Simpósio marca 30 anos do Departamento de Propedêutica


08 de agosto de 2019


Os 30 anos do Departamento de Propedêutica Complementar (PRO) da Faculdade de Medicina da UFMG serão celebrados com aquilo que se tornou a marca do Departamento: a interface com diferentes áreas. Isso porque, no próximo dia 23, será realizado o I Simpósio do Departamento de Propedêutica Complementar, onde será possível conhecer a interação entre a Propedêutica Complementar e demais áreas de conhecimento da Medicina, bem como se inteirar sobre diagnóstico laboratorial de doenças com grande incidência no país, como a sífilis.

O evento, gratuito, ocorrerá das 8h às 12h, na sala 614 da Faculdade. O público alvo são professores e alunos da Instituição, que poderão conferir debates com a participação de docentes da PRO e convidados dos departamentos de Cirurgia, Clínica Médica, Ginecologia e Obstetrícia e Pediatria da Instituição. As inscrições podem ser feitas no site do evento.

A sífilis congênita e os biomarcadores cardíacos serão temas debatidos durante o simpósio. “São assuntos muito importantes para os alunos, do ponto de vista do laboratório, para o diagnóstico, já que a incidência de doenças cardiovasculares é alta e da sífilis congênita aumentou muito nos últimos anos”, ressalta a chefe do Departamento de Propedêutica Complementar, Sandra Guerra.

No Brasil, as doenças cardiovasculares são as principais causas de morte. De acordo com dados do Ministério da Saúde, em 2018, foram realizadas 83.909 cirurgias cardíacas em adultos. Já em Belo Horizonte, de 2016 a 2018, o número de casos de sífilis congênita aumentou em 104,7%, de acordo com o Boletim Epidemiológico de Sífilis – 2018. Esse tipo da doença infecciosa é causado pela bactéria Treponema pallidum e transmitida ao feto pela placenta.

Em todas as áreas

Assim como nos casos de sífilis congênita e doenças cardiovasculares, para a subchefe do PRO, Luciana de Gouvêa Viana, todas as áreas da Medicina precisam de um diagnóstico laboratorial para fechar o diagnóstico do paciente com mais certeza. Por isso, segundo ela, é importante que os profissionais saibam solicitar e interpretar os resultados dos exames. “Nossa missão é ensinar isso para os alunos”, ressalta.

Mas não é só no ensino que o departamento se destaca. As três décadas de história também foram de contribuições importantes para a pesquisa e a extensão da Universidade. A professora do PRO, Dulciene Maria de Queiroz, foi protagonista dessas contribuições e esteve à frente de descobertas importantes para a ciência como os estudos sobre o H.pylori.

30 anos de história

Dulciene foi homenageada em 2016 com Medalha da Inconfidência Arquivo pessoal.

A história da professora Dulciene se confunde com a história do próprio departamento. Ela foi uma das primeiras residentes em Patologia Clínica da Faculdade e convidada a constituir o corpo de docentes nessa área em 1976. A professora conta que, historicamente, a Propedêutica Complementar esteve ligada à Clínica Médica.

“O Departamento de Clínica Médica foi ficando muito grande. Então surgiu a ideia de tentar diminuir o volume. A ideia inicial era criar a Patologia Clínica. E nós fomos criados junto com a Radiologia. Os dois ficaram muito tempo juntos, e só recentemente que separaram porque foi criado um outro curso, o de Tecnologia em Radiologia”, lembra.

Na pesquisa, Dulciene iniciou trabalhos com o trato gastrointestinal. “Trabalhava basicamente com o intestino, com diarreia na infância, principalmente. Nós tínhamos na época muita diarreia bacteriana e infecciosa nas crianças. Isso era um grande problema, pois era uma doença que levava ao óbito”, conta.

Um dos estudos conduzidos pela professora foi com um microrganismo que ainda não era estudado no país, o Campylobacter, que causa diarreias graves. “Pela primeira vez, conseguimos cultivar a bactéria. Classificamos as amostras e percebemos que era muito prevalente na nossa população, o que era totalmente desconhecido”, revela.

De acordo com a especialista, esses microrganismos resistem a temperaturas altas, então são comuns em países com climas mais quentes, além de terem relação com os níveis socioeconômicos e a higiene. “O Campylobacter é uma bactéria de países que tem clima mais alto, porque elas crescem melhor em temperaturas mais altas. A gente levantou um dado epidemiológico sobre o que tinha aqui no nosso meio. Na época, não havia nada sobre ela no Brasil”, afirmou.

A experiência com o Campylobacter foi importante para descobertas relacionadas a outra doença, o Helicobacter pylori (H. pylori), que na época ainda era nomeado de Campylobacter pyloridi.

Pioneirismo no H.pylori

Embora o Campylobacter e o Helicobacter fossem organismos diferentes, inicialmente, as duas doenças eram confundidas. “Enquanto o Helicobacter é no estômago, o Campylobacter é no intestino. Enquanto essa primeira bactéria causa gastrite e úlcera, a segunda causa diarreia. Existia uma dificuldade de aceitação muito grande, pois não se acreditava que tinha bactérias no estômago, porque o estômago é ácido e sempre foi tido como estéril”, diferencia a professora.

“Realizamos o primeiro trabalho brasileiro sobre H. pylori, publicado ainda como Campylobacter. Isso foi muito importante porque o assunto era muito recente”, salienta Dulciene. Outro trabalho pioneiro foi o levantamento da infecção no Brasil. A professora também demonstrou que só os indivíduos que tinham a bactéria tinham gastrite. “Isso ganhou destaque porque essa associação ficou muito clara e muito bem demonstrada com inúmeros casos, confirmando os trabalhos internacionais que já tinham sido feitos”, ressalta.

De acordo com a professora, os estudos seguintes procuraram fazer a associação da bactéria com câncer e úlcera, já que existia uma intuição mundial para isso, pois os indivíduos com úlcera duodenal, por exemplo, sempre tinham H. pylori e gastrite naquela região. “Os dois pesquisadores que confirmaram, ganharam um prêmio Nobel ao demonstrarem que a principal causa da úlcera duodenal era a infecção pela bactéria. Nós comprovamos isso, inclusive em crianças, o que não ocorre comumente”, cita.

Desafios

A professor Dulciene, assim como os demais professores do departamento, continua à frente de descobertas importantes para área. No ensino, os desafios também são muitos: “ A gente tem que ensinar os alunos a adquirir habilidades para escolher adequadamente os exames que ele precisa fazer, quais são de fato necessários para o diagnóstico e o acompanhamento. Não fazer exames, por exemplo, só porque existe uma rotina. Na nossa linguagem, a gente faz aqueles que são necessários”, analisa Dulciene.

Segundo ela, o I Simpósio do Departamento de Propedêutica Complementar exerce papel importante nessa aprendizagem.  Mais informações sobre o evento e inscrições: www.medicina.ufmg.br/simposiopro