Variante Delta: infectologista esclarece dúvidas mais recorrentes

Em entrevista ao Saúde com Ciência, infectologista e professor da Medicina UFMG explica o que se sabe sobre essa cepa, que avança no país.


10 de setembro de 2021 - , , , ,


Detectada pela primeira vez na Índia, em outubro do ano passado, a variante Delta do novo coronavírus já se tornou mais prevalente no Brasil que a cepa Gamma, que até então dominava o número de casos no país.

De acordo com a Rede Corona-ômica, vinculada ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Delta representa 63% dos casos de covid-19 no Brasil, enquanto a Gamma corresponde a 35%. Os dados foram apurados a partir de amostras do novo coronavírus depositadas na plataforma internacional Gisaid nos últimos 15 dias.

Essa nova variante surge como um desafio a mais para o fim da pandemia e tem obrigado diversos países a repensarem estratégias para lidar com a doença. Mas uma coisa já se sabe: para reduzir o avanço da Delta, é preciso vacinar a população com as duas doses e manter as medidas não farmacológicas de distanciamento, ventilação de ambientes, uso de máscaras e lavagem das mãos.

Para esclarecer dúvidas sobre essa cepa, o programa de rádio “Saúde com Ciência” entrevistou o infectologista e professor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, Unaí Tupinambás.

Confira algumas respostas a seguir. O programa completo está disponível aqui.

SC: Com a variante Delta, a mortalidade no país pode voltar a subir?

UT: Essa variante é muito mais transmissível, tão transmissível quanto a catapora, por exemplo. A capacidade de transmissão surpreendeu a nós cientistas, a nós todos. Ainda não temos muita certeza se ela é mais agressiva. Temos dados da Inglaterra, onde houve e ainda continua tendo aumento de casos. O que parece é que a letalidade não acompanhou o aumento de casos lá, muito provavelmente por causa da vacinação. É importante lembrar que mais de 60% da população é totalmente vacinada na Inglaterra, o que não impediu a infecção. No entanto, impediu as formas mais graves da doença.

SC: Os sintomas da Delta são os mesmo que os da variante Gamma?

UT: Não é possível para saber qual é a variante que está infectando, porque os sintomas são geralmente os mesmos: febre, mal-estar, tosse, dor de garganta, dor de cabeça, falta de ar, dor no peito… a única diferença é que a variante Delta pode ter um período de incubação mais curto. Se a outra variante tinha período de cinco a seis dias, a Delta tem de quatro a cinco dias. Claro que é difícil saber quando entrou em contanto com o vírus. Mas se você entrou em contato com vírus hoje, os sintomas vão se manifestar daqui a seis dias, que é a média das outras variantes. Se for a Delta, essa média é de quatro a cinco dias.

SC: O senhor acredita que a Delta pode provocar uma terceira onda aqui no Brasil?

UT: Esse é o nosso temor. Se a gente for seguir o exemplo dos Estados Unidos, Inglaterra e Israel, acho que vai ter um aumento importante de casos no Brasil. A pergunta que fica é a seguinte: vai impactar na assistência? As pessoas infectadas vão requerer uma terapia intensiva, uma internação hospitalar?

É claro que a gente torce para que não impacte. Que seja como no Reino Unido, em que o aumento de casos internados não acompanhou o aumento de casos de covid, porque lá tem muita vacina. Então, temos que avançar na vacinação e manter as medidas não farmacológicas como uso da máscara, distanciamento, evitar aglomeração e evitar ambiente fechados.

Acredito, que até o final deste ano, toda a população acima de 18 anos esteja vacinada com a segunda dose. Então é preciso ter um pouco de paciência. Se quisermos ter uma Natal menos triste, um carnaval um pouco mais alegre ano que vem, temos que manter essas medidas não farmacológicas.

SC: As medidas sanitárias são as mesmas para a variante Delta são as mesmas?

UT: Os cuidados para evitar a variante Delta são os mesmos. Felizmente, as medidas não farmacológicas funcionam contra essa variante. Então, me refiro ao uso de máscara bem posicionada – acima do nariz e debaixo do queixo – se for máscara de pano usar duas máscaras de pano; evitar aglomerações em locais fechados; se quiser fazer uma festa, ir ao bar, que pelos menos seja um lugar aberto e nunca ir para um ambiente fechado, nesse momento. Acho, inclusive, que não é hora de ir em lugares fechados, como cinema e teatro. Além disso, sempre manter atividades em ambientes abertos, pois já basta o transporte público que a população tem que enfrentar no dia a dia, que é fechado e ruim.

SC: Ainda precisamos de cuidados como limpar os sapatos antes de entrar em casa e higienizar as embalagens?

UT: Sempre precisamos limpar Alimentos in natura antes de comer. Isso vale desde antes da pandemia. Mas aquela neura que a gente tinha de tirar sapato, lavar caixa de embalagem, não tem mais sentido. Repito: o mais importante é lavar as mãos, ambientes arejados, distanciamento e evitar aglomerações.

SC: E o avanço da vacinação poderia conter uma terceira onda?

UT: A exemplo de Israel, que tem mais de 70% da população vacinada com a segunda dose, e do no Reino Unido, com mais de 60%, houve aumento de casos mesmo com a imunização. A vacina não protege contra se infectar, mas protege contra a morte. A efetividade contra a morte varia de 100% nos mais jovens, até 87% a 95% nos mais idosos, ou seja, a vacina protege contra as formas graves, o que já é um grande avanço. Mas, claro, se tem muito casos, proporcionalmente vamos ter um aumento. Mas, esperamos que não seja um cenário igual ao que tivemos em março e abril aqui no Brasil.

SC: Então, as vacinas são eficientes contra a Delta?

UT: Todas a vacinas, seja Coronavac, Pfizer, AstraZeneca e Janssen, têm efetividade contra as formas graves da doença próxima a 100%. Por isto, é importante vacinar, quanto mais pessoas se vacinarem, mais rápido vamos sair dessa crise humanitária e sanitária, porque vamos diminuir a circulação do vírus. E continuar mantendo, pelos menos até o fim do ano, medidas de distanciamento, uso de máscara, lavagem das mãos e evitar aglomeração, principalmente em lugares fechados.

Temos que aprender com os erros dos outros países, como Estados Unidos e Inglaterra, que flexibilizaram antes da hora e não obrigaram uso de máscaras. As chances de termos aumento de casos é grande, porque estamos no mesmo caminho errado que eles.

SC: E a eficiência das vacinas contra a Delta é só com as duas doses?

UT: Para outras variantes, a primeira dose já dá proteção de 70%, mas para a Delta não. Tem que manter todos os cuidados não farmacológicos até a segunda dose, depois disto, tem uma proteção contra as formas graves.

Saiba mais no Saúde com Ciência

O programa de rádio “Saúde com Ciência” esclarece também sobre estratégias de vacinação e os impactos da variante Delta no Brasil. Ouça aqui.

O programa é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a quinta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify.