Pandemia impõe novas barreiras para diagnóstico precoce da hanseníase

Programa de rádio aborda a importância do diagnóstico precoce, adaptações dos serviços de saúde durante a pandemia, entre outros temas


25 de janeiro de 2021 - , ,


Manchas dormentes e persistentes, de cor avermelhada, esbranquiçada ou parda, são um dos principais sintomas da hanseníase, doença antigamente conhecida como lepra. Conhecer esses sinais e sintomas é importante para identificar a presença da enfermidade e, com isso, procurar os serviços de saúde para diagnóstico e tratamento. Porém, a pandemia de covid-19 tem ofuscado ainda mais essa doença, que já é cercada por estigmas e preconceitos, contribuindo para seu esquecimento e atrasos no diagnóstico.

“Ninguém quer lembrar de uma coisa que na sua imaginação é muito ruim”, afirma o dermatologista, professor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, Marcelo Grossi, uma das referências no país em hanseníase. Ele se refere ao estigma e preconceito que dificultam o diagnóstico precoce: se a doença não é lembrada, também não é diagnosticada, tratada e curada.

Na pandemia, o esquecimento soma-se ao fato de que muitas unidades de saúde estão com capacidade reduzida para serviços que não são de urgência e emergência. Além disso, o receio de contrair o novo coronavírus tem afastado muitas pessoas dessas unidades. Para se ter uma ideia, em Minas Gerais foram diagnosticados 1.098 casos de hanseníase em 2019 contra 640 casos registrados até 14 de dezembro de 2020, de acordo com a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Ao contrário do que parece, essa redução não necessariamente significa que as pessoas estão deixando de contrair a doença, mas que podem estar deixando de serem diagnosticadas.

 “É preciso lembrar as pessoas que, na medida do possível, não adiem a procura aos serviços de saúde quando tiverem suspeita de hanseníase”, reforça Marcelo Grossi.

O professor informa que os serviços estão prontos para o diagnóstico e o tratamento da hanseníase, ambos ofertados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “O tratamento da doença não muda durante a pandemia, os cuidados que os pacientes irão receber são os mesmos e os serviços estão adotando todos os cuidados em relação a covid-19, estão estruturados para isso”, garante o especialista.

Incapacidade física grau 2

O diagnóstico precoce é importante para prevenir a transmissão, complicações e sequelas da doença, como incapacidades físicas. Porém, dados do Ministério da Saúde mostram que o número de casos com grau 2 de Incapacidade Física identificados no início do tratamento cresceu 11% em 2019. São consideradas incapacidades de grau 2 deformidades causadas pela doença, como paralisia e perda dos movimentos das mãos, frequentemente relacionada à perda de sensibilidade, pés caídos e ulcerações nas plantas dos pés.

Imagem: Projeto “Enfoque multidisciplinar na hanseníase: cuidado e difusão do conhecimento/ www.facebook.com/saibahanseniase

“Se quando ela vai receber o diagnóstico já se tem um grande número de sequelas instaladas, significa que está doente há muitos anos e houve falha nesse diagnóstico”, explica o professor da Faculdade de Medicina, Marcelo Grossi. Segundo ele, esse atraso se deve ao fato de a doença ser pouco divulgada, pouco conhecida pelos profissionais de saúde e, às vezes, por ficar ainda mais esquecida devido a tantas demandas urgentes, como a pandemia de covid-19.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a transmissão da hanseníase ocorre por contato com gotículas de saliva ou secreções do nariz de pessoas que tem a forma transmissora da doença, chamada multibacilar, e não se encontram em tratamento.

Brasil é o segundo país do mundo com maior número de casos

A importância de diagnosticar precocemente é um dos pontos da campanha Janeiro Roxo deste ano. O mês de conscientização sobre a hanseníase tem como mote “A hanseníase é negligenciada, a saúde não”. Por isso, o programa de rádio Saúde com Ciência aborda temas como a importância do diagnóstico precoce, a relação da hanseníase com os grandes bolsões de pobreza do país, as adaptações dos serviços de saúde para a continuidade do tratamento neste período e mitos e verdades sobre a relação da doença com a covid-19.

Identificou, tratou, curou!

O diagnóstico da hanseníase é simples na maior parte dos casos, realizado por meio de parâmetros clínicos como exame e análise das manchas e, quando preciso, alguns exames de laboratório. Por sua vez, o tratamento varia de acordo com a forma da doença e pode ser feito em casa e no posto de saúde, sem necessidade de internação.

O professor Marcelo Grossi comenta que algumas adaptações nos serviços foram necessárias neste período de pandemia. “Normalmente, a pessoa comparece a cada quatro semanas à unidade para tomar a medicação supervisionada e levar a medicação para tomar em casa. Esse prazo foi dilatado e agora o paciente leva outra dose para tomar em casa para não ter que se deslocar mensalmente”, conta.

Sobre o programa de rádio

O Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify


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