Medo do desconhecido favorece preconceitos contra a epilepsia

Campanha mundial conscientiza para fim do estigma com a doença


26 de março de 2019


*Marcela Brito

Nesta terça-feira, 26 de março, comemora-se o ‘ Dia Roxo’, campanha mundial de conscientização para fim do estigma com a doença

Imagem: Freepick/Divulgação

Com registros no período anterior ao nascimento de Cristo, na Babilônia, a epilepsia já foi associada à loucura e até a possessões demoníacas. De lá para cá, pouco coisa mudou. Ainda hoje, a doença que acomete mais de 50 milhões de pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é carregada de estigmas. Com isso, portadores da epilepsia relatam sofrer com preconceitos como a visão de que são pessoas incapacitadas.

“As pessoas criaram um mito em torno da doença e do remédio do epilético, o gardenal, que eu tomo. Elas acham que é um remédio para louco”, relata Kelly Aguinelia Simões Pereira, formada em Secretariado Executivo Bilíngue e especialista em Controladoria e Finanças. Ela teve sua primeira crise epiléptica aos nove meses de vida.

A epilepsia é uma doença neurológica ligada a uma perturbação de atividades das células nervosas no cérebro. Mais comum em crianças e idosos, a enfermidade é caracterizada por crises epiléticas constantes. A neurologista e neurofisiologista, médica assistência no Ambulatório de Epilepsia e Eletroencefalograma no Hospital das Clínicas da UFMG, Ana Paula Gonçalves, explica que em 80% dos casos de epilepsias é possível fazer o controle da doença com medicamento, o que possibilita o paciente ter uma vida normal. Apenas 20% dos casos são de difícil controle.

Mesmo assim, Kelly Aguinelia relata sofrer com o estigma de ser uma pessoa incapacitada pela doença. “O epilético ele não é um coitado. Ela tem a capacidade mental para fazer o que ele quiser, o curso que ele deseja, falar vários idiomas, inclusive eu falo vários idiomas”, afirma.  

Medo do desconhecido

Para a neurologista Ana Paula Gonçalves, a circulação e divulgação de informações sobre a doença contribuem para reduzir o estigma sobre a epilepsia. Isso porque, de acordo com ela, o medo do desconhecido é a principal fonte de preconceitos. A maior divulgação também ajuda a promover a aceitação dos pacientes em relação a sua condição.

“Temos sim uma doença neurológica e precisamos de um acompanhamento, da mesma forma que alguém que tem alto teor de açúcar no sangue precisa fazer o controle. Nós somos pessoas que temos que tomar um remédio para controlar nossa sinapse, mas podemos fazer de tudo”, ressalta Kelly Aguinelia.

Diagnóstico

A epilepsia pode apresentar diferentes sintomas e níveis. Alguns tipos da doença, como a centro temporal, podem ser curadas quando se tem o tratamento adequado. Nesse caso, o paciente pode apresentar crises epilépticas até os 13 anos.

O professor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, Paulo Pereira Christo, explica que o diagnóstico da doença é feito a partir de exames e da anamnese, procedimento médico que consiste em saber o histórico do paciente. “Normalmente é feito uma história da crise convulsiva para saber como foi, quando, horário e duração, sintomas antes da crise e a parte do corpo afetada”, explica. 

De acordo com o professor, também é observado o histórico familiar para ver se tem quadros semelhantes. Depois dessa anamnese, são realizados exames eletroencefalograma e ressonância intra magnética

Convulsão não é sinônimo de epilepsia

Apesar de ser um dos sintomas mais associados à epilepsia, quadros convulsivos podem ter diferentes origens. Segundo a OMS, cerca de 10% das pessoas no mundo têm episódios de convulsão durante a vida, o que não significa que estão relacionados à epilepsia.

O uso abusivo de drogas, distúrbios metabólicos, infecções no sistema nervoso ou mesmo febre muito alta em crianças são exemplos de atividades que desestabilizam o cérebro e podem provocar convulsões.

A neurologista Ana Paula Gonçalves esclarece que a diferença entre episódios de convulsão e a epilepsia é a frequência em que as crises podem aparecer. De acordo com ela, pessoas com epilepsia podem apresentar sintomas além da convulsão.

“Um desse sintomas é a ausência, em que a pessoa fica parada por um tempo e depois volta a si”, explica. Ela também frisa que o paciente pode “sair fora do ar” e ter comportamentos irregulares, como mastigar ou sair andando sem um propósito específico e ter contrações musculares.

Como agir?

Quando não são bem conduzidos, esses episódios podem representar riscos para quem tenta ajudar e para a saúde do próprio paciente. A secretária executiva Kelly Aguinelia Simões Pereira conta que o desconhecimento sobre como agir ainda é comum.

“Uma pessoa do trabalho falou uma vez que quando eu tivesse uma crise ela iria pegar um extrator e abrir a minha mandíbula para que não engolir a minha própria língua. Mas isso não acontece. Ou ela iria quebrar todos os meus dentes ou se machucaria tentando abrir minha boca, porque durante o estado convulsivo eu não controlo os meus impulsos musculares”, conta Kelly.

Veja na imagem abaixo como proceder durante episódios de convulsão:

*Marcela Brito – estagiária de Jornalismo

edição: Karla Scarmigliat