O que acontece com o sangue que você doa?

No dia Mundial do Doador de Sangue, saiba qual o caminho percorrido pelo seu sangue após a doação


25 de novembro de 2019 -


Foto: Rodrigo Nunes | Flickr Ministério da Saúde.

*Guilherme Gurgel

Cerca de 2,8 milhões de pessoas por ano recebem doação de sangue no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde. O número chama a atenção para o fato de que apenas 1,6% da sua população é doadora, sendo que a Organização Mundial de Saúde recomenda uma taxa de 3% a 5%. Com o slogan “Uma única doação pode salvar até quatro vidas”, as campanhas governamentais tentam aumentar o número de solidários e reverter o desafio de manter um estoque suficiente para atender a demanda do país. Mas, você sabe como e por que a doação de apenas 450 ml de sangue, aproximadamente, consegue salvar tanta vidas?

De acordo com a gerente de Captação e Cadastro da Fundação Hemominas, Viviane Guerra, após a coleta, o sangue doado é encaminhado para o fracionamento e dividido, por centrifugação, em quatro partes, de acordo com seus componentes. Essa é a primeira etapa do percurso entre a doação e a transfusão.

Pessoas em quimioterapia, com queimadura ou em cirurgias de transplante são alguns dos beneficiados pelo ato de solidariedade

“A parte vermelha do sangue se torna o concentrado de hemácias; o concentrado de plaquetas é o responsável pelo mecanismo de coagulação; o plasma fresco congelado é a parte líquida do sangue; e o crioprecipitado é o produto originado do plasma, também responsável pela coagulação”, enumera Viviane. Dessa forma, quatro pessoas, de acordo com suas necessidades específicas, podem se beneficiar de uma única doação.

No entanto, o número de beneficiados pode ser ainda maior. A gerente conta que, além desses hemocomponentes citados acima, há processos físico-químicos de separação que produzem os hemoderivados em escala industrial. Dentre esses, está o concentrado de fatores de coagulação, usado no tratamento de hemofilia, doença genético-hereditária em que a pessoa tem incapacidade de coagulação sanguínea.

Mas, antes de ser destinada às pessoas e simultâneo aos processos de separação, amostras de sangue do doador são encaminhadas para os exames sorológicos previstos em lei, com a definição do tipo sanguíneo e o fator Rh. “Se os exames mostram que o doador está apto sorologicamente, a bolsa de sangue fracionado está aprovada e passa a fazer parte do estoque”, continua. Então, o material armazenado é encaminhado para atender as diversas demandas de transfusão, seja em hospitais de urgência ou grandes cirurgias.

Quem precisa?

A professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Camila Cancela, especialista em hematologia pediátrica e membro do Serviço de Hematologia/Oncologia do Hospital das Clínicas (HC) da UFMG conta que uma das demandas de transfusão de sangue mais comuns no HC é para os pacientes em tratamento oncológico.

Clique na imagem para ampliar.

“A quimioterapia tem um efeito tóxico, que causa alteração na produção das células sanguíneas”, comenta. Por isso, a transfusão é necessária em várias etapas do tratamento, para repor as células sanguíneas produzidas na medula, principalmente as plaquetas e na correção de anemias.

Outro uso da doação, destacado por Camila, é nos casos de cirurgias de transplante. “Quando é uma cirurgia de grande porte desse tipo, o médico já reserva um volume de cada hemocomponente e vai utilizando conforme a necessidade ao longo do procedimento”, afirma.

No entanto, ela lembra que a necessidade de transfusão nem sempre é planejada como os procedimentos mencionados. Diferentes circunstâncias podem fazer com que qualquer pessoa necessite de transfusão sanguínea. As vítimas de acidentes que causam grandes hemorragias ou queimados graves também são uma demanda comum.

Existem, ainda, os casos em que o paciente tem necessidade de receber transfusão ao longo da vida. “Um exemplo são as doenças pulmonares crônicas, que demandam uma quantidade maior de oxigênio. Também há algumas doenças genéticas na hematologia, como a talassemia, por exemplo, que é um defeito genético no glóbulo vermelho”, enumera Camila.

Um fluxo constante

Todas essas demandas de transfusão são constantes e distribuídas ao longo do ano. Por isso, Viviane Guerra, do Hemominas, aponta a necessidade de doadores regulares. “Não adianta ter um grande volume de doações num momento específico e pontual e no restante do ano não ter. O sangue é um produto perecível”, avalia.

De acordo com ela, um dos hemocomponentes usado com mais frequência, o concentrado de hemácias, dura entre 35 a 42 dias. Enquanto o concentrado de plaquetas, também muito usado, dura somente cinco dias. “Então é importante criar uma estratégia para distribuir as doações ao longo do ano”, comenta.

Um dos períodos de maior necessidade são os feriados prolongados e a época de férias. Viviane aponta o aumento nos acidentes de trânsito nesse período e a contrapartida do baixo comparecimento para doações, já que as pessoas estão aproveitando o descanso. “Sangue é um remédio diferente dos outros, não é possível produzir, nem comprar. Dependemos exclusivamente da solidariedade das pessoas”, conclui.

*Guilherme Gurgel – estagiário de Jornalismo
edição: Gilberto Boaventura