Saúde, qualidade de vida e desempenho escolar: Estudo aponta diferenças entre estudantes de escolas públicas e privadas

Pesquisa indica que estudantes de escolas privadas apresentam melhor qualidade de vida e motivação para aprender, enquanto alunos de ensino público enfrentam desafios emocionais e sociais.


16 de setembro de 2024 - , , , ,


Vitor Pepino*

Foto: Ministério da Educação

Estudantes de escola privada apresentam melhor qualidade de vida e autopercepção de saúde, além de maior motivação para aprender e desempenho escolar do que alunos de escola pública, segundo mostra tese defendida por Graziela Nunes Alfenas Fernandes no Programa de Pós-Graduação em Ciências Fonoaudiológicas da Faculdade de Medicina da UFMG. 

A pesquisa buscou analisar a associação entre qualidade de vida, autopercepção de saúde, motivação para aprender e desempenho escolar entre adolescentes do ensino fundamental em escolas de financiamento privado e público, considerando o contexto sociodemográfico e econômico, recursos familiares e o ambiente escolar.

A motivação para o estudo surgiu da experiência prática da pesquisadora, formada em Enfermagem e Pedagogia, ao lecionar para adolescentes e observar as variáveis envolvidas na saúde e na aprendizagem. “A vivência no ambiente escolar e a observação dos estudantes em atividades de aprendizagem me estimulou a buscar entender de que forma os aspectos relacionados à saúde influenciavam o rendimento pedagógico dos alunos”, destaca a pesquisadora.

O estudo, de caráter quantitativo, foi realizado entre 2018 e 2023 nas regiões Centro Sul e Nordeste de Belo Horizonte, abrangendo dois tipos de análise. Na análise longitudinal, foram incluídos 192 adolescentes e seus responsáveis, enquanto no estudo transversal participaram 256 estudantes e responsáveis. Na última amostra, a maior parte dos participantes (24,22%) tinha entre 11 e 12 anos de idade, 53,12% eram do sexo feminino, 32,42% estavam cursando o 6º ano e 52,73% eram estudantes de escolas de financiamento privado.

Os adolescentes preencheram questionários que avaliavam a qualidade de vida nas dimensões física, emocional, social e escolar. Eles também avaliaram sua saúde física e mental e responderam ao Inventário de Recursos do Ambiente Familiar e bem como a Escala de Motivação para aprendizagem. 

68,6% alunos do ensino público e 88,9% alunos do ensino privado avaliaram a própria saúde como boa ou excelente.

Graziela acredita que os resultados deste estudo revelam que a qualidade de vida na adolescência é fortemente influenciada pela saúde mental e autopercepção de saúde dos adolescentes. Além disso, afirma que as dificuldades em saúde mental têm um impacto direto na motivação para aprender e no desempenho acadêmico, o que destaca a necessidade de ações intersetoriais voltadas para promover a saúde, o bem-estar e o sucesso escolar. 

“Esses resultados são de particular interesse para profissionais de saúde, gestores da educação, professores da educação básica, pais e adolescentes. Ações voltadas para a promoção da saúde e para a melhoria da qualidade de vida podem ter um efeito positivo na motivação para aprender e no desempenho escolar, influenciando diretamente o sucesso acadêmico e o futuro na vida adulta”, completa a autora. 

A influência dos fatores físicos, emocionais e sociais na aprendizagem

O conceito de qualidade de vida adotado pela pesquisa é amplo e multidimensional, abrangendo não apenas aspectos físicos, mas também fatores emocionais, sociais e escolares. Segundo a autora, esses elementos colaboram para o bem-estar geral e influenciam diretamente o comportamento e o rendimento dos alunos em sala de aula.

O adolescente com resultado adequado na avaliação das capacidades e dificuldades em saúde mental teve até 11,05 vezes mais chances de ter melhor qualidade de vida. Além disso, o adolescente com melhor motivação para aprender teve 5,02 vezes mais chances de ter melhor qualidade de vida.

