Professora da Faculdade descreve nova doença neuromuscular em estudo premiado


07 de dezembro de 2018


Arte: CCS Medicina UFMG

A pesquisa realizada, com a professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Juliana Gurgel Giannetti, identificou um novo quadro neurológico complexo causado por uma disfunção mitocondrial, que afeta os músculos, a visão e partes do sistema nervoso. Com o tratamento, a partir da ingestão de vitaminas que melhoram o funcionamento da mitocôndria, os portadores da disfunção têm apresentado melhor qualidade de vida, com controle dos sintomas musculares.

Além da descrição do quadro clínico, os pesquisadores identificaram o gene responsável pelas alterações na vida dos acometidos. O estudo foi realizado em parceria com pesquisadores internacionais e um grupo da USP. Como impacto dos resultados, o trabalho foi premiado no 13ª Congresso Brasileiro de Neurologia Infantil no mês de novembro.

O primeiro paciente a ser identificado com o novo quadro começou a ser acompanhado pela professora Juliana a partir dos 3 anos de idade, quando apresentou alteração visual. Posteriormente, um familiar desse paciente apresentou os mesmos sintomas e, então, a pesquisadora identificou a relação genética dos sintomas.

Coincidentemente, três membros de uma família atendidos em São Paulo também apresentaram os sintomas. Assim, o grupo de pesquisadores em Belo Horizonte trabalhou em conjunto com esse grupo de São Paulo para a descrição completa do quadro clínico.

Identificando os sinais

A professora explica que o primeiro sinal da doença é a perda visual, causada pela atrofia do nervo óptico, que ocorre, geralmente, até os 2 anos de idade. “Na primeira década de vida, os pacientes se queixam de dificuldade na prática de atividade física e, na segunda década, costumam apresentar comprometimento do nervo periférico, que traz ainda mais fraqueza e alteração da sensibilidade nas pernas”, completa. Todas essas alterações estão ligadas à disfunção na mitocôndria – parte da célula responsável pela produção de energia.

A disfunção específica foi identificada através de uma biópsia do músculo dos pacientes, onde encontraram um padrão não descrito na literatura. Para entendê-lo melhor, realizaram o estudo genético por exoma – sequenciamento de todos os genes do DNA. Assim, identificaram a mutação no gene FDX2, cuja função nunca tinha sido associada à disfunção de mitocôndria, tratando-se, portanto, de uma doença de transmissão genética, com herança recessiva.

Outro achado específico da doença na primeira década de vida é a alteração da substância branca do cérebro, identificada através de ressonância magnética. Segundo Juliana, esse é um achado raro e descrito na literatura para poucas doenças e sempre associado a um quadro neurológico grave. “No entanto, para os pacientes estudado, a alteração é naturalmente revertida com o tempo, sem apresentar manifestação clínica”, informa.

Recepção do estudo

Professora Juliana Gurgel apresentando o estudo em congresso internacional. Arquivo Pessoal.

“Além da descrição deste complexo quadro clínica, a associação do gene FDX2 às funções da mitocôndria é um importante resultado, já que este fato não estava claro na literatura”, declara Juliana. Segundo a professora, nenhum outro caso desta doença foi relatado. “Alguns pesquisadores de outros países identificaram quadros musculares associados a outros genes com função semelhante ao FDX2, porém nenhum tem todas as características descritas no estudo”, informa.

Para o tratamento dos sintomas apresentados pelos pacientes avaliados, segundo Juliana, foi utilizada a reposição de vitaminas, que melhoram o funcionamento da mitocôndria. “Com a aplicação deste tratamento, as famílias referiram melhora dos sintomas musculares, experimentando uma melhoria na qualidade de vida”, afirma.

Além do reconhecimento no Congresso Brasileiro de Neurologia Infantil a pesquisa recebeu o prêmio José Antônio Levy, da Academia Brasileira de Neurologia, que reconhece os melhores estudos sobre doenças neuromusculares no país, assim como foi publicado no periódico Brain, um dos mais relevantes sobre a pesquisa em neurologia. “Também fui convidada a apresentar o estudo no melhor congresso de Doenças Musculares, World Muscle Society Congress, na sessão de Late Break News, que aconteceu na Argentina em outubro deste ano”, conta.

Para ler o estudo, em inglês, acesse o link.