Nupad celebra 30 anos de triagem neonatal no SUS

Redução da mortalidade infantil e de casos de deficiência intelectual são marcas da contribuição ao SUS ao longo de três décadas.


27 de setembro de 2023 - , ,


Foto: CCS/Faculdade de Medicina da UFMG.

O Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) da Faculdade de Medicina da UFMG completa 30 anos de atividades neste mês de setembro. Com ele, o Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PTN-MG) também chega à sua terceira década, sendo um componente do Programa Nacional de Triagem Neonatal do Ministério da Saúde (PNTN-MS) e sob gestão da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES-MG).

Antes do PTN-MG, o exame conhecido como teste do pezinho só estava disponível em caráter privado. “Não havia triagem gratuita e mesmo as coletas de serviços particulares eram enviadas para laboratórios de São Paulo. Apenas realizavam o teste as pessoas que tinham condição financeira de pagar”, lembra o professor José Nélio Januário, diretor do Nupad.

O teste do pezinho e o acompanhamento ambulatorial das crianças impactaram nos indicadores de saúde do estado. “A criação do PTN-MG refletiu na queda de casos de deficiência intelectual por fenilcetonúria e hipotireoidismo congênito. Por exemplo, hoje não vemos mais casos de cretinismo, que é uma forma gravíssima de hipotireoidismo. As ações também interferiram na mortalidade infantil, especialmente pelo acompanhamento da doença falciforme”, explica Nélio.

O sistema público de saúde, fruto da Constituição de 1988, ainda estava sendo implementado em 1993. “O SUS era uma criança na época. A triagem neonatal não era uma política ministerial. Havia apenas algumas iniciativas estaduais”, segue o professor. Em Minas Gerais, o governo do Estado, por meio da SES-MG, firmou parceria com a UFMG para a criação do Programa. O primeiro painel de doenças triadas era composto por fenilcetonúria e hipotireoidismo congênito. Em cinco anos, o PTN-MG já chegava a 90% dos recém-nascidos mineiros.

Foto: CCS/Faculdade de Medicina da UFMG.

Conduzido inicialmente como um programa de extensão, em 1995 o Nupad se tornou um órgão complementar da Faculdade de Medicina, status que ocupa até hoje. Ao longo do tempo, algumas doenças entraram no painel. É o caso da doença falciforme (1998), fibrose cística (2003), hiperplasia adrenal congênita (2013), deficiência de biotinidase (2013), cinco defeitos da betaoxidação dos ácidos graxos (2022) e toxoplasmose (2022).

O Nupad disponibiliza os resultados para os pais de crianças triadas e para os profissionais de saúde dos municípios em sua página. Os dados de acesso (usuário e senha) estão disponíveis no envelope entregue para as famílias pela Unidade Básica de Saúde. Saiba como acessar.

O painel atual é composto por 12 doenças. Após a triagem, os casos suspeitos passam por exames de confirmação. Quando o diagnóstico é confirmado, a rede assistencial do SUS acompanha o caso, que muitas vezes dura toda a vida.

Em 2023, o Nupad ultrapassou a marca de sete milhões de mineiros triados no estado. Hoje, o programa abrange 3.823 Unidades Básicas de Saúde, nos 853 municípios de Minas Gerais. Até julho deste ano, 7.818 pessoas estavam em acompanhamento ambulatorial em decorrência do trabalho do PTN-MG. O tratamento e acompanhamento é realizado principalmente no Hospital das Clínicas da UFMG/Ebserh, Hospital João Paulo II, Fundação Hemominas, Hospital Universitário de Juiz de Fora e nas UBS de âmbito municipal (especialmente para hipotireoidismo congênito).

Não é apenas salvando recém-nascidos e evitando sequelas que o Núcleo atua. Na pandemia de covid-19 o Nupad fortaleceu seu vínculo com a rede do SUS ao realizar exames de RT-PCR de alta qualidade e em quantidade significativa dentro do Programa de Cooperativa de Laboratórios da UFMG – CooLabs Covid-19.

Mais recentemente, em 2023, o Laboratório de Genética e Biologia Molecular do Nupad começou a executar testes diagnósticos moleculares para arboviroses. O painel consta de testes para dengue, chikungunya e zika, atendendo inicialmente a rede pública da microrregião de Contagem.

Ampliação

Em maio de 2021 foi sancionada e publicada a Lei nº 14.154/21, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, ampliando o número de doenças rastreadas pelo teste feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Com a expansão, dezenas de doenças serão inseridas no programa.

A inclusão será em cinco etapas: 

  • Etapa 1: além das seis atuais, toxoplasmose congênita;
  • Etapa 2: galactosemias, aminoacidopatias, distúrbios do ciclo da ureia e distúrbios da betaoxidação dos ácidos graxos;
  • Etapa 3: doenças lisossômicas;
  • Etapa 4: imunodeficiências primárias;
  • Etapa 5: atrofia muscular espinhal.

Para o Nupad, há consenso que um grupo de doenças chamadas de acidemias orgânicas – por sua importância – estão implicitamente incluídas na Etapa 2.

A expansão já está em curso no estado de Minas Gerais. Em 2022, por iniciativa e financiamento da SES-MG, o PTN-MG dobrou de seis para 12 doenças triadas e acompanhadas. A cada doença que entra no painel o teste se torna mais custo-efetivo, já que aproveita a equipe especializada e equipamentos de ponta presentes no laboratório. Nesse sentido, os estudos apontam possibilidades de incorporação de novas doenças, considerando os bons resultados da primeira fase de ampliação.

Para o diretor do Nupad, a experiência com as seis novas doenças trouxe dois ensinamentos. “Primeiro que é extremamente importante o cuidado nutricional e educacional para tratar os defeitos da betaoxidação dos ácidos graxos. Os bebês podem fazer hipoglicemia de diferentes graus muito facilmente. Com medidas simples, evitamos sequelas e óbitos”, destaca. 

“Já para a toxoplasmose, é fundamental que a atenção primária à saúde nos municípios se atente ao conceito de profilaxia ao Toxoplasma gondii durante o pré-natal, além de orientar as gestantes quanto às formas de contágio”, conclui.

Olhando para o futuro, o desejo do Núcleo é seguir contribuindo com o SUS. “Vislumbramos que, cada vez mais, nossa identidade esteja ligada à saúde pública, sendo um ponto de apoio para diagnósticos em larga escala e vigilância epidemiológica”, assegura o professor. 

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