O estudo aponta que os adolescentes das escolas privadas apresentam melhor qualidade de vida nos âmbitos físico e psicossocial, além de maior motivação para aprender. Aspectos biológicos, a percepção de apoio social e os recursos do ambiente familiar mostraram-se determinantes no processo de aprendizagem.

Foto: Ministério da Educação

De acordo com a pesquisadora Graziela Fernandes, “a saúde e a qualidade de vida de um estudante não se resumem à ausência de doenças, mas considera como ele percebe o seu entorno, como lida emocionalmente com os desafios, e que estímulos recebe dos contextos familiar e escolar para o desenvolvimento individual e social”. Para ela, a integração desses fatores é fundamental para garantir que os adolescentes consigam atingir seu potencial acadêmico.

O papel do ambiente familiar no desempenho escolar

A pesquisa também destaca a importância do ambiente familiar na promoção da qualidade de vida escolar dos adolescentes. Pais que participam ativamente da vida de seus filhos, que oferecem incentivo e apoio emocional tendem a ter filhos com melhor desempenho acadêmico.

“As famílias desempenham um papel crucial no desenvolvimento emocional e cognitivo dos adolescentes”, afirma Graziela. A pesquisa revelou que estudantes com um ambiente familiar estável têm mais facilidade em lidar com os desafios acadêmicos e sociais.

A escola como campo propício de promoção da saúde e bem-estar

Foto: Ministério da Educação

Outro ponto importante do estudo é o papel das instituições educacionais no suporte à saúde dos estudantes. O preparo para lidar com as necessidades emocionais dos alunos, por meio de programas que promovem o bem-estar, podem contribuir significativamente para a melhoria da qualidade de vida.

A escolaridade dos pais foi outra vertente analisada durante o estudo, pois pode influenciar o desempenho escolar dos adolescentes. Na amostra total, a figura paterna com ensino superior completo representou 45,70% e a figura materna 53,91%, ocorrendo uma grande diferença em relação às mães de alunos de escola privada e pública, com proporções de 94,6% e 19%, respectivamente.

“Ambientes escolares que promovem a saúde física, mental e emocional dos estudantes, oferecendo espaços de apoio e acolhimento, favorecem não só o desempenho acadêmico, mas também o desenvolvimento integral do adolescente”, diz a pesquisadora.

Implicações para futuras políticas públicas e práticas pedagógicas

Pesquisadora Graziela Nunes Alfenas Fernandes. Foto: CCS / Faculdade de Medicina da UFMG

Os resultados da pesquisa apontam para a necessidade de políticas públicas que busquem promover a saúde e qualidade de vida dos estudantes. O foco na saúde emocional e no bem-estar dos adolescentes no ambiente escolar, o investimento em programas de saúde mental, e iniciativas que integrem a família na educação dos adolescentes pode trazer benefícios significativos para a qualidade de vida dos estudantes, resultando em maior motivação e desempenho escolar.

Além disso, a tese sugere que estudos futuros possam expandir o escopo de análise, incluindo variáveis que envolvam aspectos clínicos e contextuais, além de fatores educacionais. Estudos de seguimento e intervenção poderiam ampliar as conclusões. 

“O estudo da relação entre saúde, qualidade de vida e desempenho escolar é uma área relevante para futuras pesquisas, e entender esses fatores pode auxiliar no desenvolvimento de estratégias eficazes para melhorar o bem-estar geral e o rendimento acadêmico dos adolescentes”, conclui Graziela.

Pesquisa: Qualidade de Vida, Autopercepção de Saúde, Motivação para Aprender e Desempenho Escolar de Adolescentes: O Estudo de um Modelo de Explicação
Programa: Programa de Pós-Graduação em Ciências Fonoaudiológicas
Autora: Graziela Nunes Alfenas Fernandes
Orientadora: Stela Máris Aguiar Lemos
Data de defesa: 27 de agosto de 2024


*Vitor Pepino – Estagiário de Jornalismo
Revisão: Débora Nascimento