Mortalidade materna de mulheres negras revela desigualdade no acesso à saúde

Desigualdade socioeconômica, dentre outros problemas, ajuda a explicar diferença de mortalidade entre gestantes negras e brancas


29 de dezembro de 2017


Desigualdade socioeconômica e problemas estruturais na rede pública de saúde podem explicar diferença de mortalidade entre gestantes negras e brancas

No Brasil, pouco mais da metade das mulheres negras fazem as sete consultas recomendadas para um pré-natal adequado, número inferior aos quase 75% entre as mulheres brancas. Além disso, quase 63% dos óbitos por complicações na gravidez são de mulheres negras, segundo relatório do Ministério da Saúde. Esses dados revelam uma desigualdade no acesso à assistência médica, mesmo após quase trinta anos da criação do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir da Constituição de 1988.

Para o professor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG, Gabriel Osanan, a desigualdade socioeconômica explica a alta mortalidade materna de mulheres negras. “Não é uma regra, mas elas costumam ser pacientes mais humildes quando se compara à média global. Elas têm, portanto, menos acesso aos serviços de saúde e realizam menos consultas no pré-natal”, afirma. Osanan também pontua que mulheres negras têm maior tendência a desenvolver quadros de hipertensão na gravidez, conhecidos como pré-eclâmpsia, principal causa de morte materna no Brasil seguida pelas hemorragias e infecções.

Outro ponto que o obstetra destaca é que a população negra é maioria no sistema público de saúde, que, em geral, tem estrutura inferior à rede particular, o que compromete a qualidade da assistência à gestante tanto no pré-natal quanto no parto. Segundo ele, a falta de informação sobre os possíveis riscos da gestação e a demora para procurar e conseguir suporte médico também contribuem para a ocorrência de quadros mais graves.

Foto: Ella Jardim | Unsplash

Racismo institucional

Em 2002, pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz revelou que gestantes negras recebiam menos anestésicos no parto. No fim de 2006, o então Ministro da Saúde admitiu a existência de um racismo institucional no SUS, declaração que foi rechaçada pela classe médica em geral. O termo envolve qualquer sistema de desigualdade que se baseia em raça, podendo ocorrer em instituições como órgãos públicos governamentais e empresas privadas.

“O racismo institucional, às vezes, existe de maneira dissimulada e a gente não percebe. Isso acaba prejudicando não só o diagnóstico como o tratamento das pessoas negras”, diz o professor do Departamento de Clínica Médica e diretor do Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) da Faculdade de Medicina da UFMG, José Nélio Januário.

Em 2009, o governo federal lançou o Plano Nacional de Saúde Integral da População Negra, política pública que visa melhorar o acesso da população negra à assistência médica, além de combater a discriminação no sistema de saúde brasileiro. No entanto, poucas ações foram concretizadas e os resultados obtidos ainda são inexpressivos.

Sobre o programa de rádio

Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h.

O programa também é veiculado em outras 187 emissoras de rádio, distribuídas por todas as macrorregiões de Minas Gerais e nos seguintes estados: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins e Massachusetts, nos Estados Unidos.

Redação: Warlen Valadares – Edição: Lucas Rodrigues