Sofrimentos mentais podem ser confundidos com cansaço no trabalho

Saúde física e mental dos trabalhadores da linha de frente é abordada na série especial do Saúde com Ciência neste Setembro Amarelo.


28 de setembro de 2020 - , , , , , ,


A pandemia tem impactado a saúde mental dos trabalhadores da linha de frente. Dados do Ministério da Saúde (MS) revelam que 12% dos profissionais da saúde apresentam alta pontuação em sintomas mentais autorrelatados nesses últimos meses, de acordo com os parâmetros populacionais brasileiros. No entanto, a maior sobrecarga de trabalho pode dificultar a percepção de sofrimentos psíquicos como ansiedade e depressão, muitas vezes confundidos com a exaustão de uma jornada mais intensa neste momento.

Saúde física e mental dos trabalhadores da linha de frente, como profissionais da saúde, de segurança pública e funcionários de supermercado, é abordada na série de reportagens do Saúde com Ciência neste Setembro Amarelo.

Os resultados dessa pesquisa do MS, que foi realizada em parceria com UFMG e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), também são observados nos profissionais que recebem o suporte do projeto TelePAN Saúde – Medicina UFMG. Entres os desalentos mais relatados pelos participantes, estão quadros de insônia, ansiedade e medo. Mais de 300 trabalhadores da linha de frente já foram atendidos pela iniciativa.

“Há um medo de se contaminar pela covid-19 e, com isso, contaminar seus entes queridos e familiares, e uma angústia, que também vem da incerteza de como lidar com esse vírus, a incerteza técnico- científica, visto que os estudos ainda estão caminhando”,

analisa o médico psiquiatra e colaborador do TelePAN Saúde, Júlio César Menezes Vieira.

Ainda de acordo com Viera, esses fatores podem levar a quadros depressivos e outros transtornos, como a Síndrome de Burnout ou Esgotamento Profissional, que é um complicador de doenças. No entanto, muitos outros profissionais podem não buscar ajuda por não perceberem que estão com algum transtorno.

Como diferenciar?

“Os profissionais da área da saúde estão na linha de frente e com grande sobrecarga de trabalho, o que leva a fadiga e exaustão, sintomas que também aparecem em transtornos depressivos, por exemplo”, comenta o psiquiatra.

Mesmo assim, ainda é possível diferenciar um quadro de sofrimento psíquico da exaustão e esgotamento de uma jornada de trabalho mais extenuante.  No transtorno depressivo, não há apenas a fadiga, cansaço e lentificação. Também podem existir sintomas como tristeza e perda do prazer, ruminações em relação a própria vida e, às vezes, pela própria morte, forte sensação de culpa por não dar conta de realizar as tarefas e sensação de inutilidade.

“É possível as pessoas mais próximas perceberem, mas muitas vezes não é possível separar muito bem esse misto de sintomas de uma Síndrome de Esgotamento ou Bornout, quadro depressivo ou ansioso”, pondera Júlio César Menezes Vieira.

Mas alguns sinais de alerta de que uma pessoa não está bem devem ser observados, como prejuízos na concentração e memória, alteração do sono, principalmente a insônia, maior lentificação e irritação.

Tudo bem buscar ajuda

“A depressão até hoje é encarada como problema de personalidade, questão religiosa, fraqueza e até mesmo a má criação dos pais”, observa Vieria. Segundo ele, existe uma resistência histórica da sociedade em buscar ajuda para prevenção e tratamento de sofrimentos psíquicos, o que reverbera entre os profissionais da saúde.  

Com esses trabalhadores, a dificuldade de buscar ajuda pode ser maior devido ao imaginário existente em relação aos profissionais de saúde. “É preciso nos despirmos das nossas visões mágicas de que somos invencíveis e entender que, como qualquer pessoa, sentimos angústia e medo”, alerta.

Rede de suporte

Várias instituições do setor público e privado desenvolveram inciativas para dar suporte aos profissionais. Entre elas, o TelePAN Saúde, que oferta atendimento gratuito e online aos profissionais de saúde da linha de frente por meio de plataforma acessível www.medicina.ufmg.br/telepansaude.

O Sistema Único de Saúde (SUS) também oferta o TelePSI, projeto de teleconsulta psicológica para os profissionais da linha de frente. O serviço pode ser acionado por meio de  central de atendimento que funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 20h, pelo 0800 644 6543 (opção 4). A primeira ligação é para cadastro e avaliação. 

Também é possível acionar o CVV – Centro de Valorização da Vida – pelo número 188, para apoio emocional e prevenção do suicídio.

Reportagens especiais

Confira mais sobre a saúde mental dos profissionais de saúde da frente na série de rádio do Saúde com Ciência, que também aborda:


-> Saúde física e mental dos agentes comunitários de saúde;
-> Saúde física e mental dos profissionais de segurança pública;
-> Saúde física e mental dos funcionários de supermercados;
-> Saúde física e mental dos agentes de saúde das barreiras sanitárias.

Programa Saúde com Ciência

Saúde com Ciência é produzido pelo Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG e tem a proposta de informar e tirar dúvidas da população sobre temas da saúde. Ouça na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM) de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h. Também é possível ouvir o programa pelo serviço de streaming Spotify.

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