Pesquisa da Faculdade de Medicina avalia possíveis sequelas neuropsiquiátricas da covid-19

Indivíduos que foram infectados pelo vírus e tiveram manifestações leves e moderadas já podem se candidatar como participante.


13 de outubro de 2020 - , , , , , , ,


*Giovana Maldini

Uma pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG busca analisar se os pacientes de covid-19 podem ter sequelas neurológicas e psiquiátricas após a infecção. Isso porque pacientes que contraíram outros coronavírus causadores da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS) e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), por exemplo, relataram manifestações neuropsicológicas cerca de um a dois anos após a doença.

A pesquisa, aprovada em junho deste ano em edital da Capes, já está na fase de recrutamento de pacientes para fazer os testes. Serão selecionadas pessoas acima de 18 anos, que tiveram o exame RT-PCR positivo para a covid-19 e que apresentaram manifestações leves ou moderadas da doença. A partir desse estudo, vai ser possível analisar, por exemplo, se alguns quadros psiquiátricos, como depressão, ansiedade, psicose, entre outros, podem ter relação com a infecção prévia por covid-19.

Além desses, a pesquisa também terá um grupo controle, com indivíduos que tiveram o exame negativo. O acompanhamento de todos os pacientes será feito ao longo de dois anos e a expectativa é recrutar cerca de 300 pessoas nos próximos três meses.

Os voluntários que se encaixam no perfil e quiserem participar da pesquisa “Manifestações e sequelas neuropsiquiátricas da covid-19: aspectos clínicos e moleculares”, devem entrar em contato pelo WhatsApp do Centro de Tecnologia em Medicina Molecular (CTMM) – (31) 99723-4160, ou preencher formulário no link: http://bit.ly/manifestaçõesneuropsiquiátricasdacovid19.

O coordenador da pesquisa e professor titular do Departamento de Saúde Mental da Faculdade, Marco Aurélio Romano, ressalta que o objetivo é avaliar os efeitos diretos do vírus. Por isso não serão recrutados participantes com manifestações muito graves, que ficaram internados em UTI, já que “como foi necessária a ventilação mecânica, podem ter tido, por exemplo, hipoxemia (nível de oxigênio baixo nos tecidos) ou outros fatores que podem afetar o metabolismo cerebral”.

Como será

Inicialmente, estão sendo convidados pacientes que foram diagnosticados com resultado positivo para covid-19 pelos exames realizados pelo Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) e encaminhados de hospitais como o Odilon Behrens e o Risoleta Tolentino Neves. Serão aceitos também aqueles que se candidatarem pelo número de WhatsApp e formulário do projeto.

Após o recrutamento, os pacientes farão testes neuropsicológicos e clínicos, exames como ressonância magnética, PET-CT, NIRS e coleta de sangue para perfil sorológico. Esse acompanhamento será feito a cada seis meses e serão registrados os sintomas que podem ter aparecido neste período.

Ambos grupos (positivos e negativos) repetirão os exames ao longo dos dois anos. “A gente não pode descartar nenhum, pois mesmo os pacientes assintomáticos podem ter tido a passagem do vírus para o sistema nervoso central, provocando uma neuroinflamação que não apareceu como sintoma clínico. Mas, no futuro, pode manifestar como algum tipo de sintoma psiquiátrico e neurológico”, explica Marco Aurélio.

O professor comenta que após um ano de acompanhamento já deve ser possível fazer uma análise parcial e com material suficiente para produzir artigos e resumos sobre os resultados encontrados. “Estamos com oito meses de pandemia no mundo. Não temos certeza do que pode acontecer daqui a um ou dois anos. Por isso, tudo que vamos encontrar neste período serão dados importantes”, afirma.

Sequelas da covid-19

Marco Aurélio acrescenta que, por a doença ser muito nova, os dados da literatura ainda são escassos. “Há hipóteses de que o SARS-CoV-2 possa entrar pelo bulbo olfatório, porque dentre os sintomas da doença está a anosmia (perda de olfato). Enquanto nas infecções pelos outros coronavírus, foi demonstrado que eles podem entrar por via hematogênica e atravessarem pela barreira hematoencefálica, por estarem circulando no sangue. Então há muita discussão dos sintomas, mas nada muito sistematizado ainda”, explica.

Por muitas pessoas estarem sendo expostas ao vírus, o professor defende a importância de se analisar as sequelas que essa infecção pode deixar. “Uma gripe, por exemplo, sabemos que vai passar e não vai ter muita sequela. No caso da covid-19, não. Já tem relatos de indivíduos que tenham tido fadiga mesmo depois de recuperados e ficaram três, quatro, cinco meses com esse quadro”, lembra.

“Então é importante termos protocolos de estudo dos efeitos no sistema nervoso central de outros coronavírus, por exemplo, que possam aparecer, ou de outras ondas da mesma pandemia. Porque o desconhecido sempre pega a gente de surpresa”, completa.

“Na Faculdade, há muitos projetos sobre covid-19. A sociedade precisa saber o que está acontecendo e que a Universidade não está parada. Mesmo na pandemia, nós continuamos os trabalhos e projetos, não só de covid-19, mas muitos dos nossos esforços foram direcionados para a doença”

Marco Aurélio Romano

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*Giovana Maldini
Edição: Deborah Castro