três a cinco anos, e os fatores condicionantes de uma nova epidemia são muito variados. No primeiro momento, há uma redução da imunidade da população e isso favorece a infecção provocada pelo vírus.

Para que haja transmissão, o seu vetor (o Aedes Aegypti), tem que disseminar também nas localidades e esse é o ponto mais crítico. “Toda vez que tem um período chuvoso muito intenso, esse mosquito (o vetor) consegue procriar mais. Assim, o tempo dele se desenvolver coincide, geralmente, com o final desse período mais chuvoso e esse mosquito está segurando e transmitindo, quando ele é infectado”, pontua o professor.

Ainda que o mosquito seja o transmissor, tanto da dengue, quanto da chikungunya, ele nasce sem o vírus. Porém, ao se alimentar de sangue de pessoas contaminadas, ele adquire o vírus e começa a transmissão de pessoa para pessoa. Existem circunstâncias em que as ações para o combate do Aedes Aegypt são intensificadas, o que reduz a quantidade de mosquitos espalhados. Entretanto, após um período de cuidados, há uma redução das medidas e o mosquito volta a crescer. 

“Se ele volta a crescer, infecta-se na população, que já está com a queda dos seus anticorpos. Isso favorece uma nova transmissão populacional”, observa. 

Dengue

A dengue é a arbovirose mais comum em todo o mundo. Arboviroses são grupos de doenças causadas por vírus, cujo vetor é um artrópode, ou seja, um inseto. A doença, do ponto de vista de classificação sorológica, é dividida em quatro sorotipos, sendo: dengue 1, 2, 3 e 4. E esses quatro tipos da doença já são identificados no Brasil, porém, os mais comuns são o tipo 1 e o tipo 2, que circulam em maior escala no país. 

Apesar disso, de acordo com o professor Marcelo Pascoal, os tipos não se diferenciam por gravidade, pois a dengue está muito relacionada à questão imunológica. “Se a pessoa tem uma imunidade recente, essa pessoa está mais protegida. Agora, se ela ficar um longo tempo sem o contato com o vírus, independente do sorotipo, ela pode desenvolver uma dengue grave”, afirma.

Embora seja dividida entre sorotipos, a dengue pode ocorrer de forma mais leve, também conhecida como dengue clássica, ou se desenvolver em maior gravidade, no caso da dengue hemorrágica. 

A dengue clássica é uma infecção viral muito típica, cuja manifestação clínica mais importante é a febre alta, geralmente, superior a 38°C, que se prolonga de 5 a 7 dias. Além disso, a pessoa contaminada pode apresentar também dor de cabeça, dor muscular, dor atrás dos olhos e sensação de mal estar. 

Já no caso da dengue hemorrágica, apesar de muito parecida com a dengue clássica, quando a pessoa apresenta alguns sinais (geralmente, a partir do terceiro dia), como dor abdominal, sangramentos na pele ou na gengiva, ela pode estar desenvolvendo uma complicação da doença. Em ambos os casos, recomenda-se procurar as unidades de saúde em qualquer sinal de suspeita da doença para diagnóstico e tratamento, principalmente por estarmos em um momento de possível epidemia. 

“O esperado para a dengue clássica é a febre, mais dor muscular, dor atrás dos olhos e mal estar. À percepção de sangramento, dor abdominal, deve-se orientar ao paciente para procurar as unidades de atendimento”. 

Chikungunya 

Similar à dengue, a chikungunya também se trata de uma arbovirose, transmitida pelo mesmo mosquito. Apesar de serem semelhantes na transmissão, a chikungunya é um vírus de uma outra família. 

A chikungunya é uma arbovirose causada pelo vírus Chikungunya (CHIKV), da família Togaviridae e do gênero Alphavirus, já a dengue e a zika são causadas por um vírus pertence à família Flaviviridae, do gênero Flavivírus. 

Uma das principais características do vírus da chikungunya, que deu origem ao nome da doença, é que ele provoca uma febre súbita, por vezes passando de 40°C, e acompanhada de dor nas articulações. Por causa disso, a junta pode ficar inchada, quente e mais avermelhada, e em alguns casos, pode levar um maior período de tempo para que se revolva, permanecendo a dor, ou até mesmo, a limitação de movimento. 

