Medicamento protege coração de mulheres em tratamento contra câncer de mama
Estudo revela importante proteção às complicações cardiológicas oriundas do tratamento oncológico
26 de setembro de 2018
Estudo revela que Dexrazoxano pode reduzir importantes complicações cardiológicas durante o tratamento oncológico
Raíssa César*
O diagnóstico de um câncer de mama pode acarretar mudanças significativas na vida da mulher, que precisa lidar com questões que fogem à rotina, como os efeitos colaterais de medicamentos. Alguns quimioterápicos, por exemplo, podem trazer problemas para o bom funcionamento do coração, preocupação a mais para quem já enfrenta os desgastes do tratamento. Para alívio do coração, no entanto, pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG revisou o benefício de um medicamento que pode reduzir em torno de 80% o risco de insuficiência cardíaca em mulheres com esse tipo de câncer.
A pesquisa desenvolvida pela cardiologista Ariane Vieira Scarlatelli Macedo aponta o Dexrazoxano como medicamento eficaz na proteção ao coração da mulher. Em pacientes com câncer de mama, o tratamento pode incluir o uso de quimioterápicos como a Antraciclina, associada ou não ao Trastuzumabe. Esses dois medicamentos podem acarretar em complicações cardiológicas, as quais impedem que o tratamento oncológico seja continuado.
“A prevalência de pacientes que desenvolvem insuficiência cardíaca, secundária ao uso de quimioterapia como Antraciclinas, gira em torno de 3% a 5%, a depender da dose utilizada”, informa a cardiologista. Segundo ela, esse percentual se torna expressivo ao considerar um universo de milhares de pacientes que fazem quimioterapia. “Além disso, essa complicação, por vezes, pode ser grave, podendo levar a paciente ao óbito”, completa. Em 2018, a estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca), é de 59.700 mil novos casos de câncer de mama.
O uso do Dexrazoxano, no entanto, pode reduzir em quase 80% a chance de a paciente desenvolver insuficiência cardíaca sintomática, e em torno de 70% a chance de a paciente desenvolver o quadro de evento cardíaco (queda da função do coração sem sintomas, detectado a partir do ecocardiograma, exame de imagem do coração).
Além disso, ao analisar os desfechos oncológicos do tratamento, não foi encontrada diferença na taxa de resposta oncológica (redução do tumor) com o uso do medicamento. O tempo de vida da paciente e de sobrevida livre de progressão (tempo em que a pessoa fica viva sem que a doença volte) também não se modifica. “Com esses dados, os oncologistas e cardiologistas podem mudar a história de tratamento da paciente, permitindo que ela seja medicada, e mantendo a segurança do coração”, defende a pesquisadora.
A pesquisa foi realizada com base em revisão bibliográfica, reunindo os estudos mais atuais ao redor do mundo. Também foi feita uma meta-análise, que consiste na compilação e análise estatística de vários dados de pesquisas diferentes. “Trazendo mais dados para os cardiologistas e oncologistas, acredito que possamos ampliar a utilização desta droga, acreditando na potência dela como protetora”, explica Ariane.
Incorporação pelo SUS
O Dexrazoxano ainda não é disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ao contrário dos outros dois medicamentos.
Dessa forma, Ariane explica que seu uso acarreta em um maior custo no tratamento quimioterápico. Assim, a droga deve ser pensada para o grupo de pacientes com maior risco de complicações, como mulheres idosas, mulheres que já tiveram eventos cardíacos e pacientes que estão sendo reexpostas à Antraciclina, em doses acima das doses consideradas seguras.
A cardiologista acredita, porém, que a importância desses dados aponta para a possibilidade de a medicação ser incorporada pelo SUS. “Existe todo um protocolo técnico de incorporação de medicação pelo SUS, no entanto, pelo impacto que essa droga pode trazer e por suas implicações significativas para a prática clínica, esperamos que um dia esse conhecimento traga essa possibilidade”, conclui.
Entenda o funcionamento
As Antraciclinas correspondem a um grupo de agentes quimioterápicos altamente eficazes, responsável por destruir as células tumorais, sendo uma droga muito utilizada no tratamento de alguns tipos de câncer de mama. Porém, ela pode, dependendo da dose utilizada, acarretar uma toxidade cardíaca, que pode levar a paciente a desenvolver uma insuficiência do coração, doença em que o órgão não bombeia o sangue como deveria.
O Trastuzumabe, por sua vez, corresponde a um anticorpo utilizado para tratar alguns tipos de câncer de mama como um tratamento adjuvante. A cardiologista argumenta que o Trastuzumabe revolucionou o tratamento do câncer de mama, pois trouxe uma possibilidade nova de tratamento eficaz para milhares de pacientes, porém, associado ao Antracíclico, pode aumentar o risco de as pacientes apresentarem toxidade cardíaca. “Do ponto de vista oncológico, são medicações excelentes, altamente eficazes”, explica Ariane. “Porém, em algumas pacientes, e dependendo da dose utilizada, pode acarretar em complicações cardiológicas”, conclui.
O trabalho foi escolhido para ser apresentado no Congresso Americano de Oncologia, o mais importante da especialidade, em junho deste ano em Chicago, EUA.
Nome do trabalho: Eficácia do Dexrazoxano na Prevenção de Cardiotoxicidade em Pacientes com Câncer de Mama Expostos a Quimioterapia com Antraciclina, associado ou não ao Trastuzumabe: Revisão Sistemática e Metanálise
Autora: Ariane Vieira Scarlatelli Macedo
Nível: Mestrado
Programa: Pós-Graduação em Ciências Aplicadas a Saúde do Adulto
Orientador: Antônio Luiz Pinho Ribeiro
Coorientadora: Angélica Nogueira Rodrigues
Data da defesa: 10 de maio de 2018
*Redação: Raíssa César – estudante de Jornalismo
Edição: Karla Scarmigliat