Sofrimento mental: escutar faz toda a diferença
05 de setembro de 2018
“Não é frescura”, “Não é mimimi”, “Não é fraqueza”…
No Setembro Amarelo, mês que alerta para a importância da prevenção ao suicídio, essas frases têm circulado nas redes sociais. O intuito é combater o tabu que ainda existe sobre o sofrimento mental. Encarar a depressão, transtornos de ansiedade, entre outros sofrimentos psíquicos, como algo que não merece atenção ou simplesmente não existe, cria barreiras ainda mais difíceis de serem vencidas do que o próprio sofrimento. Por isso, especialistas alertam para a importância de eliminar estigmas e estar atento aos que sofrem: “um simples acolhimento, com a escuta verdadeira do outro, pode fazer toda a diferença”.
Se um colega de trabalho ou alguém próximo reclama de alterações no sono, anda desanimado, se recusa a participar de atividades que antes gostava de fazer ou tem expressado sentimentos mais negativos, pode ser sinal de que passa por algum tipo de sofrimento. Os sintomas, que também incluem perda ou ganho de peso, um semblante triste, pensamentos de morte ou suicídio, entre outros, são comuns na depressão, um dos tipos mais prevalentes de sofrimento mental no mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Estar atento ao outro, para perceber essas mudanças, é o primeiro passo para ajudar alguém a lidar com o sofrimento. O segundo, é estar aberto e ter disposição emocional para acolher e ouvir. “No primeiro momento, é tentar escutar e se colocar à disposição da pessoa, para que ela se sinta confortável”, orienta o professor do Departamento de Saúde Mental da UFMG, Humberto Corrêa.
Procurar ajuda não é fácil
– “Ah, isso é frescura de fulano”; “sicrano não tem vontade de fazer nada porque é preguiçoso”!
Esses comentários são tão arraigados em um pensamento coletivo, que até mesmo “sicrano e fulano” passam a acreditar mais neles que nos próprios sentimentos. Com isso, a dificuldade para pedir socorro aumenta. “A maioria acha que a ajuda não vai resolver. Então, tem que pegar na mão dela mesmo e encaminhá-la para a ajuda de um especialista. O tratamento da depressão é um dos mais seguros e eficazes”, ressalta Humberto Corrêa.
Não existe fórmula
– “A vida é linda”; “vou te levar para uma festa”; “vou te arrumar uma namorada”!
A depressão é hoje um dos acometimentos psíquicos mais graves e principal causa de autoextermínio. Dificilmente, quem passa por algum tipo de sofrimento mental irá enxergar que a vida é linda. Além disso, cenários de alegria, festas e viagens podem ser mais prejudiciais do que benéficos. “A pessoa pode se sentir mais incapaz porque ela vai conviver com pessoas que estão em outro nível de equilíbrio. Com isso, pode se sentir pior”, explica o psicólogo do Núcleo de Apoio Psicopedagógico aos Estudantes da Faculdade de Medicina (Napem), Gilmar Fidélis.
Apesar de fazer parte da natureza humana querer resolver tudo, é importante não apresentar fórmulas prontas. “Se você chega para mim deprimida e eu digo ‘deixa eu te falar como faz isso’, pode ser pior. Por isso, é importante não querer resolver, sim querer acolher. O acolhimento é a escuta, é estar presente na vida da pessoa sem demandar dela o que ela não precisar naquele momento”, recomenda o psicólogo.
Como acolher?
– “Olha como você está melhor que fulano”; “você tem tudo, não deveria estar assim”!
Para o acolhimento, algumas dicas são importantes. Não fazer comparações é uma delas. “Tem gente que fala: ‘olha como você está bem melhor que aquela pessoa, não deveria estar assim’. Quando você faz isso, acaba desconsiderando o universo interno daquela pessoa. A dimensão pessoal e existencial do sofrimento psíquico não está ancorada apenas no cenário externo”, afirma Gilmar Fidélis.
Diante disso, o que falar? “É importante perguntar como pode ajudar, perguntar, verdadeiramente, como a pessoa está, ser interativo com ela e tentar fazer uma rede de conexões no entorno dela”, orienta o especialista.
Estar ao lado da pessoa, apoiando e escutando, sem juízo de valor, também é importante para acompanhar se a pessoa está fazendo tratamentos. “O acolhimento, a escuta destituída de juízo de valor, assim como o silêncio inteligente são importantes para a recuperação. Mostrar uma certa disponibilidade também ajuda, mas sem querer solucionar tudo para a pessoa”, conclui Gilmar.