Depressão na internação de portadores de doenças cardiovasculares
26 de junho de 2017
Tabagismo, traumas infantis e internações anteriores são fatores associados a depressão em pacientes internados com doença cardiovascular.
Subdiagnosticada e subtratada, a depressão em pacientes com doenças cardiovasculares (DCV) internados pode ser responsável por aumento da mortalidade e piora do prognóstico para esses indivíduos. Buscando identificar fatores mais associados a presença de sintomas depressivos nestes pacientes, o psiquiatra e mestre em Medicina Molecular pela Faculdade de Medicina da UFMG, Felipe José Nascimento Barreto, desenvolveu pesquisa em conjunto com o Centro Regional de Referência em Drogas da UFMG (CRR).
O estudo, que teve orientação dos professores do Departamento de Saúde Mental da Faculdade, Humberto Corrêa e Maila Neves, foi realizado com 137 pacientes internados no Hospital das Clínicas da UFMG, entre novembro de 2013 e outubro de 2015.
O psiquiatra conta que a prevalência de indivíduos com sintomas depressivos na amostra estudada foi 27,7%. De acordo com o pesquisador, a prevalência de depressão nos portadores de DCV é consideravelmente maior quando comparados com a população geral. “Por volta de um terço dos pacientes no período logo após um infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular encefálico são acometidos por depressão”, alerta Felipe Barreto.
A pesquisa mostrou que a dependência de nicotina, o número de admissões hospitalares prévias e histórico de trauma infantil severo foram indicados como fatores associados a esses sintomas.
Felipe Barreto acrescenta que os traumas durante infância avaliados na pesquisa foram relativos a abuso físico, emocional e sexual e negligência física e emocional. “Quanto maior a frequência dos traumas durante a infância e maior a variedade destes, mais severo o trauma infantil”, adiciona.
Diagnóstico e cuidado
O psiquiatra realça o fato de que em internações de pacientes com DCV em hospitais gerais, menos de um caso de depressão em cada quatro são tratados de maneira adequada. Segundo ele, o diagnóstico deve ser precoce e realizado pelo médico que assiste o doente durante sua internação hospitalar, independente de sua especialidade. “Feito o diagnóstico de depressão, pode-se optar tanto pelo tratamento com medicações quanto por terapias psicológicas. Em centros que têm disponibilidade de psiquiatras ou psicólogos, esses devem ser consultados antes da alta hospitalar do paciente portador de depressão”, recomenda.
Para ele, entender os fatores mais associados à presença de sintomas depressivos pode ajudar a melhorar a triagem nos pacientes com DCV enquanto internos em enfermarias de hospital geral. “Identificar esses indivíduos mais propensos pode ajudar a aumentar a chance de se diagnosticar um quadro depressivo e prover opções de tratamento que podem ser iniciadas ainda no período intra-hospitalar”, acredita o psiquiatra.
Depressão e DCV
Segundo Felipe Barreto, a depressão é um transtorno mental frequente, que acomete 4,4% da população mundial. Atualmente, é considerada a principal fonte de incapacidade, visto seu impacto negativo na funcionalidade global do indivíduo. “Sua importância como problema de saúde pública é tanta que, neste ano de 2017, foi o tema de campanha da OMS para o Dia Mundial da Saúde, em abril”, recorda o pesquisador.
O psiquiatra também explica que os sintomas depressivos que podem ser observados em portadores de DCV são os mesmos encontrados na população geral: humor triste ou deprimido, perda do interesse ou prazer em atividades outrora interessantes ou prazerosas, alterações de sono, alterações de apetite, fadiga, dificuldade de se concentrar ou raciocinar, agitação ou lentificação dos movimentos, sentimentos de culpa ou desvalia, pensamentos recorrentes de morte ou de suicídio.
Pesquisa e continuidade
Os resultados do estudo foram descritos no artigo “Childhood trauma and factors associated with depression among inpatients with cardiovascular disease”, publicado na edição deste mês da revista World Journal of Psychiatry, especializada na área de Psiquiatria, e disponível para leitura online no site ou por meio de plataformas de procura de artigos científicos, como o Pubmed.
Felipe Barreto destaca ainda que a equipe do Centro Regional de Referência a Drogas da UFMG continua trabalhando outros aspectos da pesquisa, como fatores associados a comportamento suicida e a sentimentos de desesperança na mesma amostra de pacientes estudados. “Esperamos, desse esforço conjunto, surgir uma dissertação de um dos nossos colaboradores e, claro, outros artigos de relevância para a população geral e comunidade científica”, conta.