Técnica pode baratear testagem em massa de covid-19 por RT-PCR em até 90%

Agrupamento de amostras se mostrou eficaz em pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina da UFMG com pacientes da UPA Centro-Sul.


20 de dezembro de 2022 - , , , ,


Pesquisador faz a coleta do swab de nasofaringe de paciente. Foto: Arquivo pessoal.

Uma pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG avaliou a técnica de agrupamento de amostras, chamada pool testing, como uma forma de aumentar a oferta e baratear testes para detecção da covid-19. A iniciativa é inédita na América Latina e abre portas para testagem em massa em momentos como a volta às aulas de escolas, ambientes de trabalho e cenários de baixa prevalência da doença na sociedade, por exemplo.

No pool testing, até 32 amostras de swab de nasofaringe podem ser utilizadas para um mesmo reagente, no método RT-PCR. Se o pool der negativo, todos os testados estão liberados. Caso o pool der positivo, as amostras são testadas individualmente para localizar os infectados dentro daquele grupo. 

O pesquisador Murilo Soares Costa, responsável pela tese de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Infectologia e Medicina Tropical, explica que não é necessária uma nova coleta para os testes individuais de pools que positivarem para o vírus. “Após a coleta, nós armazenamos o swab em um meio de cultura viral, possibilitando a repetição de quantos testes forem necessários”, explica. 

Os testes foram realizados no Centro de Tecnologia de Vacinas (CTVacinas) da UFMG, com amostras coletadas na UPA Centro-Sul de Belo Horizonte. Cada pool incluiu 3, 4, 8, 12 ou 16 amostras, a depender do cenário epidemiológico, analisado pela equipe semanalmente. Quanto menor a chance do resultado ser positivo, mais amostras podem compor um mesmo grupo.

Murilo Costa realizou a pesquisa em seu doutorado na Faculdade de Medicina da UFMG. Foto: Arquivo pessoal.

Na UPA, foram coletadas 1.358 amostras de pacientes suspeitos de covid-19, que deram entrada no serviço de setembro de 2020 a março de 2021. Ao todo, os pacientes foram divididos em 504 pools. Destes, 333 foram detectáveis para covid-19, enquanto 171 acusaram resultados não detectáveis. 

Dentro dos 171 pools que negativaram estavam contidas amostras de 459 pacientes. Nos grupos que positivaram, foram feitos testes individuais (com um reagente para cada amostra), a fim de localizar os infectados. Dessa forma, foram evitados o uso de 288 reagentes. 

Ao final, 915 pacientes não estavam com covid-19, enquanto 443 foram diagnosticados. O resultado foi obtido, em média, entre 48 e 72 horas após a coleta. 

O pesquisador defende o uso do pool testing para a ampliação dos diagnósticos via RT-PCR, que é o padrão-ouro para covid-19. “O Brasil falhou no quesito testagem. Vimos um apagão de exames, com baixa oferta da RT-PCR durante alguns momentos da pandemia, em especial para as comunidades mais pobres. Com os pools, teríamos respostas mais rápidas, com menores custos e dependência da compra de reagentes”, afirma o pesquisador. 

Para ele, o Brasil está pronto para avançar neste setor. “Temos laboratórios centrais em todos os estados, que já têm larga experiência na RT-PCR. Seria necessário, apenas, que os responsáveis técnicos fossem capacitados para montarem os pools”, pontua.

A técnica foi desenvolvida durante a segunda guerra mundial para a testagem de sífilis entre soldados. Atualmente, o principal uso se dá para a detecção de HIV entre doadores de sangue nos Estados Unidos.

Agrupamento de amostras associado a autocoleta

Um braço da pesquisa testou os alunos da Faculdade de Medicina da UFMG na volta das férias dos internatos – períodos finais do curso de Medicina, com atuação prática nos serviços de saúde.

Os alunos realizaram uma autocoleta com o swab. “Avaliamos que nenhuma amostra foi mal coletada e nenhum dos participantes se lesionou com a autocoleta”, comenta Murilo. O método reduziu em 154 o número de reagentes necessários para o grupo. O custo total foi de R$591. Caso não fossem aplicadas as técnicas de pool testing e de autocoleta, o custo teria sido de R$6.153, ou seja, 90% maior. Isso se deve ao maior número de reagentes, insumos e profissionais necessários ao longo do processo. 

As conclusões da pesquisa de doutorado mostraram que a testagem em pools aumenta a detecção de novos casos pela ampliação da oferta de exames. Os benefícios também são observados no acompanhamento epidemiológico da população. A aplicação pode ser vantajosa em situações de volta às aulas, em ambientes de trabalho, em grupos de pacientes que aguardam por cirurgias eletivas, em pessoas assintomáticas que tiveram contato direto com casos positivos, ou em outros cenários com baixa prevalência.

Além destas ocasiões, a técnica pode ser utilizada em pacientes admitidos em serviços de saúde, como UPA e UBS, em momentos de alta vacinação e baixa prevalência do vírus. Murilo lembra que o cenário para 2023 ainda requer esforços de todos para vencermos a covid-19. “A testagem é necessária: na dúvida, faça o teste. Se possível, faça a RT-PCR. Existem muitas doenças com sintomas parecidos e o teste pode mudar as intervenções clínicas”, finaliza. 

Apoiaram a pesquisa a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); o CTVacinas, por meio da Rede Vírus do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI); o Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Ensino Superior; e a Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Centro-Sul.

Investigação do SARS-CoV-2 para rastreamento da COVID-19 por meio da RT-PCR em pool testing
Programa de Pós-Graduação: PPG em Ciências da Saúde – Infectologia e Medicina Tropical
Autor: Murilo Soares Costa
Orientador: professor Unaí Tupinambás
Data da defesa: 16 de dezembro de 2022


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