“A chikungunya é um vírus que vem de uma origem de ‘febre quebra ossos’, alguma coisa no sentido de dor articular, uma febre muito alta. Isso porque é um outro tipo de vírus, que tem facilidade de entrar nos tecidos das articulações”, explica o professor Marcelo.

Ainda que se tratem de vírus diferentes, a orientação é a mesma. Em qualquer caso de sintomas deve-se procurar ajuda médica, para receber o diagnóstico e o tratamento adequado. 

Diferença entre dengue, chikungunya e zika 

Apesar das três doenças terem sintomas semelhantes e serem transmitidas pelo mesmo artrópode, existem algumas questões que as diferenciam entre si. Confira o quadro abaixo para mais informações. 

SintomasDengueChikungunyaZika
Febre Alta (39° a 40°), que começa subitamenteAlta (39° a 40°), que começa subitamenteLeve (até 38°C) ou até inexistente em alguns casos
DoresCabeça, atrás dos olhos, nos músculos e nas articulaçõesInchaço nas articulações e dores intensas (que muitas podem interferir em atividades básicas)Dores menos intensas nas articulações. Inflamação nos olhos (conjuntivite)
Manchas VermelhasSim, às vezes com coceiraSim, às vezes com coceiraSim, às vezes com coceira
ComplicaçõesPode haver comprometimento de órgãos como: pulmões, fígado, rins, coração e sistema nervoso centralPersistência da dor nas articulações por meses (ou até anos) em alguns casosComprometimento neurológico, que provoca debilidade muscular. Possibilidade de reação autoimune, como a Síndrome de Guillain-Barré. 

Cuidados e prevenção

Em relação a prevenção e os cuidados a serem tomados com o mosquito transmissor das doenças, é sempre importante lembrar de não deixar água parada e, principalmente após períodos chuvosos, de verificar os possíveis criadouros da larva (vasos de plantas, garrafas, entre outros recipientes que podem acumular água). Além disso, evitar o contato com locais de surto das doenças, e caso necessário, utilizar roupas que minimizem a exposição da pele, como blusas de manga e calça. 

“Fundamentalmente, o alerta é para evitar a exposição ao transmissor. Então, repelentes, blusas com manga comprida, e calças evitam o contato do mosquito com a perna ou braço. Mas devemos ficar atento aqueles ambientes onde há maior circulação do vírus, para evitar a exposição. Caso não seja possível evitar a exposição, deve-se utilizar repelentes ou a raquete elétrica. Isso funciona muito bem”, indica o especialista. 

O tratamento das arboviroses é de suporte, no qual se recomenda o uso de medicamentos sintomáticos, que não prejudicam as funções de órgãos e do sangue, principalmente. A hidratação também é um fator de extrema importância durante o cuidado das doenças, e sempre estar atento aos sinais de alerta, como no caso da dengue, em relação a possíveis sintomas de dengue hemorrágica. 

Além disso, existem medicamentos que precisam ser evitados em caso de arboviroses, para que o sangue mantenha suas funções dentro dos vasos sanguíneos em sua fase líquida. Ele não pode coagular e nem extravasar para não gerar hemorragia. Por isso, recomenda-se evitar o uso de medicamentos que interfiram na função das plaquetas, como no caso de alguns anti-inflamatórios, em especial os não esteroidais (também conhecidos como corticoides, corticosteróides ou glicocorticóides). 

”Existe um papel muito importante das plaquetas que estão no sangue, de modo que medicamentos, que interferem na função delas, favorecem o sangue não se organizar na forma líquida nos vasos e ele extravasa, muito conhecido como sangue raleado ou sangue ralo. De modo geral, alguns anti-inflamatórios, em especial os não esteroidais, que interferem na função da plaqueta, devem ser evitados, podendo-se utilizar outros antitérmicos para reduzir a febre e que não interferem na função das plaquetas, como por exemplo, o paracetamol e derivados”, observa. 

Saúde com Ciência

O programa de rádio Saúde com Ciência desta semana conversa sobre a dengue, chikungunya e zika, trazendo mais informações sobre a transmissão, diagnóstico e tratamento das arboviroses, além dos cuidados e prevenção das doenças. 

O Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelas principais plataformas de podcasts.