Índice de amamentação aumenta no Brasil, mas ainda está longe do ideal

Programa de rádio Saúde com Ciência discute a importância do aleitamento e impactos do mercado de trabalho


25 de agosto de 2021 - , , ,


*Maria Beatriz Aquino

O aleitamento materno é considerado o padrão ouro da alimentação infantil. Por isso, neste mês, a campanha “Agosto Dourado” vem reforçar a importância da amamentação para o bom desenvolvimento das crianças. A novidade que traz esperança é o aumento de 42,8 pontos percentuais na prevalência do aleitamento materno entre crianças menores de seis meses – idade mínima necessária para o desmame -, segundo dados do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani), de 1986 a 2020. Porém, o percentual total de amamentação no Brasil ainda está muito aquém do recomendado pela Organização Mundial da Saúde.

De acordo com o estudo, a prevalência de aleitamento nessa faixa etária no país passou de 2,9% a 45,7% nesses 34 anos. No entanto, o indicador ainda é considerado razoável pela OMS, que inclui nessa classificação os percentuais entre 12% a 49%. Para se ter uma ideia do quanto ainda é preciso caminhar, o percentual entre 50% a 89% considerado bom e muito bom na faixa de 90% a 100%

Embora ainda insuficiente, o crescimento do índice brasileiro demonstra avanços. Para a pediatra e professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Maria Cândida Ferrarez Bouzada, campanhas de conscientização como “Agosto Dourado” foram fundamentais para os resultados da pesquisa.

“A exclusividade para o leite materno é até o sexto mês, e esse tipo de iniciativa ajuda a mãe a respeitar esse momento”. A professora é a convidada do programa de rádio Saúde com Ciência desta semana e conversa sobre o tema Agosto Dourado: amamentar é um ato de amor

Por que amamentar?

Para as mães que podem e querem amamentar, os benefícios são inúmeros. A OMS reconhece que o aleitamento reduz em 13% o risco de mortalidade de crianças até os cinco anos, previne de infecções intestinais e respiratórias, reduz da probabilidade de desenvolvimento de doenças crônicas – diabetes e obesidade – e até a leucemia, futuramente.

Para a mãe, também são muitos os benefícios, a começar pela prevenção do câncer de mama e ovários, seguido pela rápida perda de peso. Já no caso das mulheres que tiveram diabetes gestacional, a possibilidade de se tornar diabética de forma definitiva, tendo amamentado, é consideravelmente reduzida. 

Além disso, Maria Cândida acrescenta que o aleitamento contribui também para o meio ambiente enquanto fonte de energia renovável. “A energia que se gasta para produzir o leite de vaca, desde a industrialização até o transporte, é muita e ainda não vem de uma fonte limpa”, completa.

Desafios no retorno ao trabalho

Mas nem tudo são flores e um grande obstáculo enfrentado por mulheres lactantes, ou seja, que estão em fase de amamentação, é o retorno ao trabalho. Após o fim do período de licença maternidade, que pode variar de 120 dias (quatro meses) a 180 dias (seis meses), a reinserção da mulher no mercado de trabalho pode ser difícil e dolorosa. Isso porque é necessário conciliar o desmame do bebê, rotinas domésticas e profissionais.

Para a professora e educadora física, Juliana Brum, de 38 anos, a volta às salas de aula encerra o ciclo de amamentação exclusiva para sua pequena Lívia, de apenas 4 meses de vida. Como o marido também trabalha, a preocupação da mãe de segunda viagem no momento é a de deixar a filha no berçário aos cuidados de outra pessoa fora do seu convívio:

Juliana acrescenta que as dificuldades também incluem a atenção direcionada a sua primeira filha, Laura, de 6 anos, que reivindica a presença da mãe em boa parte das tarefas. Entre ensino de deveres escolares, planejamentos de aula e a amamentação, o que resta é uma grande sensação de incapacidade. A educadora física conta que não conseguirá manter o aleitamento exclusivo até os seis meses:

O desmame precoce acaba afetando ambas as partes, mãe e filha. Juliana desabafa que considera cedo para se separar da filha e, ainda, se adaptar às novas transformações sofridas no próprio corpo para o retorno ao trabalho:

Como minimizar impactos

Para as mães que trabalham fora, Maria Cândida aconselha que o reservatório de leite doméstico no congelador de casa é uma boa estratégia para não interferir no ciclo de desenvolvimento da criança.

“A coleta desse leite deve ser realizada com as instruções do seu médico, ou do próprio banco de leite, para o bebê utilizar quando ela estiver fora de casa”, explica.

Mas sensação de incapacidade é mais comum do que se imagina e também se estende às mulheres que trabalham em home office. Isso porque 92% delas também são as responsáveis pelos filhos neste período, por questões estruturais da sociedade, que ainda relega esse cuidado à mulher, ou porque não possuem rede de apoio. Com isso, elas acabam se sentido sobrecarregadas, o que dificulta o aleitamento.

A pediatra e professora da Faculdade de Medicina da UFMG, Maria Cândida Bouzada, reforça que o ato de amamentar é uma responsabilidade de todos e a rede de apoio a essa mulher deve estar sempre presente durante o aleitamento, para que ela se sinta protegida e amparada pelos amigos, familiares e vizinhos.

“A rede é importante até para combater esses tabus da amamentação, porque com o conhecimento de todos, podemos ajudar essa mãe a não cair nas informações falsas”, ressalta. 

MITOS E RECOMENDAÇÕES

Durante o período de amamentação, muitas mulheres sofrem mudanças no corpo e decidem seguir recomendações que são não médicas, mas que vêm de uma tradição familiar. Desde o preparo da mama para receber o bebê até os famosos chás que supostamente ajudam na produção de leite, são muitos os conselhos recebidos pelas novas mamães. Mas a maior parte deles são apenas tabus e de nada ajudam.

Para a professora Maria Cândida, a teoria do leite fraco é um dos maiores mitos ao redor do mundo e o principal responsável por minar a autoconfiança da mulher.

“Ela (mulher) passa a não acreditar nela mesma e na sua capacidade de produzir o próprio leite”, frisa a especialista. Ela ressalta que o leite tem todos os nutrientes que o bebê precisa, independentemente da espessura ou coloração.

Quanto ao endurecimento das mamas e as feridas que podem aparecer no início do aleitamento, os cuidados devem sempre ser orientados por um profissional, preferencialmente o que acompanhou a mulher desde o pré-natal e já conhece seu comportamento. Outros métodos como banhos de sol e pomadas cicatrizantes ainda não são comprovados cientificamente e, por isso, não são recomendados.

AMAMENTAR É DIREITO

A amamentação é considerada como ato de amor e carinho da mãe para seu filho, mas também se configura como um direito assegurado à mulher por lei no Estatuo da Criança e do Adolescente. Por isso, mesmo em uma situação de pandemia, a mulher não pode ser privada de ter esse momento. Além disso, amamentar em público não precisa ser um ato vergonhoso para as mães nem motivo para tabus. O projeto de lei 514, aprovado em 2019, assegura a ação penalizando com multa, de no mínimo dois salários mínimos, para quem violar o direito. 

Vale ressaltar que as medidas de prevenção ao vírus não podem ser deixadas de lado e devem ser respeitadas desde a maternidade, como a lavagem das mãos antes de pegar o bebê.

Saiba mais no Saúde com Ciência

Conhece a hora de ouro? Sabe o que significa e a importância do primeiro contato da mãe com seu filho? Essas e outras informações você encontra no programa Saúde com Ciência dessa semana.

O programa é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a quinta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify.

Maria Beatriz Aquino: Estagiária de jornalismo
Edição: Karla Scarmigliat