Estudo internacional aborda novo teste e mudança de nome da síndrome de polidipsia e poliúria

Professoras do Departamento de Clínica Médica pesquisam condição, antes chamada de diabetes insipidus


20 de novembro de 2023 - , , , , , ,


*Mariana Lage

A polidipsia e poliúria são observadas em pessoas que bebem água exageradamente por hábito, assim como por deficiência. Foto: Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG

As professoras Juliana Beaudette Drummond e Beatriz Santana Soares Rocha, do Departamento de Clínica Médica (CLM) da Faculdade de Medicina da UFMG, participam de um estudo de alto impacto sobre polidipsia e poliúria publicado na última quinta-feira (16 de novembro), no New England Journal of Medicine.

A pesquisa trata de um novo procedimento para diagnóstico diferencial da condição chamada de síndrome de polidipsia e poliúria. O quadro é observado em pessoas que bebem água exageradamente por hábito, assim como por deficiência ou resistência ao hormônio arginina vasopressina (AVP, também conhecido como ADH), que regula a produção de urina nos rins. O estudo apresenta uma comparação entre dois testes diagnósticos, que dosam a molécula copeptina após estímulo com arginina ou solução salina. A copeptina funciona como um marcador substitutivo do AVP, por ser co-secretada com ele pela hipófise posterior.

O estudo também marca um momento importante que é a mudança de nome da síndrome, antes chamada de diabetes insipidus. “O objetivo é aumentar a segurança no tratamento dos pacientes, já que muitas pessoas, inclusive profissionais de saúde, confundem o diabetes insipidus com o diabetes mellitus, doença muito mais comum. Essa é uma iniciativa internacional de várias sociedades de endocrinologia ao redor do mundo, que conta com o nosso grupo representando o Brasil e a América Latina”, explica a professora Juliana Drummond.

Professoras do Departamento de Clínica Médica pesquisam condição, antes chamada de diabetes insipidus
A equipe que desenvolveu o trabalho. À direita em ordem: Elaine Gomes (técnica da Thermo Fisher), Juliana Beaudette Drummond, Beatriz Santana Soares Rocha e Luis Henrique Dias Lima. Foto: Arquivo pessoal.

Na UFMG, o trabalho contou com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), além de patrocínio da Universidade de Basileia, na Suíça. Além das professoras, também participou Luis Henrique Dias Lima, como bolsista de iniciação científica, agora bacharel em Medicina pela UFMG.

Entenda a síndrome

A poliúria e polidipsia têm a mesma manifestação clínica para causas diferentes, sendo as mais comuns ligadas à vasopressina, o hormônio antidiurético, que faz com que os rins conservem a água no corpo. A mais comum é a deficiência hormonal da vasopressina (antes chamada de diabetes insipidus central, agora AVP-D), que pode estar ligada a uma cirurgia ou tumores na hipófise, onde ela fica armazenada. A segunda é a resistência à vasopressina (diabetes insipidus nefrogênica, agora AVP-R), causada por uma mutação no receptor do hormônio, que vem do rim.

“A terceira, que é mais rara mas vem aumentando em incidência, é a polidipsia primária, que pode ser por uma crença de que beber água exageradamente seja saudável – ou por uma doença, como lesões na estrutura no hipotálamo, onde está o centro que regula sede, fome e saciedade, que podem causar vontade exagerada de beber água”, explica a professora. Indivíduos que criam o hábito de beber água exageradamente acabam “lavando” os rins e prejudicando sua capacidade de processar a urina corretamente.

Apesar de também se chamar diabetes, a síndrome tem características distintas e é uma doença rara, bem menos prevalente que o diabetes mellitus, relacionada à insulina. Em 2009, no Reino Unido, um paciente veio a óbito durante a internação para uma cirurgia eletiva porque os médicos responsáveis pensaram que ele tinha diabetes mellitus, não o insipidus. Ele morreu de desidratação e choque hipovolêmico. Em vez de administrar fluidos e desmopressina para o paciente, a equipe restringiu líquidos e monitorou o açúcar no seu sangue.

A professora Drummond, cujo doutorado também tratou da testagem para a poliúria e polidipsia, participa de uma rede internacional com representantes de sociedades de endocrinologia e de pacientes ao redor do mundo chamada Renomeando o Diabetes Insipidus. O novo nome já foi aprovado pelas Sociedades de Endocrinologia da Austrália, Brasil, Estados Unidos, Europa, Japão, Reino Unido e Sul Asiático. Uma declaração conjunta pela mudança de nome foi publicada ao redor do mundo, e o grupo também busca tornar a desmopressina um medicamento crítico, de forma que ele esteja disponível nas farmácias da maior parte dos hospitais e não apenas nos de atenção terciária.

Segundo ela, 80% dos pacientes participantes do estudo na Europa responderam que gostariam que o nome da doença mudasse, por já terem tido problemas com o nome. “Mudar o nome de uma doença não é simples. Propomos continuar usando o nome antigo entre parênteses pelos próximos anos, até que o novo nome seja amplamente reconhecido e aceito. Mas recentemente, um paciente que não sabia que eu participava da pesquisa me perguntou se eu sabia que o nome estava mudando”, comemorou.

Novo teste diagnóstico

O estudo publicado nesta quinta-feira trata do uso de uma solução de arginina para dosar a copeptina no sangue. É um teste mais confortável e seguro do que o atual padrão ouro, que usa uma solução salina. “A solução salina é muito concentrada, quando o sódio sobe ele sente muito mal estar, enjoo, dor de cabeça”, explica a professora. O uso dessa solução foi tema do doutorado da pesquisadora, há cinco anos. 

“O teste com arginina é um teste inicial, pode ser usado  para um paciente que tem mais risco, para pacientes mais frágeis, mais velhos, com outras doenças…”, contou. No Brasil, a solução salina é gratuita nos hospitais, e a solução de arginina ainda não está disponível. Para ler o artigo completo no New England Journal of Medicine, acesse este link

*Estagiária sob supervisão de João Motta.