Estudantes publicam artigo sobre Libras na formação médica


18 de abril de 2018


Carol Prado*

O artigo científico, elaborado por estudantes de medicina, foi publicado em revista da USP e questiona sobre atendimento a surdos.

A partir de um debate em sala de aula no primeiro período do curso de Medicina da UFMG, durante a disciplina Introdução a Pesquisa Científica I, quatro estudantes levantaram a questão: “como atender um paciente surdo se a única linguagem que ele sabe é a Língua Brasileira de Sinais (Libras)?”.

O questionamento deu origem ao artigo científico “Libras na formação médica: possibilidade de quebra da barreira comunicativa e melhora na relação médico-paciente surdo”, assinado por Andrezza Resende Dias, Cinthya Rodrigues Coutinho, Deborah Rocha Gaspar e Letícia Moeller, hoje no 6º período do curso, e orientado pelo professor do Departamento de Anatomia e Imagem da Faculdade, Marcelo Henrique Mamede Lewer. O artigo foi publicado na 96ª edição da Revista de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), no final de 2017.

Da esquerda para a direita: Andrezza Resende Dias, Deborah Rocha Gaspar, Cinthya Rodrigues Coutinho, Letícia Moeller. Foto: Carol Prado

Andrezza conta que a ideia surgiu a partir de um relato de um colega que, durante o Internato de Ginecologia e Obstetrícia, passou por grandes dificuldades ao atender uma gestante surda. “Sabemos que há uma grande população surda e/ou muda no país, mas não existe um programa voltado especificamente para isso”, comenta o professor Marcelo Mamede. Segundo ele, existem alguns postos tradutores, mas isso não é a realidade da maior parte das unidades de saúde.

O processo de pesquisa durou aproximadamente dois anos. Para Letícia o mais notável do trabalho foi levar o questionamento da importância de uma comunicação eficaz. “Acredito que é preciso pensar na situação. ‘O que eu faria caso chegasse até mim um paciente surdo? ’. Essa pergunta por si só levanta uma boa discussão. E, se há essa discussão prévia, numa situação real existirão mais ferramentas e formas de lidar, do que ser pego completamente de surpresa”, acredita a estudante.

Contato na formação
Foi elaborado um questionário online, encaminhado via e-mail para estudantes do 12º período de medicina, no primeiro semestre de 2016. O questionário obteve 102 respostas, e apenas 6% dos estudantes que responderam a pesquisa sabiam ou tinham algum tipo de contato com a Libras.
“São mais de 9,7 milhões de pessoas com algum problema auditivo no Brasil. É uma população considerável que tem direito a uma comunicação clara e eficaz entre médico e paciente”, declara Deborah. “Precisamos falar mais sobre isso. Precisamos incluir essas pessoas no serviço de saúde”, afirma a estudante.

Para o professor Mamede, o artigo das alunas funcionou com um sinalizador, um alerta para a realidade relacionada ao ensino e interesse pela Libras. “Acredito que a UFMG, sendo uma das universidades com o maior numero de ingressos do Brasil, já retrata, de certa forma, um quadro nacional. É preciso atentar os alunos e até mesmo a coordenação dos cursos da importância da Libras na formação”, acredita Mamede.

Além da libras, um problema de comunicação
O questionário incluía uma pergunta aberta para o participante discorrer sobre o assunto. “Conseguimos traçar três perfis com a resposta a essa pergunta. Os que acreditavam ser importante e essencial saber Libras; os que acreditavam ser importante, mas não essencial; e os que acreditavam não ser importante saber Libras”, contou Deborah.

Dos participantes, 75% acreditavam ser importante e essencial saber a língua, 7% acreditavam ser interessante, mas não essencial, pois com um intérprete ou uma pequena parcela dominante da Libras seria o suficiente, e 16% acreditavam não ser importante o conhecimento de Libras na formação médica.

“Apesar do nosso senso de que ‘Libras é importante’ alguns argumentos foram contra isso, e com bases argumentativas bem fortes, o que foi uma surpresa para nós”, conta Letícia. “Uma das respostas que debatemos bastante foi a que defendeu que saber outros idiomas era mais importante do que saber a Língua de Sinais”, cita Cinthya. “Então o problema de comunicação não seria só do surdo, seria de qualquer outro tipo de linguagem”, concluiu ela.

Libras na UFMG
Há disciplinas que ensinam a Libras na UFMG mas, para as estudantes há poucas turmas e vagas. “Nós quatro tentamos fazer a matérias de ‘Fundamentos de Libras’ mas não conseguimos. Com o artigo, queríamos questionar isso e propor aumento da oferta dessas disciplinas”, conta Andrezza.

Segundo Letícia, propor que todo estudante ou médico seja fluente em Libras não é viável, mas seria interessante que todos soubessem o mínimo para quebrar as primeiras barreiras de comunicação e facilitar a criação de vinculo entre médico e paciente.

Introdução à Pesquisa Científica
Para o professor Marcelo Mamede, a disciplina tem trazido bons resultados para a Faculdade. “Esse exercício de mostrar ao aluno a importância da pesquisa, e os passos para executa-la, tem feito surgir projetos interessantes”, conta. “Acredito que o mais legal disso tudo é mostrar como o incentivo à pesquisa pode fazer surgir discussões tão interessantes quanto essa desenvolvida por Andressa, Chyntia, Deborah e Letícia”, conclui.

Acesse o artigo na página da Revista.

*Redação: Carol Prado – estagiária de jornalismo
Edição: Mariana Pires