Por que a fertilidade masculina está caindo?

Principal causa do problema é a influência ambiental, especialmente substâncias encontradas em embalagens plásticas


26 de junho de 2019 - , ,


*Guilherme Gurgel

Quase um terço do total das causas de infertilidade conjugal é exclusivamente masculino. Foto: Carol Morena

Segundo o Ministério da Saúde, de 10% a 20% dos casais em idade reprodutiva sofrem de infertilidade conjugal. Dentre esses casos, metade tem causas ligadas ao homem e quase um terço do total é exclusivamente masculino. “Ainda assim, é a mulher quem mais procura o sistema de saúde e se preocupa em investigar o problema”, destaca o professor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFMG, Augusto Barbosa.

Ele esteve presente no Congresso Americano de Andrologia de 2019, onde foi discutida a diminuição da fertilidade do homem e suas principais causas. Um estudo multicêntrico apresentado no evento, realizado principalmente na Europa e nos EUA, mostra que, nos últimos 50 anos, diminuiu em mais da metade a concentração de células reprodutoras presentes no sêmen, fluido que protege os espermatozoides e permite que aconteça a fertilização.

Augusto Barbosa revela que, além de menor concentração de espermatozoides, a quantidade total de sêmen ejaculado também apresentou queda ao longo dos últimos anos.

Entretanto, a fertilidade do homem não está ligada somente a essas concentrações. “A Organização Mundial da Saúde também considera que é esperado ao menos 6% das células perfeitas, em questão de motilidade e morfologia. São parâmetros que determinam a capacidade de se locomover para fertilizar o óvulo e ter a forma ideal para conservar o material genético”, informa o professor.

Impacto do ambiente e dos hábitos

Segundo o professor, a maior parte dos casos de infertilidade masculina ainda não tem causa definida. Mas as influências ambientais são consideradas as de maior impacto na qualidade do sêmen. “Uma das principais causas discutidas é o contato com substâncias presentes em grande parte das embalagens plásticas de alimentos: bisfenol A e ftalatos”, revela.

Augusto afirma que esse contato já é iniciado dentro do útero da mãe, levando a um desequilíbrio hormonal no homem. “Essas substâncias têm ação semelhante ao estrogênio no organismo. E esse hormônio diminui a produção de testosterona. Esta, por sua vez, é uma das principais responsáveis por regular a produção de espermatozoides”, explica.

Essa disfunção é chamada de síndrome de disgenesia testicular e, segundo o professor, é uma das principais hipóteses para explicar o crescimento na infertilidade masculina. Ele conta que para chegar a essa associação, foi observado um aumento na prevalência de diversas condições ligadas ao desequilíbrio hormonal, como as malformações do pênis, do escroto e o câncer testicular.

Outro fator ambiental destacado por Augusto é a exposição ao calor. “A temperatura ideal para o funcionamento do testículo é dois ou três graus a menos do que a temperatura corporal, em torno de 35ºC. Então, se o homem está exposto a ambientes que tem calor excessivo, compromete a produção de espermatozoides”, afirma.

O professor explica que estas são as menores células do corpo e as menos protegidas contra fatores externos. “Por isso, além do calor, a exposição à radiação pode afetar essa célula, causando fragmentação do DNA”, acrescenta.

A alteração no material genético presente no espermatozoide também acontece quando há aumento na produção de moléculas instáveis chamadas radicais livres. Um dos fatores que leva a esse aumento é o tabagismo. Segundo Augusto, além do cigarro, o uso de drogas ilícitas, como maconha e cocaína, diminui a taxa de fertilização e aumenta a taxa de abortamento.

Além do tabagismo e exposição ao calor, obesidade e sedentarismo são fatores influenciadores para infertilidade masculina. Foto: Pixabay

Por fim, o professor destaca o sobrepeso e a obesidade como causa de baixa qualidade no sêmen. Assim, o hábito do sedentarismo influencia na fertilidade masculina.

Influência genética

Apesar de representar somente 17% dos casos, segundo Augusto, existem causas genéticas determinadas que levam à infertilidade masculina. Dentre elas, ele destaca a síndrome de Klinefelter, caracterizada pela presença de um cromossomo sexual a mais no DNA. “Isso faz com que, na adolescência, o testículo não desenvolva normalmente, levando a uma degeneração dos espermatozoides”, acrescenta.

Outra causa congênita de queda na infertilidade são as varizes ou veias dilatadas no escroto, que também aumentam a produção de radicais livres. “Essa condição, chamada varicocele, está presente em 20% da população masculina”, informa o professor. Segundo ele, isso acontece devido a uma alteração no fluxo de sangue.

Invertendo a situação

“Se o indivíduo tem uma exposição por muito tempo, pode chegar a um ponto irreversível”

Augusto destaca uma vantagem do homem quanto à fertilidade: a contínua produção de espermatozoides por toda a vida, ao contrário da mulher, que não produz novos óvulos. “Por isso, em alguns casos a mudança de hábitos permite reverter a situação. Mas se o indivíduo tem uma exposição por muito tempo, pode chegar em um ponto irreversível”, declara.

Algumas condições não podem ser resolvidas com mudanças de hábito, como a varicocele. Para essa condição, o professor afirma que existe um tratamento, mas ressalta que para uma resposta melhor, o paciente deve ser tratado até os 35 anos de idade. A síndrome de Klinefelter também pode ser contornada com o tratamento no momento adequado. “Se essa criança tiver um diagnóstico precoce e for acompanhada, ele poderia passar por um processo de preservação dos espermatozoides”, orienta.

Para o professor, os homens costumam perder importantes oportunidades de cuidarem da saúde e evitar problemas com infertilidade. Ele acredita que a ideia de invulnerabilidade masculina influencia nessa decisão, que leva o homem a pensar que “não fica doente e não precisa procurar assistência médica”.

“A primeira oportunidade de cuidar é quando o homem entra na adolescência e não é levado ao urologista para acompanhar as mudanças que acontecem no corpo. A segunda oportunidade é quando o casal se une e seria o momento ideal para fazer um exame pré-nupcial se pensam em ter filhos no futuro”, aponta.

*Guilherme Gurgel – estagiário de Jornalismo
Edição – Deborah Castro