Saúde dos detentos é comprometida por carência de celas e agentes carcerários
Contradições no sistema penitenciário brasileiro e dificuldades enfrentadas pelos presos em busca de qualidade de vida são destaques do programa de rádio
15 de julho de 2016
Contradições no sistema penitenciário brasileiro e dificuldades enfrentadas pelos presos em busca de qualidade de vida são destaques do programa de rádio
Celas superlotadas com baixas condições de higiene e alimentação são realidade no sistema prisional brasileiro. Em um dia, é comum indivíduos encarcerados saírem das celas somente para atividades específicas, como trabalho ou atendimento médico. Esse deslocamento ainda pode depender do número de agentes carcerários disponíveis para acompanhá-los, fazendo com que boa parte dos detentos desenvolva doenças físicas e, principalmente, mentais.
De acordo com o último Levantamento de Informações Penitenciárias, existem no Brasil mais de 600 mil presos, que lotam as unidades prisionais preparadas para abrigar menos de 380 mil pessoas. Para a professora do curso de Psicologia da UFMG, Vanessa Barros, que coordena o Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho, Cárcere e Direitos Humanos, a escassez material aliada ao número excessivo de pessoas presas pode provocar diversos problemas fisiológicos. Os mais comuns acometem a pele, como dermatites e sarna, mas casos de tuberculose, hepatite viral e HIV/Aids também se manifestam com frequência entre a população carcerária.
As privações, além de humilhações e violência, somadas à ruptura com o convívio familiar, trazem consequências à saúde mental do preso. “Isso desencadeia casos de depressão, surtos psicóticos e tentativas de suicídio, que, apesar de não serem tão divulgados, a gente sabe que acontece”, afirma a psicóloga. Nesse contexto, é comum o uso de medicamentos psicotrópicos, como calmantes e antidepressivos. “A extrema medicalização é nociva, mas tem um efeito funcional de ajudar o preso a dar conta daquela vida lá dentro”, atesta Vanessa Barros.
Em geral, ao necessitarem de cuidados médicos, os detentos são encaminhados para unidades do Sistema Único de Saúde (SUS). Mas eles devem ser escoltados, ou seja, dependem da disponibilidade dos agentes carcerários. O levantamento revela que existem menos de 46 mil agentes para acompanharem a quarta maior população carcerária do mundo. “Acontece de o preso ficar uma semana dentro da cela, sem nenhuma saída”, diz Vanessa.
Falta de autonomia
Existe uma contradição entre o direito à saúde e a condição de preso. Quem afirma é a professora do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG, Elza Machado. Segundo ela, existe uma perspectiva na área que define que o acesso à saúde está ligado à autonomia das pessoas. “A saúde, para nós, só é passível de ser produzida se cada um está envolvido no tratamento”, assegura.
O modelo de privação de liberdade, portanto, “bate de frente” com essa linha de pensamento, uma vez que há a relação de dependência citada entre presos e profissionais do sistema carcerário na realização de qualquer atividade. “Hoje, o que nós propomos como atenção à saúde entra em choque com a forma como se organiza o sistema prisional, em virtude de um sistema penal que precisa ser repensado”, opina a professora.
Sobre o programa de rádio
O Saúde com Ciência é produzido pela Assessoria de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h.
O programa também é veiculado em outras 177 emissoras de rádio, distribuídas por todas as macrorregiões de Minas Gerais e nos seguintes estados: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins e Massachusetts, nos Estados Unidos.